segunda-feira, 11 de novembro de 2019

IGREJA CONSAGRADA E IGREJA JUBILOSA [III]

CRENTES CONSAGRADOS SÃO ATENTOS PRATICANTES DA PIEDADE

A primeira coisa que Paulo acha necessário escrever novamente aos filipenses é para eles terem cautela (blepw), terem discernimento mental, examinar cautelosa e cuidadosamente as coisas espirituais, colocarem-se em atitude de defesa para não serem atingidos por três tipos de perigos existentes e que deles faziam seu alvo:

i.                 Acautelai-vos dos cães

Estamos acostumados a vermos cachorros como animal de estimação, muitos sendo melhor cuidados do que milhões de seres humanos. Mas cães (kuwn) eram vistos, muitas vezes, em matilhas que atacavam rebanhos e pessoas e, comiam carniça e eram vistos como impuros. Metaforicamente (e não alegoricamente) o termo é usado para referir-se a um homem de mente impura, e os filipenses deveriam ser cautelosos para que sua mente não fosse usada e manipulada ou maculada por este tipo de pessoa, que não possui a amente de Cristo (I Co 2.16 - Pois quem conheceu a mente do Senhor, que o possa instruir? Nós, porém, temos a mente de Cristo).

ii.             Acautelai-vos dos maus obreiros

O segundo cuidado que Paulo orienta os filipenses a terem é com os maus obreiros (kakoj ergathj), isto é, causadores de problemas, prejudiciais, destrutivos, perniciosos e banais. O problema dos maus obreiros, para Paulo, não é que eles nada façam - é eles são de natureza diferente da natureza da igreja. São de natureza má, são perniciosos, suas obras geram problemas, suas ações são prejudiciais e o resultado é destruição, como os trabalhadores maus da parábola contada por Jesus (Lc 20.19 - Naquela mesma hora, os escribas e os principais sacerdotes procuravam lançar-lhe as mãos, pois perceberam que, em referência a eles, dissera esta parábola; mas temiam o povo) que só intentam matar, roubar e destruir (Jo 10:10 - O ladrão vem somente para roubar, matar e destruir; eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância).

iii.         Acautelai-vos da falsa circuncisão

A terceira advertência é contra os judaizantes a quem Paulo chama duramente de mutilados (katatomh). Paulo era judeu, fora também ele circuncidado, manda circuncidar a Timóteo (At 16.3 - Quis Paulo que ele fosse em sua companhia e, por isso, circuncidou-o por causa dos judeus daqueles lugares; pois todos sabiam que seu pai era grego[1]) mas adverte que a circuncisão não é de nenhum proveito espiritual (Gl 5:2 - Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará) e, ao mesmo tempo, faz um contraste entre a circuncisão verdadeira, espiritual, do coração (Rm 2.29 - Porém judeu é aquele que o é interiormente, e circuncisão, a que é do coração, no espírito, não segundo a letra, e cujo louvor não procede dos homens, mas de Deus) e a mera mutilação genital que não acompanha nenhuma conversão verdadeira nem traz nenhum fruto espiritual. Os primeiros e mais graves problemas da igreja foram causados pela resistência dos mutilados fisicamente e incircuncisos de coração (At 7.51 - Homens de dura cerviz e incircuncisos de coração e de ouvidos, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim como fizeram vossos pais, também vós o fazeis). 
CONCLUSÃO
Já vimos que a primeira característica de crentes que vão experimentando a alegria do Senhor em sua caminhada é que eles são guardiães da verdade de Deus, defensora da doutrina que uma vez por todas foi entregue aos santos (II Jo 1:9-10 - Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus; o que permanece na doutrina, esse tem tanto o Pai como o Filho. Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas).
Isto serve de advertência para os crentes do séc. XXI que, em nome do politicamente correto, se esquivam de defender a fé e, pior ainda, enchem a sua casa de doutrinas aberrantes e antibíblicas que resultam em práticas esdrúxulas quando não são abertamente ofensivas a Deus e pecaminosas. Quando pensamos em sã doutrina não devemos pensar somente em conhecimento, mas em como este conhecimento se expressa na prática. Não tenho sombra de dúvidas que Paulo diria para os crentes do séc. XXI para mudarem de canal quando estiverem transmitindo as verborragias e bobagens de pregadores caídos, malas falantes e suas bobagens internacionais, mundiais ou universais.
Conhecer a verdade de Deus é concordar com ela significa confiar inteiramente no Senhor, por isso crentes consagrados não cometem o equívoco de acreditarem-se capazes de produzir a própria alegria e satisfação eternas (Lc 12:19 - Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e regala-te).


