quarta-feira, 17 de outubro de 2018

SOBRE RELIGIOSIDADE E FÉ [Jo 3.1-21]


REFLETINDO SOBRE RELIGIÃO E FÉ À PARTIR DA VISITA DE NICODEMOS A JESUS
Numa noite, há aproximadamente vinte séculos, um homem tomou uma atitude que seria comentada, estudada, interpretada e que serviria de exemplo, mesmo debaixo de severas críticas, para muitos cristãos ao longo de tantos séculos. Seu nome: Nicodemos. Sua história: a visita de um religioso cheio de si a um mestre religioso desprezado pela maioria dos religiosos, como o próprio visitante. Seu propósito ao fazer a visita é motivo das mais diversas interpretações, e só nos resta dizer desconhecermos a real motivação de Nicodemos.
Naquela noite, quando achava que estava terminando a sua visita, na verdade Nicodemos estava começando uma nova etapa insuspeita de sua vida - uma etapa que começava com uma grande decepção religiosa e terminaria em salvação eterna, contrariando a perspectiva comum de que é a religião, ou a religiosidade, quem conduz à salvação.
Nicodemos tinha conhecimento teológico mas este conhecimento não lhe dava a satisfação intelectual necessária e por causa desta insatisfação ele estava em busca de algo mais, de um conhecimento que ele não poderia encontrar nos livros, nos comentários rabínicos, nos midrash e talmudes disponíveis.
Nicodemos tinha status político-eclesiástico, numa comparação simplista seria como se ele fosse um dos subprefeitos de uma grande cidade, na verdade, de toda uma província, a Palestina. Sua autoridade ia de pequenos assuntos civis até grandes questões religiosas - apenas a aplicação da pena de morte era vedada aos membros do sinédrio, embora os mesmos pudessem recomendá-la e requerê-la aos governantes romanos. Mas ele descobriu que nem mesmo toda a autoridade do sinédrio poderia dar-lhe a satisfação que sua alma angustiadamente procurava na religiosidade política.
Nicodemos era mestre teológico de Israel, e ainda assim logo foi advertido que seu diploma poderia ser pregado na parede mas não lhe garantia o nome no livro da vida, precisando, portanto, nascer de novo. O problema é que seus estudos teológicos nunca lhe levaram à percepção desta necessidade. Ele via a vida como uma linha que o levava sempre adiante, na qual ele precisava sempre de algo mais, precisava ir acumulando conhecimento e reconhecimento, sendo o mais obediente possível à letra da lei (frequência aos cultos, orações constantes e longas, leitura assídua das Escrituras, contribuições criteriosas), mesmo que isto resultasse num formalismo mecânico.
Você pode ler o evangelho de João e se perguntar, por exemplo, porque Nicodemos aparece neste livro com alguma ênfase? Porque o livro de João diz que Jesus veio para o que era seu, e os seus não o receberam (Jo 1:11)? João também afirma que aqueles que receberam a Jesus ganharam a dádiva da nova vida, do novo nascimento e serem feitos filhos de Deus (Jo 1:12) como Jesus afirmou ser uma necessidade absoluta para o espantado mestre Nicodemos (Jo 3:7).
João insiste neste ensino até o fim do seu evangelho, afirmando que tudo que ele escreveu foi para que os seus leitores cressem que Jesus é o Filho de Deus e, crendo, pudessem receber a vida que ele dá pela fé em seu nome (Jo 20:31). E como se não fosse suficiente, esta continua sendo a tônica em sua primeira carta (1Jo 5:13).
Nicodemos é mais que um personagem de uma historia - Nicodemos é a representação de uma das muitas formas da humanidade tatear em busca de Deus (At 17:27), atendendo ao anseio essencial implantado no coração do homem que o homem tenta, desesperada e inutilmente, arrancar e acaba endeusando seres ou coisas, numa loucura vã (Rm 1:25).
Nicodemos, visitando Jesus naquela noite, talvez seja exatamente como você, aqui, agora. Quero que você acompanhe comigo um pouco mais sobre a trajetória deste homem e espero que você encontre o que necessita para satisfazer o seu coração. O que vamos aprender nesta noite com esta história?
