Há três prioridades que a Igreja deve buscar: o
reino de Deus, sua justiça mediante Cristo e uma entrega dos resultados ao
Senhor, em absoluta dependência. À partir daí, acredito que surgirá, como fruto
da atuação de Deus na vida da Igreja, uma disposição para a obediência, como
ocorreu no coração de Esdras, que estava disposto a buscar, cumprir e ensinar a
lei do Senhor (Ed 7.10)
mesmo em um ambiente hostil à sua fé – tanto em Babilônia quanto em Judá nos
primeiros dias da reconstrução, com oposição tanto de judeus quanto dos gentios
do lugar.
A Igreja não é como a seleção de 1970 – segundo os
relatos dos boleiros quando o técnico João Saldanha foi perguntado sobre como
escalava o time e dava as orientações técnicas, ele respondeu que simplesmente
escolhia os 11 e eles faziam o que sabiam fazer de melhor. Pode até ser
verdade, e pode ter dado certo com a seleção de 70, mas quando o povo de Deus
caminhou desta maneira, cada um fazendo o que melhor lhe parecia, o resultado
foi o fracasso nos dias dos juízes. O chamado de Deus para sua Igreja é o mesmo
para Israel – se ouvir, comerá o melhor da terra, mas em caso de contumaz
rebelião, punição inescapável porque é o Senhor quem diz (Is 1.19-20).
Lamentavelmente o conhecimento que a Igreja tem
adquirido tem se mostrado muito mais informativo, lúdico, descritivo,
intelectivo do que o que realmente deve ser: o conhecimento da Palavra de Deus requer
obediência porque a Palavra é imperativa – ela diz o que deve ser feito.
É importante que a Igreja considere como prioridade absoluta
ouvir e obedecer ao Senhor conforme ele instrui em sua Palavra, e esta
obediência é ensinada pelo Senhor em pelo menos três ações concretas. Às vezes ouço
cristãos dizendo: não sei o que fazer, não sei como aplicar a bíblia à minha
vida. Bom, então, vou lhe apresentar três áreas onde ela pode ser
eficientemente aplicada, áreas onde não há dúvidas sobre o que fazer ou como
fazer. Eis três ações prioritárias que a Igreja jamais deve desconsiderar, se
quiser, naquele dia final, ouvir do seu Senhor: “Bem está, servo bom e fiel”
(Mt 25.21).
16
Seguiram os onze discípulos para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes
designara.
17
E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram.
18
Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no
céu e na terra.
19
Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do
Pai, e do Filho, e do Espírito Santo;
20
ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou
convosco todos os dias até à consumação do século.
Mt 28.16-20
Observe que o texto lido começa falando de
obediência – os onze discípulos restantes uma vez que Judas Iscariotes havia se
matado (Mt 27:5)
foram para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes designara, isto é, estavam
obedecendo uma ordem de Jesus. A primeira atitude dos onze discípulos, ao verem
Jesus, foi dar-lhe a honra que lhe era devida, isto é, o adoraram reconhecendo
sua divindade e, ao mesmo tempo, uma possível tradução é que todos tinham
dúvidas – certamente não a respeito de sua divindade, mas do propósito de
estarem ali e para onde iriam agora – que rumo suas vidas tomariam? O texto não
diz que dúvidas eram essas, e Mateus, que é testemunha ocular deste fato, não
nos diz nada além disso. Adoraram a Jesus, mas, e agora? O que vem depois?
Jesus não lhes deixa sem a resposta que tanto
necessitavam. Como ele mesmo foi enviado, agora ele os enviava (Jo 20:21). Como ele foi enviado
na autoridade do Pai, agora ele lhes afirma possuir toda autoridade no céu e na
terra, autoridade que já havia demonstrado mais de uma vez, como quando ordenou
ao mar e aos ventos que se acalmassem. Sim, ele era “verdadeiro Deus” e recebia
dos seus a adoração que era devida.
Com a autoridade divina, Jesus envia seus
discípulos com uma missão. E é neste envio que encontramos a tarefa prioritária
da Igreja que já adora a Jesus e já o reconhece como seu Senhor. A obediência
não produz adoração – é a adoração, o reconhecimento de que Jesus é o Senhor e
Deus que leva o crente a obedecer. Esta obediência implica em
i.