[1] A circuncisão de Timóteo é por causa de uma circunstância de aceitação no campo de missões. Paulo, entretanto, não aceita circuncidar a Tito por causa de exigências religiosas dos judaizantes (Gl 2:3 - Contudo, nem mesmo Tito, que estava comigo, sendo grego, foi constrangido a circuncidar-se).

ESCOLHIDOS SEM MERECER PELO DEUS GRACIOSO

(Este e os três outros abaixo são uma sequência, e foram pregados em três semanas na IP de Paragominas). Disponíveis em vídeo no Youtube.

ESCOLHIDOS SEM MERECER PELO DEUS GRACIOSO

Por que você está aqui? A resposta natural é: porque eu quis. Porque me convidaram. Porque eu não tinha nada para fazer e resolvi ir a uma Igreja. Se insistir na pergunta, mas porque você está na igreja? Porque você resolveu ficar um dia e voltar outras vezes a reposta ainda pode ser porque eu me senti bem, porque eu gostei do ambiente, gostei da pregação, gostei da tranquilidade da Igreja Presbiteriana e outras coisas mais. Mas perceba que muitas vezes a ênfase verbal está sempre na primeira pessoa do singular. Sempre no eu.
E se perguntar, mais uma vez, porque esta Igreja especificamente, com todas as suas falhas, seus erros, seus pecados (porque não há Igreja que não falhe e cujos membros não tenham pecados) você ainda terá alguma resposta tentando justificar esta sua escolha. O problema é que tudo isto parte de um princípio equivocado. Estamos aqui porque Deus nos escolheu (Jo 15:16) com um propósito abençoador bem definido: para nos abençoar por sua graça (Tg 2:5).
Você está aqui porque Deus te escolheu, e Ele fez isto desde antes da fundação do mundo, para seu prazer e glória. O que eu e você precisamos saber é que Deus nos escolheu apesar da nossa feiura, apesar da nossa fraqueza, apesar da nossa pobreza, apesar da nossa loucura – e tudo isto enquanto pensamos que somos belos, fortes, ricos e espertos. Não somos! Nem toda a esperteza, nem riqueza, nem diplomas, nem vigor físico do mundo vai livrar um pecador da reprovação de Deus.
26 Irmãos, reparai, pois, na vossa vocação; visto que não foram chamados muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento; 27 pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; 28 e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são; 29 a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus (1Co 1.26-29).
O apóstolo Paulo começa esta seção irmanando-se aos coríntios. Chama-os de irmãos. Coloca-se no mesmo patamar em que eles se encontram, como se dissesse: o que vou lhes falar a partir de agora não é um fato apenas entre vocês, nem apenas entre os gentios, mas é comum a todos os santos. Paulo está dizendo-lhes: eu também passei por esta experiência. E é justamente para a experiência de salvação dos coríntios que Paulo chama a atenção. Enquanto eles estavam enfatizando o conhecimento (gnose) que nenhum fruto produziu em Atenas, Paulo lembra-lhes do que eles viveram e como eles se converteram, por isso a expressão enfática: reparai, isto é, coloquem todos as suas capacidades intelectuais para analisar como foi que foram chamados.
Mas, segundo Paulo, quem foram estes chamados de maneira tão eficaz e irresistível? Certamente não foram chamados para o que os homens do seu tempo amavam. Aliás, os homens naturais, judeus ou gregos, ou todos os homens indistintamente, rejeitavam a mensagem da cruz, aquele que é chamado, e só o que é chamado, a acolhe, seja judeu ou gentio. Paulo afirma que o que é importante não é o que eles eram, mas o fato de que foram chamados por Deus. Tudo o mais é irrelevante, sem importância.
Eles sabem que na fraqueza de Cristo reside o poder para vencer o que nenhum homem jamais conseguiu: o poder para dominar e vencer o poder do pecado. Eles experimentam este poder, pois Cristo é o poder de Deus neles e para eles.