NÃO É SOBRE EXPERIÊNCIA RELIGIOSA
Há alguns anos, enquanto transformava uma comunidade de cristãos e muitos amigos num mausoléu para menos de uma dúzia de frequentadores com reuniões lúgubres uma vez por semana uma família exclamava exasperada: “Somos filhos de presbiterianos, netos de presbiterianos, nossos bisavós conheceram os missionários americanos que vieram para o Brasil”. E onde estão hoje? Em lugar nenhum - deixaram a denominação de que se orgulhavam, perambularam por outras denominações e hoje um deles ainda visita esporadicamente a Igreja.
Orgulhar-se de suas tradições e raízes eclesiásticas não era uma exclusividade de Nicodemos, como podemos perceber facilmente. Sempre é possível encontrar, em qualquer ambiente religioso, pessoas que se orgulham de seu histórico religioso, de seu conhecimento religioso, de seu tempo de vida religiosa. Os judeus expressavam isto coletivamente afirmando que tinham as promessas de Deus, e de fato tinham (Rm 9:4-5), insistindo que seus eram os profetas (e de fato eles eram judeus)
Orgulhosamente faziam tremular a bandeira de que deles viria o Messias, que seria enviado para eles (Jo 4:22) e que eram descendentes de Abraão, embora esta descendência fosse segundo a carne (Rm 9:8). Tudo isto, que deveria ser uma grande bênção para a nação tornou-se em instrumento para endurecimento e rejeição ao Senhor Jesus (Rm 11:25).
Por mais que busquemos simpatia com Nicodemos, este é o quadro mais próximo que temos de sua religiosidade. Ele era capaz de rodear o mar e a terra para fazer um prosélito e depois torná-lo escravo do seu legalismo como eles mesmos eram, ou ainda pior pois, como eram judeus de sangue, estavam sempre obrigados a diariamente dar provas de sua religiosidade (Mt 23:15).
Mas... Provavelmente Nicodemos seria tido como um bom religioso, um bom membro de alguma Igreja, afinal, conhecia as Escrituras, orava diariamente, não era injusto, nem roubador, nem adúltero, era patriota, jejuava duas vezes por semana e era dizimista (Lc 18:11-12). Sinceramente, qual pastor não desejaria ter uma dúzia de membros assim na Igreja? Provavelmente na maioria das igrejas logo seriam eleitos como diáconos e presbíteros, representantes ou presidentes de presbitério, sínodo, etc... - como Nicodemos foi para o Sinédrio.
NÃO É SOBRE ONDE SUA RELIGIÃO TE LEVA
A religiosidade de Nicodemos o levava à sinagoga - e não há mal algum nisto. As sinagogas surgiram como parte do plano de Deus para reunião do povo quando os judeus estavam no cativeiro babilônico quase 5 séculos antes e que fazem parte daquilo que Paulo chama de disposições de Deus (Ef 1:10). Como não tinham os templos os judeus se reuniram nas sinagogas - e os cristãos, quando espalhados pela perseguição foram até as sinagogas anunciando a chegada do Messias (Lc 12:11). Não havia nenhum problema em Nicodemos estudar as Escrituras, em reunir-se com outras pessoas para estudarem as Escrituras. Era um bom lugar para ir, como são boas as reuniões de quarta-feira para estudo e oração.
A religiosidade de Nicodemos o levava ao templo - e não há mal nisto também. Era dever religioso dos judeus comparecer ao templo, oferecer sacrifícios e entregar seus dízimos e ofertas. Todas estas práticas estavam de acordo com os preceitos religiosos que o próprio Deus estabeleceu (Dt 14:23). Era seu dever e ele o cumpria religiosamente, mais que muitos cristãos que precisaram, já nas primeiras décadas do cristianismo, de exortação para ir aos cultos (Hb 10:25).
É possível que a religiosidade de Nicodemos o levasse a lugares onde outras pessoas precisam de ajuda, onde houvesse órfãos, viúvas e estrangeiros precisando de algum tipo de assistência (Mq 6:8) e ao mesmo tempo providenciando para que eles não passassem necessidade em meio ao povo de Deus (Dt 24:19).