FAZER DISCÍPULOS
19 Ide, portanto, fazei discípulos de todas
as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo;
Mt 28.19
Evangelização não é a tarefa prioritária da Igreja.
Sua tarefa prioritária é glorificar a Deus, é adorá-lo. Evangelização é um
aspecto desta glorificação (Jo
15.8) na medida em que outros conheçam a Jesus através
do testemunho dos seus adoradores (II
Ts 1.10) e isto não é opcional.
Fazer discípulos do Senhor Jesus é uma das tarefas
mais sublimes da Igreja, pois nela ela adora ao Senhor e glorifica o salvador
conduzindo outros pecadores à salvação graciosa que ele lhes deu. É a tarefa de
compartilhar o que nada lhe custou, e, dando, nada perder, na verdade, ao dar
ficar ainda mais enriquecido. Esta é uma das razões pelas quais o Senhor deixou
sua Igreja na terra (I Pe 2.9).
É através do ‘fazer discípulos’ que a Igreja
demonstra, de fato, querer ver cumprida o seu pedido na oração que o Senhor
ensinou – que peçamos a vinda do seu reino (Lc
11.2). A ordem de Jesus, “fazer discípulos”, precisa
ser compreendida e obedecida. As palavras de Jesus exigem compreensão e ação.
Excesso de teoria nada produz, ação sem propósito pode levar ao caos.
Um discípulo é, em essência, alguém que está
aprendendo ao mesmo tempo que pratica o que aprende. Aprendizado é algo
prático. Um discípulo é um ouvinte praticante. A ordem de Jesus é para que as
pessoas sejam ensinadas através do ouvir, e aprendam enquanto praticam. Um
discípulo de Jesus nega-se a si mesmo para seguir a Jesus (Lc 14.26), amando a Deus,
abominando o pecado e buscando a santidade (Lv
20.7), servindo e amando a Cristo e a sua Igreja,
apesar das imperfeições da Igreja por amor do seu perfeito Senhor, amar os
perdidos e deseja-los vê-los todos adorando a Jesus, buscando convertê-los
através da pregação e de boas obras de amor, justiça e misericórdia (Tt 2.11-14).
Enfim, um discípulo é alguém que vive no mundo
como se do mundo não fosse, e faz isso pela fé em Cristo e no seu evangelho (Rm 1.17) esperando em Cristo
pela glória vindoura, não dando valor para a glória deste mundo (e nem para
suas aflições) porque tem uma esperança que o sustenta em meio às muitas
aflições (I Co 4.17-18).
Discípulos não são feitos ao acaso, mas por meio
do ministério da Palavra, confiada à Igreja, mediante pregação, ensino,
evangelização e aconselhamento (II
Tm 3.16-17) e isto pode ser feito tanto formal quanto
informalmente em conversas, tanto no templo como em qualquer outro lugar. E
isto é um imperativo de Jesus para todos os seus seguidores (Mt 28.19).
Discipular significa exortar à partir da Palavra
de Deus, chamando as pessoas a se tornarem mais parecidas com Cristo, ensinar
as pessoas o que Cristo ordenou, ensinar as pessoas a obedecerem tudo o que
Cristo mandou, ensinar as pessoas a obedecerem no contexto de sua vida, na
Igreja e fora dela. Discipular, enfim, significa que a Igreja deve chamar gente
de todas as nações para que sigam a Cristo e se tornem também seus discípulos.
Fazer discípulos, como ordena o Senhor, significa
que os mesmos necessitarão ver o modelo de Cristo em nós (Fp 4.9), e não servindo de
motivos para escândalo, fazendo tropeçar (graças a Deus não se perder) os que
querem entrar no Seu Reino (Lc
17.1-2).
ii.
ZELAR PELA PALAVRA
20 ensinando-os
a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco
todos os dias até à consumação do século.
Mt 28.20
A primeira tarefa que a Igreja deve considerar,
sob o mandato do Senhor, é a de fazer discípulos. Mas algumas perguntas se impõem:
como? Sob que base? Qual deve ser o ensino a ser transmitido? A Igreja não pode
ir por todo o mundo sem uma mensagem definida, consistente, coerente. E, mais
do que isso, ela tem que possuir mais que uma simples mensagem, ela precisa
transmitir a mensagem que é o poder
de Deus para salvação do que vier a crer (Rm
1.16).