DEUS CHAMA OS SEUS ESCOLHIDOS APESAR DO QUE ELES NÃO SÃO

Entre os coríntios crentes certamente havia pessoas instruídas, entretanto, eles não eram considerados como os homens sábios de seu tempo. Se olhassem todo o cristianismo nascente, certamente poucos rivalizariam com o próprio Paulo em conhecimento. Entretanto, o que nós vemos é Paulo lembrar-lhes que não havia muitos filósofos entre eles. Não era nestes que o Senhor estava interessado.
Não fazia parte do plano de Deus criar uma nova escola filosófica, nem homens confiantes na sua própria cultura (Rm 3.27). A percepção de Paulo era de que os homens haviam rejeitado a sabedoria de Deus, e, autodeclarando-se sábios, tornaram-se loucos. Em lugar do criador resolveram adorar a criaturas ou, ainda, a si mesmos e seus ídolos ideológicos (Rm 1.22). Era isso o que os coríntios estavam valorizando. E o que isso havia feito por eles antes do ingresso de Paulo entre eles?
A resposta é nada. Então, o conhecimento que eles estavam valorizando agora também nada poderia fazer a favor deles, e, pior, estava agindo contra eles pois os levava a contendas sem fim. O evangelho foi aceito pelos simples não porque era ineficiente com os sábios, pelo contrário, porque foi oculto aos sábios e revelado aos pequeninos (Lc 10.21). A palavra diz que assim foi porque foi do agrado de Deus, foi assim que Deus quis fazer porque ele não necessita em nada da sabedoria humana, tola e ineficaz. Deus usou para sua glória os que não tinham nada a oferecer, o que só enfatiza ainda mais a sua graça e poder.

NÃO SÃO CONTADOS ENTRE OS PODEROSOS

Embora houvesse convertidos na “casa de César” é certo que não havia muitos homens cristãos ocupando altos cargos neste tempo, especialmente porque os oficiais e governantes deveriam prestar o tão combatido culto ao imperador (1Jo 4:2). Lembremos que mesmo um governador romano era inferior à autoridade de Jesus.
Comparemos a autoridade de Jesus (Mt 28.18) com a autoridade derivada que Pôncio Pilatos possuía (Jo 19.10- 11). Qualquer cristão convertido deveria abandonar seus postos de poder, passando a ser considerados como se fossem a escória do mundo, peregrinos e forasteiros na terra. A valorização dos poderosos, e a divisão da Igreja em partidos, especialmente os “fortes”, pode indicar que alguns deles achavam que não haveria mal algum em curvar-se ante o culto imperial, permanecer no poder e ter condições de ajudar os cristãos - como se eles já não tivessem o auxílio necessário por intermédio do Espírito Santo.
O poder que importava e que ainda importa para os cristãos é o poder que vem de Deus, o poder do Espírito. E é por isso que Paulo lembra aos coríntios que, quando entre eles (1Co 2.4-5). Nenhum poderoso em Corinto podia chamar para si a autenticação de suas palavras e atos como possuindo autoridade vinda do próprio Deus. Paulo o fazia. E não podia ser questionado, nem por aqueles que estavam assumindo pertencerem a outros grupos.

NÃO SÃO CONTADOS ENTRE OS DE NOBRE NASCIMENTO

O cristianismo floresceu entre os homens comuns do séc. I. Libertos, senhores e escravos compunham um numeroso grupo social que não dispunha de privilégios - que, aliás, Paulo possuía (At 22:27-28) mas ao qual não dava qualquer valor (Fp 3.8: Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo).
Dinheiro podia comprar cidadania romana, mas jamais poderia comprar o acesso a Deus ou as bênçãos espirituais em Cristo Jesus (At 8:20), pelo contrário, o dinheiro pode ser uma terrível armadilha que engana quem o tem e quem se aproveita das migalhas que caem da mesa.
Mas de que servia ter o título de cidadão romano e não ter o nome escrito no livro da vida. De que adiantava aos coríntios valorizarem os nobres romanos, que os prendiam e perseguiam, e ter a nobreza de serem declarados filhos de Deus? Na verdade a nobreza de nascimento se apresentava como um empecilho à fé, uma vez que os nobres, tanto gregos quanto romanos, se julgavam descendentes de deuses ou semideuses, ou de fundadores das cidades a quem chamavam “heróis”, e os adoravam como os modernos romanos adoram seus santos. Tinham seu próprio culto familiar, ao seu heroico antepassado. Deixar de cultuar o herói e o antepassado significa a abandonar a família, perder o direito familiar, deixar de ser cidadão e passar a ser considerado um estranho em sua própria casa. Como esperar que alguém assim abandonasse tudo por Cristo, um obscuro galileu morto na Palestina? Houve alguns, é verdade, mas foram poucos, e eram menos ainda nos dias do apóstolo Paulo.
Após lembrar quem os coríntios não eram, isto é, nem sábios, nem poderosos nem nobres, e, mais especificamente, a quem Deus tinha preferido preterir, Paulo passa a mostrar-lhes quem eles realmente são. E o quadro não é nada animador se olharmos das perspectivas do mundo circundante porque o apóstolo lhes diz que, eles, os chamados, são loucos, fracos e insignificantes.