A religiosidade de Nicodemos chegou a levá-lo à casa onde Jesus estava, e, temos que admitir, era um lugar melhor do que qualquer outro no mundo para ele estar. Mas, da mesma maneira que Nicodemos, muitos outros foram a lugares onde Jesus estava. Estas pessoas podiam ser contadas aos milhares, e cada uma delas tinha suas próprias razões, como enfermidades que desejavam ser curadas, fome que precisava ser saciada e até mesmo por cobiça (Lc 12:13). Religiosidade leva às pessoas a qualquer lugar do mundo - mas não vai além disso. Não pode ir além disso.
Mas a religiosidade de Nicodemos não podia levá-lo além disso. Ele não tinha a percepção que Pedro teve quando, depois de muitos terem abandonado a Jesus, disse: Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras da vida eterna (Jo 6.68).
 NÃO É SOBRE O QUE VOCÊ FAZ PELA RELIGIÃO
Mas, havia um problema com os escribas e fariseus. E Nicodemos era um deles. Ele estava lá. Ele ouvia o que Jesus lhe dizia, mas ele era incapaz de compreender e praticar.
Há um problema com a religiosidade, e você não pode estar satisfeito consigo mesmo simplesmente por ser um religioso. Os fariseus, acompanhados dos escribas, ensinavam muitos preceitos que eram bons, a ponto de Jesus dizer aos seus discípulos para fazer e guardar o que eles ensinavam (Mt 23:3) mas eles eram como placas, hábeis para apontar o caminho, mas eles próprios não iam além disso. Os fariseus tiravam nota 10 em religiosidade, mas eram reprovados em vida com Deus (Jo 10:26).
Nicodemos certamente sabia o que devia fazer, e talvez até fizesse muitas coisas boas, provavelmente era extremamente obediente aos preceitos da lei e às interpretações dos seus companheiros de religião, os escribas (sendo ele próprio, provavelmente, um deles pois era considerado rabino) mas, por causa da sua religiosidade invalidada a Palavra de Deus, desprezava o verdadeiro sentido do mandamento (Mt 15:3).
Anos depois deste episódio Pedro prega em Jerusalém e a primeira reação dos judeus, muitos judeus zelosos como Nicodemos, foi perguntar o que deveriam fazer para compensar o fato de terem rejeitado e matado o messias. É sempre a mesma coisa: estou em débito, minha balança está mais pesada pro lado mau, meu limite está no vermelho: como compensar? O que eu tenho que fazer para merecer.
Nicodemos e os fariseus faziam todas as coisas que a religião permitia - mas seu alvo, no fim, denuncia Jesus, era serem vistos, isto é, reconhecidos e honrados (Mt 23:5).
Nicodemos e os fariseus eram discipuladores, mas faziam discípulos para si mesmo e para sua doutrina, e não para o Senhor - pelo contrário, seus discípulos acabavam duas vezes mais perdidos do que eles, porque religiosidade carnal só pode produzir carnalidade, que pode até ser sincera, mas ainda é terrena. A esperança dos fariseus no que faziam é duramente advertida pelo Senhor ao dizer-lhes que muitos que faziam coisas em nome do Senhor não tinham nada que receber das mãos do Senhor porque não eram seus servos (Mt 7:23). Considere isso: não é o que você faz, por mais sincero que você seja. Não se esqueça que a salvação não é alcançada por méritos, mas pela fé implantada por Deus naqueles a quem ele amou por sua absoluta e soberana misericórdia (Rm 9:16). Não é sobre o que você faz na Igreja que precisamos refletir agora. Não é sobre isto que Jesus está tratando com Nicodemos.
 É TUDO SOBRE EM QUEM VOCÊ CRÊ
Olhemos mais um pouco para Nicodemos. Ele era um homem de muitos conhecimentos teológicos - mas não era salvo, não podia ver nem entrar no reino de Deus. Apesar de ser um dos maiorais dos fariseus ele era um perdido com grande conhecimento das Escrituras. Este é o diagnóstico que o Senhor Jesus faz dele.
Este homem também era um homem que frequentava os lugares de culto com grande assiduidade e participava dos tribunais onde as causas do povo deveriam ser julgadas com imparcialidade, defendendo especialmente o órfão, a viúva e o estrangeiro. Apesar de ser um dos maiorais dos fariseus ele era um perdido que frequentava os templos e sinagogas. Este é o diagnóstico que o Senhor Jesus faz dele.
