O apóstolo Paulo, que passou da morte para a vida, de
perseguidor a perseguido, de blasfemo a pregador, de insolente a piedoso (I Tm 1:13) ensina aos colossenses que
estar em Cristo é uma mudança completa, não apenas o abandono do mal mas também
a prática do bem (I Pe 2:15) através
das boas obras que o Senhor, de antemão, preparou para que seu povo andasse
nelas (Ef 2:10) como evidência de
terem se convertido a Deus (At 26:20).
Ele não apenas ordena aos colossenses – e a todos os crentes
– que se desviem das obras infrutíferas das trevas (Ef 5:11) como também passem a praticar as obras da luz. Ele não
apenas diz para eles se despirem dos trapos que caracterizavam o velho homem
mas, também, que se revistam do novo homem. Ele diz para eles se despojarem dos
penduricalhos do velho homem, que, como pesos, lhes causariam obstáculos à sua
caminhada como, também, lhes diz para vestirem nova armadura.
12 Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos
de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade. 13 Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de
queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai
vós; 14 acima
de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição. 15 Seja a paz de Cristo o árbitro em vosso
coração, à qual, também, fostes chamados em um só corpo; e sede
agradecidos. 16 Habite, ricamente, em vós a palavra de
Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a
Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso
coração. 17 E tudo o que fizerdes, seja em palavra,
seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai (Cl 3.12-17).
O início deste
capítulo incentiva os crentes a mortificarem o velho homem no corpo da sua
carne, não atendendo às suas concupiscências. Literalmente o texto diz para
deixar “necrosar’ aquilo que já está morrendo, já está vencido e não deve ser
alimentado para ter alguma forma de sobrevida.
Dar alento ao velho homem é como segurar um bastão de cobre
num campo aberto durante uma tempestade. Assim como o bastão atrai os raios, o
velho homem e suas práticas tem sobre si a sentença da ira de Deus – sobre ele,
virá, inevitavelmente, a punição do santo em face aos pecados nos quais o velho
homem se deleita.
Vamos nos debruçar um pouco mais sobre essa luta – luta que é
de cada homem nascido de novo. Só não a luta quem já está morto (Ef 2:1) ou quem já descansou no Senhor,
tendo combatido o bom combate e completado a carreira (II Tm 4:7). É uma luta que cada um de nós enfrenta, e, às vezes, é
fragorosamente derrubado, embora não derrotado porque nossa vitória é a vitória
de Cristo, pela fé (Rm 5:2) porque
ele fez o que nos era impossível, cumprir as exigências da lei (Gl 2:16).
12 Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos
de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade.
Assim como o cristão é exortado a mortificar o velho homem, a
despir-se de seus apetrechos que servem como peso e impedimento para que ele
possa correr eficazmente a carreira que lhe está proposta, também é um fato que
ele não pode combater o bom combate se não estiver devidamente preparado.
Por isso o apóstolo Paulo diz que o
cristão deve revestir-se (mais precisamente, deve desejar e buscar deixar-se
vestir) do novo homem. Da mesma maneira que sobre o velho homem permanece a ira
de Deus (Jo 3:36 - Por isso, quem crê no Filho tem a vida eterna; o que,
todavia, se mantém rebelde contra o Filho não verá a vida, mas sobre ele
permanece a ira de Deus) e seus atos são objeto da aplicação de sua justiça
sobre o novo homem há alguns qualificativos que lhe dão segurança quanto à sua
nova vida.
Somente os eleitos de Deus,
escolhidos por sua graça desde antes da fundação do mundo (Ef 1.4-5) podem receber este revestimento. O Senhor não coloca
remendo novo em pano velho (Mt 9:16),
e isto indica que, assim como Nicodemos tinha que nascer de novo (Jo 3:7) qualquer outra pessoa que venha
a ser revestido também, necessariamente, terá que passar pelo novo nascimento –
e estes nascem pela vontade de Deus, e não de homens.