DEUS CHAMA OS SEUS ESCOLHIDOS APESAR DO QUE ELES SÃO

ELES SÃO CONTADOS ENTRE “AS COISAS LOUCAS DO MUNDO”

Os cristãos são colocados como uma coisa, um objeto de escárnio. Ninguém valoriza, ninguém dá atenção a um louco a menos que isto lhe seja uma ameaça. Mas, mais que isto, ninguém segue a quem considera não possuir nenhum tipo de saber. E é este tipo de loucura que o apostolo Paulo atribui aos cristãos. A expressão paulina refere-se à qualidade da loucura atribuída a eles, na aos próprios cristãos como pessoas. Eles não eram insensatos ou malucos. É o mesmo Paulo que afirmou expor sabedoria entre os experimentados (1Co 2.6 (i.e.: de grande labor mental)) que envergonha os sábios da época.
Os sábios consideravam loucura a mensagem do evangelho, mas a verdade que lhes envergonhava é que eles não tinham nada melhor a oferecer. Suas diferentes teorias eram apenas teorias, especulações vazias que não satisfaziam nem mesmo aos seus autores. Enquanto se digladiavam tentando oferecer ensinamentos vazios a preço de ouro, o cristianismo oferecia mensagem de salvação a preço de sangue - mas de graça aos que a recebessem. Isso lhes parecia loucura. Seu nada era caro, o tudo de Deus aos homens era sem custo algum para quem não merecia. Como aceitar?
Como aceitar que escravos fossem maiores que seus senhores? Como aceitar que pecadores precederiam religiosos dedicados no reino porvir (Mt 21.31)? Para um escravo ser tratado como “coisa” não havia novidade, mas para os arrogantes coríntios era extremamente humilhante, e é justamente neste momento que Paulo mostra a imensidão da graça de Deus. Nenhum de nós escolheria alguém igual a si mesmo para salvar - mas Deus o fez. A maravilha está justamente em Deus dizer que nada somos - e nos escolher para si.

ELES SÃO CONTADOS ENTRE “OS FRACOS DO MUNDO”

Parece um paradoxo pensar que os cristãos, filhos do rei, herdeiros de todas as coisas, não possuíam poder algum. Não tinham direitos legais nas cidades, eram constantemente perseguidos e não tinham defensores. Seus bens eram espoliados - seus filhos escravizados, eles próprios lançados às masmorras e anfiteatros para jogos cruéis e servirem de pasto a leões e outros animais ferozes. Um cristão genuíno não tinha direito legal para buscar reparação nos tribunais, e, tampouco, deveriam fazê-lo porque, espiritualmente, isto significa prestar oferendas aos deuses greco-romanos. Os heróis gregos, como Hércules, Perseu, Teseu, Ulisses e outros eram idolatrados. Notemos que os cristãos eram realmente fracos no sentido. E foram escolhidos assim para serem transformados em vencedores, em heróis como mostrado na galeria da fé. Mas nenhum deles enfrentava dezenas de leões sem armas, e, ainda, cantando louvores. Nenhuma das mulheres dos poderosos podiam suportar sentar-se em uma chapa de ferro em brasa e ainda continuar anunciando Cristo como Senhor.
Nenhum de seus senadores era capaz de caminhar para o cadafalso e, tendo a oportunidade de escapar, preferir a morte como uma maneira de anunciar a vitória sobre esta mesma morte. Um simples cristão era capaz de demonstrar maior força e coragem que todo senado romano. Deus os escolheu - eles tinham certeza da vitória, a morte não era temida porque já fora vencida, seu aguilhão não representava mais motivo algum de receio ou temor. Os fortes, tão admirados pelos coríntios, admiravam os mais fracos entre os cristãos porque, estes, na sua fraqueza, demonstravam força inigualável (2Co 12.10).