Certamente este homem era capaz de fazer coisas boas, ajudar pessoas que estivessem passando por dificuldades. Não devemos duvidar de seu comprometimento em fazer coisas religiosas. Apesar de ser um dos maiorais dos fariseus ele era um perdido que tinha muitas atribuições religiosas. Este é o diagnóstico que o Senhor Jesus faz dele.
A questão toda não é sobre o que ele conhecia, aonde ele ia ou que tipo de compromissos religiosos ele era capaz de desempenhar. A questão é que ele não nascera de novo (Jo 3.7). A questão é que ele ainda era um incrédulo, ainda se mantinha rebelde, sem reconhecer o Filho como o enviado de Deus (Jo 3:36).
João afirma que Jesus veio para dar vida a todo aquele que nele cresse, passando da morte para a vida e não sendo julgado como ímpio (Jo 3:18). João afirma que Jesus foi enviado por Deus para salvar o mundo - e, ao mesmo tempo, como demonstração do julgamento de Deus, da ira de Deus sobre o pecado e sobre os pecadores rebeldes (Jo 3:19).
Jesus diz para Nicodemos que, fosse qual fosse a motivação dele para estar naquele lugar, àquela hora da noite, sua motivação precisava ser revista (Jo 3:20-21). Aquele que efetua o querer e o realizar (Fp 2:13); aquele que inclina o coração dos reis como ribeiros de águas de acordo com o seu querer (Pv 21:1) o levou ali para que ele soubesse que o que ele sabia não era suficiente; para mostrar que os lugares religiosos que ele frequentava não resolveriam o seu estado de afastado de Deus; para mostrar que, fizesse o que fizesse, mesmo com as melhores intenções, suas melhores obras não passavam de trapos de imundice (Is 64:6).
Jesus diz para Nicodemos que ele foi ali para aprender que precisava crer no filho de Deus, precisava crer nele, Jesus, como o Filho de Deus, e, crendo, receber o poder de ser feito filho de Deus, receber a vida eterna que era concedida somente aos que cressem nele, Jesus. De maneira indireta Jesus diz que a atitude de Nicodemos, de procurá-lo sob o manto das trevas indicava sua natureza: quem é das trevas ama as trevas, faz as coisas sob as trevas, mas Nicodemos estava diante da luz do mundo, da luz que alumia a todo homem - e, se quisesse mesmo conhecer, ver e experimentar as coisas do reino celeste, deveria crer nele, Jesus, como o enviado de Deus e achegar-se à luz (Jo 8:12).
Nicodemos era mestre em Israel, e, sendo terreno, tinha limitações em compreende as coisas terrenas como qualquer outro homem (Jo 3.12). Mas, crendo em Jesus, seria capaz de discernir e compreender as coisas espirituais (1Co 2:14).
Não era sobre onde ir ou o que fazer, era sobre crer em Jesus. Quando os discípulos foram questionados se não queriam votar para suas casas a resposta de Pedro não foi “para onde iremos” mas “para quem iremos” (Jo 6:68-69) e isto era fruto de um discernimento espiritual (Mt 16:17). Você pode ir ao mundo inteiro por causa da religião; você pode passar toda a sua vida dentro de uma Igreja cristã como membro dela e ainda assim estar longe de Deus porque, mais do que qualquer outra coisa, o que importa é estar em Cristo (Gl 6:15).
Eu não quero que você saia daqui como Nicodemos entrou naquela casa. Nicodemos saiu diferente. Ele aprendeu sobre a necessidade do novo nascimento. Ele aprendeu sobre coisas que ele não podia alcançar se de Deus não fosse revelado a ele. Você também já sabe estas coisas. Não é o quanto você sabe, nem onde você pratica sua religião, e muito menos as coisas que você faz. O que você precisa é crer e confessar Jesus como seu Senhor e salvador. Eu quero que você creia que Jesus é o seu Senhor e salvador. Eu quero que você confesse Jesus como seu Senhor e salvador. Eu quero que você entregue sua vida ao Senhor, reconheça-o como seu Senhor e Deus, e seja salvo pela graça de Deus. Aqui! Hoje! Agora! Este é o desejo do meu coração para sua vida neste momento.

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