A Escritura é clara quando diz que
aos seus eleitos Deus chama com o propósito de fazê-los santificados em Cristo
e promoverem neles um estilo de vida santo (I Co 1:2) fruto do amor de Deus que é derramado em seus corações (Rm 5:5), aliás, novos corações porque o
coração do velho homem não pode experimentar o amor de Deus, não tem nenhum
discernimento sobre as coisas de Deus (I
Co 2:14).
Este novo estilo de vida do novo
homem expressa-se em um contraste com as antigas obras da carne que abundavam
no velho homem, através de sentimentos que brotam do fundo do seu ser, sem
hipocrisia. Estes sentimentos expressam-se em ações de compassiva misericórdia
pelos seus semelhantes, por uma benigna integridade moral, por humildade no
trato com o próximo, por um espírito de brandura e uma paciente perseverança
que contrasta com a natural atitude vingativa e irada do velho homem.
13 Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de
queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai
vós; 14 acima
de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição. -
Por causa dos sentimentos verdadeiros, que brotam de um
coração renovado pela graça de Cristo, as relações interpessoais que antes eram
caracterizadas por dissenções, porfias, disputas insanas e sem sentido e que
resultavam em amargura (mesmo entre irmãos – Hb 12:15), sofrem uma mudança radical. Onde havia, por exemplo, a
mentira (Cl 3:9) ou as palavras
torpes passamos a encontrar palavras boas para a edificação (Ef 4:29).
A ordem apostólica é para que os crentes ofereçam suporte
mútuo – que se sustentem e se perdoem mutuamente. Isso seria desnecessário em
uma Igreja perfeita, mas sabemos que nem em Colossos nem em Jerusalém houve uma
Igreja perfeita. A Igreja perfeita é aquela que só é vista pelos olhos do
Senhor, através do corpo da carne de Cristo, e que será conhecida dos homens
apenas no último dia. O que conhecemos da Igreja colossenses é que era uma
Igreja imperfeita, com inimigos internos e suas heresias e inimigos externos e
suas armas e paganismo, como os romanos.
Este novo tipo de relacionamento mútuo não é possível em
sociedades nas quis os homens ainda permanecem inclinados para seus próprios
interesses – é por isso que doutrinas econômicas como o comunismo, por exemplo,
nunca são, de fato, comunistas. São apenas burocracias oligárquicas. A única
razão forte o suficiente para estabelecer uma verdadeira relação de mutualidade
é o fato de que Cristo não apenas perdoou todos os pecados dos seus eleitos mas
os chamou a uma nova relação de irmandade, tendo todos um só pai e um só Senhor
(I Co 8:6).
Por causa disso, se todos são de um só Senhor, ninguém deve
julgar-se de posse do direito de, mesmo com razão, acusar o próprio irmão,
antes deve perdoá-lo – na mesma proporção e nas mesmas condições que foi
perdoado por Deus. Um perdão incondicional, livre e gracioso.
Só existe uma forma de perdoar: movidos pelo amor de Deus,
que perdoou quem não merecia e uniu a todos, embora diferentes, em um só corpo
perfeito, o corpo de Cristo – e uma das piores doenças que pode atacar o corpo
acontece quando o próprio corpo produzi aquilo que o aniquila, como é o caso de
um câncer. Diferente desta doença, é o amor de Cristo que une todos os que
nasceram de novo para que, em Cristo, alcancem a perfeição espiritual.
TERCEIRA
EVIDÊNCIA: VIDA PACÍFICA
15 Seja
a paz de Cristo o árbitro em vosso coração, à qual, também, fostes chamados em
um só corpo; e sede agradecidos.
Apesar de tão almejada, de tão
procurada, a paz é justamente o que jamais se encontrou no planeta terra – os
dados disponíveis indicam que nunca houve um período em que não houvesse
guerras na terra. Mesmo o esplendor da tecnologia e da cultura, que os teólogos
do sec. XIX achavam que traria a paz universal, tem resultado em mais guerras,
e guerras cada vez mais sangrentas com imagens chocantes, como as que temos
visto nos atos do Estado Islâmico, mas não nos enganemos, estas atrocidades não
são exclusivas deles. Nunca foram.