ELES SÃO CONTADOS ENTRE “COISAS” HUMILDES E DESPREZADAS, SEM VALOR

Homens sem sabedoria filosófica, sem poder político-econômico, e, agora, sem nobreza de nascimento.
Eram, aos olhos dos romanos, piores que os libertos ou os livres que enchiam suas cidades.
Eram piores que os imigrantes porque estes aceitavam de bom grado os costumes de sua época.
Eram piores que os escravos, pois afirmavam terem apenas Cristo como seu Senhor. Para tornar as coisas ainda mais claras aos olhos dos pretensiosos e jactanciosos coríntios, Paulo lhes lembra que eles, em sua maioria, eram imigrantes - tidos como cidadãos de segunda categoria aos olhos dos dominadores romanos. Podiam trabalhar, ajuntar dinheiro e comprar propriedades. Com muito custo podiam comprar a cidadania romana (At 22.8-29).
A idéia de não serem de nobre nascimento estava associada a uma certa indignidade moral, uma inferioridade que não poderia ser retirada de maneira alguma. Sua cidadania seria sempre comprada, nunca natural. E eles eram, efetivamente, tratados como coisa sem valor. Um liberto que morre logo tem seu lugar tomado por outro. Um escravo já significava prejuízo. Por isso Paulo os adverte que eram tidos por desprezíveis, e, ainda, um termo ainda mais forte, sem valor algum. A jactância coríntia era reduzida a nada.
E é justamente este o poder da mensagem da cruz: o que era nada, sem valor algum, desprezada e inútil, que é usado por Deus em uma atividade recriadora. Deus não precisava, necessariamente, usar nada do material existente nos chamados. Ele pôde recriá-los. E é com estas “coisas”, essas não pessoas, que nada eram que Deus torna sem valor algum, inútil e envergonhado, aquilo que tanto era valorizado pelos homens - e podemos afirmar que isto não mudou absolutamente nada.
Era assim nos tempos de Paulo, continua assim nos nossos tempos. Os homens ainda correm atrás dos “sábios”, dos poderosos, das nobres castas de seu tempo. E para que? Para nada. Como sempre foi.

DEUS GLORIFICA O SEU NOME ATRAVÉS DOS SEUS ESCOLHIDOS

Diferente do que se via entre os coríntios, e, que, certamente, não é nada diferente do que vemos ao nosso redor, não eram homens que deveriam ser glorificados. A existência da Igreja em Corinto, embora fruto do trabalho de Paulo como cooperador com o Senhor, devia-se exclusivamente à graça de Deus em Cristo Jesus (1Co 9.23). Ele sabia que trabalhara, e muito, e fizera um bom trabalho, na realidade, um grande trabalho (1Co 15:10) mas tudo como fruto da graça de Deus. Paulo é enfático ao escrever aos efésios (Ef 2.8). Não havia muita diferença na mentalidade reinante em Éfeso da que reinava em Corinto.
Paulo conclui seu raciocínio nesta seção afirmando enfaticamente que, pelo fato de Deus ter, por sua livre vontade, escolhido os fracos, os humildes, os sem nobreza de nascimento, os desprezados e, virtualmente, os que nada eram, eles não teriam qualquer direito a vangloriar-se, pelo contrário, deveriam andar humildemente diante do Senhor seu Deus (Mq 6.8) e considerando o seu próximo como digno de igual ou maior honra especialmente se comparados com a honra a que não tinham direito algum.
Ninguém pode jactar-se, nem diante dos irmãos (lembremos que a primeira palavra desta seção é, justamente, irmãos, quando Paulo os chama ao mesmo patamar de si mesmo e os convida a olharem quem são e como e porque foram chamados) e, principalmente, na presença de Deus, diante de quem a glória dos homens nada é.
Se atentarmos para o que somos, se olharmos ao nosso redor certamente vamos encontrar alguém que seja, em alguma coisa, mais habilitado, mais capacitado, mais dotado do que nós. Qualquer grandeza que tenhamos está alicerçada sobre algo e alguém que veio antes de nós. Qualquer riqueza amealhada está alicerçada sobre os ombros, mãos e suor de outros tantos. Mas, acima de tudo, a grandeza e honra entre os homens é insignificante diante de Deus (Sl 2.1) e mesmo as mais poderosas nações (Is 40.17) e aos que não são diz afirma enfaticamente: sois menos do que nada (Is 41.24).
Assim, aos olhos do Senhor era abominação escolher o nome de Paulo, de Pedro, de Apolo ou mesmo usar o nome de Cristo como pretexto para sua vangloria. É abominação aos olhos do Senhor sequer imaginar que, porque conquistou algo, pode jactar-se de alguma coisa. Tolice é acreditar em frases estúpidas e sem sentido como as que dizem que “Deus precisa de você”. Isto é bobagem. Nem mesmo a Igreja precisa de você – e talvez logo apareça alguém mal-intencionado dizendo que eu estou incentivando você a deixar a Igreja. O que estou afirmando é que é você quem precisa de Cristo. É você quem precisa de Deus. É você quem precisa da Igreja como comunidade de fé, onde você possa crescer espiritualmente e exercitar seus talentos e dons. Irmãos, observai a vossa vocação. Lembrem-se do que eram quando foram chamados. Não retornem à jactância mundana, arrogante, pretensiosa e inútil. Humilhai-vos perante a poderosa mão de Deus e ele, em tempo oportuno, vos exaltará (1Pe 5.6).