Isto não deveria ser algo necessário de ser
lembrado para a Igreja, mas se tornou absolutamente essencial pelo fato de que
é cada vez mais comum as Igrejas se guiarem por visões e estratégicas,
dependendo mais do interesse e caráter dos seus líderes do que, propriamente,
confiando no poder da Palavra que dá vida e impulsiona a vida da Igreja a uma
vida de santidade (Jo 17.17e). Lamentavelmente
é possível encontrar pessoas que, de bíblia em punho, falam tudo o que querem
menos o que Jesus quer que seja dito.
Aos apóstolos, verdadeiros apóstolos que
conviveram com o Senhor antes e depois de sua ressurreição, com exceção de
Paulo que não teve o privilégio de ser chamado antes da cruz, o Senhor diz que
o Espírito os guiaria a toda a verdade (Jo
16.13) que não seria nenhuma descoberta nova, nenhuma
nova visão, mas a lembrança das coisas que Jesus lhes dizia (Jo 14.25-26). Isto quer
dizer que não há novas verdades – somente aquelas que constam do “ensino dos
apóstolos” (Ef 2.20).
Qualquer que se apresente com novas visões e revelações não passa de enfatuados
que querem enganar a Igreja para que os sigam, afastando-a de sua tarefa de
zelar pela verdade (Jd 1.3)
mesmo que isso exija uma batalha diligente e constante.
O que a Igreja precisa compreender é que ela deve
guardar tudo o que o Senhor ensinou. Nada do que Jesus disse ou fez foi sem
sentido ou propósito. E tudo o que ele fez e disse que fosse necessário para a
nossa salvação e edificação foi registrado (Jo
20.31) pois só assim, só guardando as palavras do
Senhor no coração ela evita o pecado da desobediência, intencional ou não (Mt 22.29) ou do desvio
negligente (Dt 5.32).
Porque ninguém sem a sã doutrina não se pode
chegar a “varão perfeito”, completo em Cristo, acabando por tornar-se como
“meninos inconstantes, levados em roda por todo vento de doutrina” (Ef 4.11-14). Apóstolos,
profetas, mestres, evangelistas – todos eles têm a mesma função, com aplicações
diferentes: anunciar o que o Senhor Jesus ensinou. O que passar disso nada mais
é do que outro evangelho, e sem ser o poder de Deus, é absolutamente sem
aproveitamento algum, anátema (Gl
1.8).
Sem o
genuíno leite espiritual, a Igreja simplesmente adoece, e, doente, não pode crescer
para a salvação (I Pe 2.4-5). Como Timóteo
cada discípulo do Senhor deve permanecer fiel, com raízes fortes e profundas
naquilo que foi ensinado pelo Senhor através de seus servos (II Tm 3.14-15).
A Igreja contemporânea está ameaçada por muitos
ensinos falsos que não passam de ensinos de demônios (I Tm 4.1), por isso, devemos
combater veementemente tudo que coloca empecilhos à eterna vontade de Deus.
Nada mais falso do que usar erroneamente a bíblia para combater o esforço
doutrinário que a Igreja deve empreender (II
Co 3:6) porque o que Paulo diz aos coríntios é que a lei
aponta para o pecado e para a condenação, serve de luz sobre o pecado e de base
para a condenação, mas é pela letra que conhecemos o evangelho que salva.
iii.
VALORIZAR A COMPANHIA DE
JESUS
20 ensinando-os a guardar todas as coisas que
vos tenho ordenado. E eis que estou
convosco todos os dias até à consumação do século.
Mt 28.20
A mesma Igreja que faz discípulos e Jesus, isto é,
ensina os convertidos a guardarem as coisas que o próprio Senhor Jesus ensinou
também deve dar valor a estar na presença do Senhor, como expressa
magistralmente o salmista ao afirmar que um dia nas portas da casa de Deus vale
mais que mil dentro das tendas onde o nome do Senhor não é temido nem honrado (Sl 84:10).
De todas as bênçãos que Deus concedeu a Moisés,
nenhuma ele valorizava mais que a presença do Senhor (Ex 33.14-16).
Quando Moisés terminou sua missão, Josué, seu sucessor também recebeu
promessas, mas certamente nenhuma mais valiosa do que a de ser com ele por onde
quer que fosse (Js 1:5).