Quando dois irmãos não conseguem
se entender, alguém tem que fazer a intermediação – e o único que realmente é
isento é o Senhor de ambos, Jesus. Paulo diz-nos que a paz, que é de Deus, e
que é não apenas anunciada como boas novas (Ef 2:17) mas também é dada por intermédio de Cristo Jesus (Jo 14:27) é quem deve arbitrar e
controlar os corações dos crentes.
O primeiro anúncio a respeito da
vinda de Cristo, assim que ele nasceu, falava de paz na terra entre os homens a
quem ele quer bem (Lc 2:14). É óbvio
que ele estava falando da paz entre os piedosos (Rm 12:18), não entre todos os homens e nem mesmo entre os piedosos
e o resto dos homens (Mt 10:34).
A paz de Deus é, assim como o novo
nascimento e o revestimento de ternos e verdadeiros afetos, é uma dádiva de
Deus aos seus eleitos, porque ele é Deus de paz e seus eleitos foram tornados
um com ele (Rm 12:5). Esta
disposição para buscar a paz é uma característica que surge do fato de estarmos
em Deus, porque ele dá, aos seus, paz em todas as circunstancias (II Ts 3:16).
Paz com Deus – e, consequentemente,
com os demais eleitos, santos e amados, não é algo opcional, mas é condição
para a santificação, sem a qual é impossível ver ao Senhor (Hb 12:14).
E é a paz de Deus, que independe
das circunstancias, que move o crente para mais perto do seu próximo e, com
isso, o abençoa no processo de santificação mutua, que deve levar o cristão a
uma vida de gratidão a Deus. Ele não poderia alcançar esta paz. Ela não está
disponível no mercado político. Ela não pode se obtida nas bolsas de valores do
mundo. Ela é fruto da comunhão com o Senhor – por isso, o coração do cristão
deve estar cheio de gratidão a Deus por esta paz, e vivê-la com seu próximo.
16 Habite, ricamente, em vós a palavra de
Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a
Deus (Senhor), com salmos, e hinos,
e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração.
Paulo afirma que em seu corpo, em seus membros,
isto é, na sua carne (obviamente refere-se à sua natureza terrena, carnal, que
ele incentiva os crentes a deixar necrosar, a fazer morrer – Cl 3.5) habita o pecado e de uma forma
tão insinuante e poderosa que ele chega a dizer que nem mesmo compreende o seu
modo de agir (Rm 7:15).
Isto não serve de desculpa – é uma
triste realidade com a qual temos que lutar o tempo inteiro, vigiando sempre. O
ideal é que conseguíssemos vencer sempre, mas, infelizmente, este não é o caso,
e por isso o Senhor nos diz que temos um advogado junto ao pai quando pecarmos
(I Jo 2:1). Não é o caso de
desanimar, pelo contrário, é nosso dever lutar, mortificar a carne e clamar por
ajuda do Senhor (Rm 7:24).
A resposta obtida mediante
inspiração do Senhor é: contra o pecado a resposta é uma nova lei, que Paulo
chama de lei do Espírito da vida (Rm 8:2)
e da Palavra de Cristo, referindo-se, evidentemente, às boas novas da salvação
em Cristo Jesus que lhe trouxeram libertação e alegria (Rm 7:25).
Para que a nova vida se manifeste
ela é motivada pela influência, pela habitação abundante da Palavra de Cristo
através da vida comunitária – assim como o perdão é mútua, também a edificação
deve ser mútua. E não é só isso. A nova vida, a vida do corpo de Cristo é de
tal forma comunitária que, embora admita e exija momentos de devoção individual
(Mt 6:6) ela é majoritariamente
vivida com os demais irmãos. Foi assim com a Igreja nos seus primeiros dias em
Jerusalém (At 2:42) e é para viver
assim que os cristãos são exortados pelo escritor da carta aos hebreus (Hb 10:25).
Edificação mútua, louvor
comunitário, bênção de Deus impregnando a Igreja com suas Palavra – que é viva
e que liberta, principalmente do velho homem, resultando em louvor que provém
do coração.