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

O JULGAMENTO CIVIL DE JESUS - Lc 23:5-11

O VERDADEIRO REI É JULGADO PELO USURPADOR

Na época de Jesus Roma dominava a maior parte dos reinos do mundo, semelhante ao império persa no período de Daniel. Assim como Dario respeitava cada povo e permitia o culto aos seus deuses, César permitia que as províncias tivessem a sua religião e organização social.
Havia várias regiões em Israel que eram comandadas por governadores designados por Roma. Além disso, havia representantes locais do império que tinham função de liderança sobre os judeus. Herodes, o Grande, e seus sucessores fizeram essa função. Herodes não era um nome propriamente dito, mas um título, assim como César, imperador romano.
Houve pelo menos quatro “Herodes” no Novo Testamento. Alguns deles governaram em períodos diferentes. O Herodes que mandou matar as crianças de Belém não foi o mesmo Herodes do tempo de João Batista.
Herodes, o Grande, avô de Antipas (Herodes mandou matar o próprio filho, Aristóbulo, pai de Antipas, por temer que este lhe tomasse o trono), era idumeu, nascido na região da Iduméia. Sua mãe era nabatéia. Não tendo sangue real judeu correndo em suas veias fez aliança com o império romano para manter-se no poder quando os partos tomaram Jerusalém e prenderam João Hircano II.
Herodes era o conselheiro chefe  e fugiu para Roma ficando sob proteção de Marco Antônio e este pediu ao césar Otaviano que estabelecesse o “confiável Herodes” como rei dos judeus, de modo que um descendente de Esaú assumisse o trono em 40 a.C. Não possuía descendência israelita e o remoto laço de parentesco se dava mediante uma tribo distante de Esaú (Edom) e seus descendentes tiveram laços consanguíneos com os macabeus ao casar-se com Mariane, neta de Aristóbulo II e de Hircano II em 37 a.C.
Conquistou a confiança dos judeus quando construiu o templo em Jerusalém, anteriormente destruído no período macabeu. Essa iniciativa fez dele um defensor da religião aos olhos do povo, embora, evidentemente, trabalhava para Roma obedecendo criteriosamente à palavra de César.
Herodes deixou descendentes que seguiram o mesmo estilo cruel e criminoso de governar: Arquelau, etnarca da Judéia, Felipe, tetrarca dos territórios do norte e da Transjordânia, e seu neto Antipas (filho de Aristóbulo), tetrarca da galiléia e Peréia.
Herodes Antipas, dominava parte da Judéia e localidades próximas ao rio Jordão. Daí o conflito com João, o Batista, que vivia naquela região. Antipas resolvia os problemas de ordem religiosa e de organização social. Somente as questões que afrontavam o governo romano como sonegação de impostos e insurreições eram encaminhadas ao procurador romano, naquela época representado por Pôncio Pilatos. Este sim representava a autoridade direta romana – inclusive sobre o próprio rei Herodes.
Problemas que envolvessem a religião e a lei dos judeus eram julgados por Herodes. Isso explica o porquê de Pilatos enviar Jesus à jurisdição de Herodes, uma vez que Jesus era galileu e a galiléia fazia parte do governo religioso de Herodes, pois a problemática era no âmbito da religião. Mesmo assim, e mesmo não vendo em Jesus nada de que o considerasse digno de morte Pilatos resolve usar Jesus politicamente enviando-o a Herodes apesar da acusação que os judeus faziam de um crime político (Lc 23:5).
Como vimos, apesar de cuidar de assuntos relacionados à cultura e religião dos judeus Herodes tinha tênues laços com os judeus, e seu interesse na religião era apenas para tê-la como instrumento de controle do povo de modo que nem ele nem os líderes religiosos tivessem problemas (Jo 11.48-50).
Vejamos o que a Palavra de Deus nos diz em Lc 23.6-11:
6 Tendo Pilatos ouvido isto, perguntou se aquele homem era galileu. 7 Ao saber que era da jurisdição de Herodes, estando este, naqueles dias, em Jerusalém, lho remeteu. 8 Herodes, vendo a Jesus, sobremaneira se alegrou, pois havia muito queria vê-lo, por ter ouvido falar a seu respeito; esperava também vê-lo fazer algum sinal. 9 E de muitos modos o interrogava; Jesus, porém, nada lhe respondia. 10 Os principais sacerdotes e os escribas ali presentes o acusavam com grande veemência. 11 Mas Herodes, juntamente com os da sua guarda, tratou-o com desprezo, e, escarnecendo dele, fê-lo vestir-se de um manto aparatoso, e o devolveu a Pilatos.
A Bíblia diz Herodes Antipas ouviu a fama de Jesus Cristo. Temeroso e supersticioso, ele até começou a sugerir que Jesus fosse João Batista redivivo (Mc 6:14-16). Depois ele procurou matar Jesus, e alguns fariseus aconselharam o Senhor a fugir (Lc 13:31). Mas Jesus não se intimidou diante das ameaças de Herodes Antipas considerando-o desprezível e malicioso como uma raposa (Lc 13:32) porque era rei maior até mesmo do que a daquele que tinha maior autoridade em Israel naquele momento (Jo 19:10-11).