Todas estas promessas de Deus apontam para o
cuidado pessoal, direto e constante de Deus, a ponto de seu próprio Filho ser
intitulado “Deus conosco” (Mt 1:23).
Quando Jesus chamou seus discípulos ficou claro que seu chamado era para,
prioritariamente, estarem com ele (Mc
3:14) pois só assim poderiam ser testemunhas oculares
(II Pe 1.16).
A um grupo de discípulos atônitos que tinham
acabado de passar pela experiência de perder seu líder e mestre, a ponto de se
esconderem com medo dos judeus (Jo
20:19) e que experimentaram recuperar seu ânimo com a
presença do mestre Jesus faz a promessa de ir para o Pai mas não deixá-los
desamparados (Mt 28.20).
Agora, porém, havia uma diferença fundamental – eles acreditavam naquilo que
Jesus lhes dizia – e sua promessa era de estar com eles, todos os dias, até a
consumação do século.
Foi esta certeza que impulsionou a Igreja, que fez
dela a mais impactante agência de propaganda que a história jamais viu. Um
grupo de galileus iletrados consegue, apenas com a força da Palavra, ser
vitoriosa sobre a organização religiosa judaica, sobre a organização militar
romana e sobre a filosofia grega (II
Co 10.4-6).
É a presença do Senhor, e não a inteligência de
seus membros, ou as estratégias dos planos anuais, bianuais ou plurianuais que
garantem que a Igreja é, de fato, mais do que vencedora (Rm 8:37). A Igreja que sabe
disso tem como sua prioridade andar com seu Senhor, andar na presença do seu
Senhor, amá-lo incessantemente. Cristo tem grande prazer em ter sua Igreja
consigo, e vem até sua Igreja para que ela goze da maior das bênçãos que uma
Igreja pode desejar – sua presença festiva (Ap
3.20).
CONCLUSÃO
O grande erro de Adão e Eva, após pecarem, foi o
de se esconderem da presença de Deus (Gn
3:8). É grande erro, mesmo quando estiver errado,
afastar-se da presença de Deus como se isso fosse resolver os problemas
causados pelo pecado (Ef 4:17).
A Igreja deve valorizar a obra de Jesus, que veio para evangelizar paz (Ef 2:17), isto é, trazer boas
novas de paz da parte de Deus para com os homens pecadores e rebeldes.
Qual a nossa relação com aquela Igreja que ouviu o
Senhor ordenar-lhes que, sob sua autoridade, fizesse discípulos de todas as
nações e ensinasse a estes convertidos as coisas que ele tinha ensinado? Toda,
ou nenhuma. Pensemos:
i.
Ou é como se nós estivéssemos lá, ou não
somos discípulos de Jesus, e este mandamento não é para nós. Todavia, eu
acredito que, da mesma maneira que aprendemos no evangelho, é como se
ouvíssemos estas benditas palavras de sua própria boca, ou, então, não somos
seus discípulos;
ii.
Ou temos a mesma relação direta com aquela
Igreja apostólica como ela estava em relação ao mundo que a cercava ou então o
mundo não tem qualquer significado ou importância para nós. Os discípulos de
Jesus foram compelidos a anunciarem o evangelho, mesmo que isto lhes custasse a
vida (I Co 9:16).
Desta maneira, ou o mandato do Senhor era urgente para os pecadores de então e
já não faz mais sentido para nós hoje, e não somos mais necessários como
discípulos que fazem discípulos, ou, então, ele continua urgente – ou então
Deus não tem mais nenhum pecador como alvo do seu amor.
iii.
Ou o mandato do Senhor é, hoje, tão
importante hoje como ontem e nós somos absolutamente inúteis. Mas eu creio que
o mandato do Senhor é um mandato universal (para todos os discípulos e para
todas as nações); é intelectual (é para discípulos entenderem e disseminarem
seus ensinos) e é abençoador, pois leva o pecador, outrora inimigo, a tornar-se
filho de Deus (Jo 1:12).
Ou nós somos parte da mesma Igreja, e, portanto,
precisamos aprender a ser Igreja e a levar adiante o plano do Senhor para sua
Igreja, ou então estamos apenas brincando de ser crente – e isto é uma absoluta
perda de tempo. Temos uma identidade, somos Igreja do Senhor, temos uma missão
– ser Igreja do Senhor. Não deixemos de fazer o que é nosso dever e razão de
existir.
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