17 E tudo o que fizerdes, seja em palavra,
seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai.
Já vimos que deixar revestir-se do
novo homem atinge as motivações, os afetos do coração do crente – seus
relacionamentos pessoais são alterados, ele experimenta a paz de Cristo, o que
significa paz com Deus e com os seus semelhantes, ainda que não haja paz com o
mundo e ele é capacitado a viver esta nova vida alimentado pela Palavra.
Obviamente Paulo não queria fazer
do cristianismo mais uma das muitas religiões de regras, preceitos e
mandamentos (embora tenhamos, sim, que seguir regras, preceitos e mandamentos
do Senhor – mas estes são colocados no coração, afetam as disposições
interiores e não são aprendidos maquinalmente - Is 29:13). Legalismo por legalismo o judaísmo era mais antigo – e
havia dezenas de outras formas religiosas semelhantes naqueles dias, onde
bastava cumprir um ou outro, ou vários deveres religiosos e estava tudo certo
com a divindade.
Encontramos nas Escrituras
numerosas listas de coisas condenáveis – conhecemos cada uma delas, e elas
servem basicamente para nos alertar sobre o quão somos pecadores, e quantos
caminhos diferentes o velho homem tem para satisfazer as concupiscências de sua
carne. A bíblia poderia conter um mandamento para cada uma das inclinações
pecaminosas, para cada um dos erros e para cada uma das falhas, cada uma das
armadilhas e dardos inflamados do inimigo – mas ela simplesmente nos adverte
que o problema não está nas coisas, está em nós (Tg 1:14).
Somos ensinados a nos preparar
para a batalha com as armas espirituais que Deus coloca à nossa disposição (II Co 10:4) e nos vestirmos da armadura
que ele mesmo proporciona (Ef 6.13-18).
A orientação de Paulo é que tudo
seja feito – seja o falar, seja o agir, todas e cada uma das ações sejam feitas
de acordo com o mandato do Senhor Jesus – sem murmuração, sem contenda (Fp 2:14), mas pela mais absoluta
gratidão pelo fato de ter sido liberto do império das trevas (Cl 1:13).
EXORTAÇÕES
FINAIS
Sei perfeitamente, não apenas por
estudo das Escrituras, mas pela experiência pessoal, assim como Paulo também
tinha esta mesma experiência, que o assédio do pecado é constante. Sei que a
luta de Paulo é a luta da cada um de nós aqui – em áreas diferentes, mas todos
enfrentamos o assédio incessante do pecado e as armadilhas do mundo (Sl 141:9).
Sei também que a vitória sobre o
pecado não pode ser alcançada pelo braço mortal – não é por nossa força que
poderemos vencer o mundo, mas sim pela nossa fé (I Jo 5:4-5) naquele que venceu o mundo e nos diz que somos mais que
vencedores (Rm 8:37).
E se não conseguirmos fazer tudo como
deveríamos fazer, lembremos que nossas disposições interiores são santificadas
pela graça de Deus que nos ajuda a fazer não o que queremos, mas o que o
Espírito quer (Gl 5:17).
O erro que não podemos nos deixar
enredar é o de desistir. As tribulações virão. As tentações virão. Até mesmo as
quedas virão. Não podemos parar no verso 24 do capítulo 7 da carta de Paulo aos
romanos. Não podemos simplesmente entrar em desespero e chorar dizendo que
somos desventurados e miseráveis condenados à morte (Rm 7:24). Antes que o fôlego lhe acabasse Paulo lembra de seu
Senhor e salvador Jesus Cristo e por ele dá graças (Rm 7:25).
Não, não devemos desistir nem
retroceder (Hb 10:39) mas dos que
prosseguem, deixando para trás os pecados anteriormente cometidos e buscando
alcançar o alvo da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Fp 3.13-14). E se uma nova queda
surgir? E se novas tribulações se apresentarem? Façamos como Paulo, lembremos
que
8
Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não
desanimados; 9
perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; 10 levando
sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em
nosso corpo. 11 Porque
nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que
também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal (II Co 4.8-11).