O INTERESSE DE HERODES EM JESUS

Herodes Antipas havia herdado o caráter de seu avô. Em Roma havia agido sempre de maneira sorrateira, a ponto de ter que sair da cidade para não ser morto por causa de dívidas. Analisando suas ações em relação a Jesus podemos afirmar que Herodes tinha três interesses em Jesus:

USO POLÍTICO

Jesus precisava ser conhecido e controlado, porque representava um risco ao seu controle sobre os judeus. Seu avô já tentara matá-lo para não perder o trono (Mt 2:13) por causa das perguntas dos viajantes do oriente (Mt 2:2). Para ele Jesus não era nada mais do que um instrumento de controle religioso – inicialmente ele tinha medo que Jesus fosse o próprio João Batista que lhe ameaçava a popularidade denunciando publicamente as suas impiedades (Mc 6:18) e por isso foi morto por incitação da filha da mulher que possuía indignamente (Mc 6:19-24). Mais tarde decidiu matar a Jesus por questões políticas – para ele a religião era um mero instrumento de poder. E Pilatos também sabia disso (Lc 23:12) e aproveitou Jesus como moeda de troca para apaziguar o rancoroso e ladino rei depois de ter mandado matar alguns galileus (Lc 13:1).

SATISFAÇÃO DE CURIOSIDADE RELIGIOSA

Herodes já havia ouvido muitas coisas sobre Jesus – a sua fama corria por todo lugar. Certamente sabia que Jesus havia entrado em Jerusalém sob a aclamação das multidões (Mt 21:9). E não devemos duvidar de que isto o incomodava. erodes não é em nada diferente das multidões que enchem as igrejas procurando satisfazer sua curiosidade. Ele não queria a presença de Jesus como Nicodemos, como Zaqueu, como Jairo, a mulher hemorrágica ou o centurião de Cafarnaum. Ele só queria matar sua curiosidade. Queria saber se Jesus era mesmo capaz de fazer o que as pessoas diziam o tempo todo. Quem sabe Jesus fizesse um sinal miraculoso que o agradasse e que agradasse à plateia em seu palácio. Quem sabe Jesus o agradasse para não ser morto como João Batista foi. Mas, assim como com os religiosos que pediam sinais, aquele era só mais um incrédulo que não teria um show da fé particular (Lc 11:29).

SATISFAÇÃO DE CURIOSIDADE INTELECTUAL

Herodes também tinha curiosidade intelectual, interrogava Jesus porque sabia que Jesus ensinava de uma maneira diferenciada e isto todos reconheciam (Mc 1:22) e os escribas, com todas as suas artimanhas intelectuais, atitudes imorais e subterfúgios religiosos nunca haviam conseguido apanhá-lo (Lc 20:19-26). Em outra ocasião Jesus utiliza-se da mesma maneira de argumentar, e os escribas mesmo tendo sido desafiados a provar que havia algum erro no que ele fazia ou ensinava, são envergonhados mais de uma vez, e por isso ele os reprovava publicamente (Jo 8:46) e eles eram obrigados a calarem-se por temerem a opinião pública (Mat 21:23-24).

COMO JESUS LIDA COM ESTAS COISAS

Herodes Antipas foi a única pessoa em toda a Escritura com quem Jesus se recusou a falar. Ele não era digno de estar ali, ele não era o legítimo rei dos judeus. Ele estava num lugar que não era seu, era um usurpador (do latim usurpare, agarrar para uso próprio, apossar-se. Usurpar é a ação intrusiva, invasiva e criminosa individual de apossar-se mediante força, trapaça ou ato indigno coisas, bens, propriedades, títulos, cargos, função ou atribuição que não lhe é próprio, para o qual não tem nem pode obter dignidade de função, ofício, prerrogativa ou direito. Se exercido por mais de uma pessoa torna-se em associação para o crime).
Jesus falou com publicanos. Jesus falou com pecadores. Jesus falou com meretrizes. Jesus falou com leprosos, com samaritanos e com gentios. Jesus falou até com o diabo e seus demônios. Jesus falou até com os religiosos que tramaram e executaram seu julgamento indigno e também falou com o governador romano, Pilatos, porque eles estavam no lugar que tinham direito de estar.
 Herodes provavelmente desse pouca importância aos brados e acusações dos religiosos contra Jesus. Ele só queria ter sua curiosidade satisfeita – e viu-se frustrado nisso.
Herodes, não tendo satisfeitos os seus interesses, irado, trata Jesus com desprezo, escarnece dele e o devolve a Pilatos (Lc 23.10).
O destino de Herodes Antipas, um homem que teve a oportunidade de aprender com o Senhor e desprezou porque os Herodes tradicionalmente não aceitavam a idéia de nenhuma autoridade sobre eles (Mt 11:28).
Herodes preferiu ficar bem com o governante do mundo (César) e rejeitou se submeter ao Senhor dos senhores, e o fim de sua vida não é nada honroso. Foi derrotado por forças árabes sob o comando de seu e sogro Aretas IV e seus súditos consideravam sua derrota como retribuição divina por seus pecados cometidos (seu casamento irregular com Herodias, o assassinato de João Batista e a rejeição de Jesus).
Em 39 d.C. Herodes Antipas se envolveu em intrigas com seu sobrinho Herodes Agripa I e foi denunciado como conspirador e banido de sua tetrarquia pelo imperador Calígula, sendo exilado na Gália (França) onde morreu algum tempo depois.
Que lições podemos aprender com os erros de Herodes?
Jesus jamais se prestará a joguetes políticos e interesses mesquinhos.
Jesus jamais se prestará a ser animador de auditório satisfazendo curiosidade religiosa ou intelectual.
Jesus jamais satisfará os arrogantes anseios de satisfação do coração e da mente do homem.

COMO JESUS LIDOU COM HERODES, O USURPADOR

Pequeno excerto de mensagem pregada na III IP de Taguatinga Sul, 05 de novembro de 2019.
Herodes Antipas foi a única pessoa em toda a Escritura com quem Jesus se recusou a falar. Ele não era digno de estar ali, ele não era o legítimo rei dos judeus. Ele estava num lugar que não era seu, era um usurpador (do latim usurpare, agarrar para uso próprio, apossar-se. Usurpar é a ação intrusiva, invasiva e criminosa individual de apossar-se mediante força, trapaça ou ato indigno coisas, bens, propriedades, títulos, cargos, função ou atribuição que não lhe é próprio, para o qual não tem nem pode obter dignidade de função, ofício, prerrogativa ou direito. Se exercido por mais de uma pessoa torna-se em associação para o crime). 
Jesus falou com publicanos. Jesus falou com pecadores. Jesus falou com meretrizes. Jesus falou com leprosos, com samaritanos e com gentios. Jesus falou até com os demônios.
Jesus falou até com os religiosos que tramaram e executaram seu julgamento indigno e também falou com o governador romano, Pilatos, porque eles estavam no lugar que tinham direito de estar. Mas Jesus não falou com o ardiloso e curioso Herodes porque ele era um usurpador.

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