Há cerca de 18 anos resolvi tornar-me membro de uma Igreja Presbiteriana. Muitas foram as razões que levaram um rapaz absolutamente ateu, segundo os teólogos um ateu filosófico, que não apenas não cria na existência de um Deus como, também fazia questão de elencar argumentos racionais na tentativa de demonstrar a inexistência de Deus. Enfim, era um ateu à toa [como eu mesmo preferia denominar]. Não vou entrar em detalhes de conversão, mas depois de muitos e profundos questionamentos senti-me impelido a tomar esta importante decisão.
Dentre as razões para tornar-me membro da Igreja Presbiteriana encontrava-se a alegria e a comunhão entre os membros. Muitas vezes participava de atividades com os membros da Igreja Presbiteriana e ficava observando-os, vendo ali algo que não podia ser encontrado nas outras atividades das quais eu participava. Havia alegria, desejo de ver o outro alegre – ao invés de uma busca desenfreada pelo próprio prazer, como era mais comum ver.
Nas atividades da Igreja também pude observar uma alegria e um prazer em servir ao próximo, não importando quem fosse o próximo, não importando qual fosse aquilo que, na época, eu considerava hierarquia. Todos desejosos de servir. Depois de algum tempo decidi que eu queria ser diferente, não queria ser mais um – queria servir mais, e, mais uma vez, senti-me impelido a uma nova e mais arrojada dedicação de mim mesmo: ia para o seminário, preparar-me para o ministério pastoral.
Também não tenho o desejo de alongar-me nas dificuldades enfrentadas para concluir o curso. Foram 5 anos em São Paulo, de trabalhos, lutas, amizades, alegrias, enfim. Vila Mariana, Liberdade, Morumbi... Quantas bênçãos. Mas mesmo lá o meu coração já conseguia perceber a existência de uma pretensa "casta superior", que um cantor [não o ouço, aliás, sequer sei e ainda é vivo] denominava de "pretensos donos de Jesus". Julgando-se donos de todo o saber julgam-se também no direito de determinar o grau de liberdade que a Igreja deveria ter para servir a Jesus e ao próximo. Acabam engessando a Igreja. Ou, em outras palavras, seqüestram [ou ao menos tentam] a Igreja das mãos do Senhor Jesus, ditando regras novas, mandamentos estranhos, proibições cada vez mais esquisitas e autoritárias, chegando mesmo ao retrocesso de ameaçar de excomunhão quem pense ou sinta diferente – e isto até quando outras denominações que eram rotuladas de retrógradas estão retirando os grilhões humanos [não toques nisto, não faças aquiloutro, como roupas ou futebol, por exemplo].
Se não conseguem seqüestrar o coração da Igreja, pretendem aprisionar suas consciências usando de um poder arbitrário, como se as leis escritas pelos homens, os regulamentos, fossem mais preciosos do que uma consciência tranqüila diante de Deus.
E com o tempo, olhando estas coisas, fui percebendo que aquela Igreja que eu amei nos primeiros dias está desaparecendo em muitos lugares. E está desaparecendo de duas maneiras: desaparecendo a alegria, a comunhão, a vida de piedade cristã e incentivo mútuo e, nas mãos de alguns destes "pretensos donos de Jesus", desaparecendo numericamente porque o rebanho tem sido alimentado não com o frescor e dulçor da palavra, mas com a aridez, com a secura das interpretações humanas – por maiores que sejam reconhecidas como autoridades entre os homens.
O que resta fazer? Dizer não. Fazer todo o esforço possível, tudo o que for preciso, para que esta Igreja alegre, espontânea e dedicada e compromissada com Deus e sua palavra [não com as interpretações dos escribas e fariseus do séc. XXI] não desapareça. Quero-a de volta. E sei que outros também querem. É hora de falar e não calar. Antes que seja muito tarde. A história está repleta de momentos decisivos – e muitas vezes os santos se calaram, e viram a Igreja ser engessada pelo estatismo imperial, pelo escolasticismo estéril, pelo regalismo, pelo cesaropapismo, pelo abandono da vida cristã prática em detrimento de imposições humanas.
O que me consola é a promessa do Senhor de que as portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja do Senhor, e ele a conduzirá em triunfo, de glória em glória – apesar de todos os contratempos, percalços, laços e pedras de tropeço colocadas em seu caminho pelo diabo e seus emissários. Mas o Senhor está com sua Igreja – ainda que ela venha a tropeçar, ele estende a mão e a segura antes que resvalem seus pés. O que acontecerá com os seqüestradores? Ora, o que deve acontecer com todos os criminosos: lançados em prisão, junto com seus emissores.
Devolvam minha Igreja – o resgate já foi pago. Jesus já morreu para libertá-la dos rudimentos do mundo, dos interesses mesquinhos, dos mandamentos meramente horizontais, que tem sua origem no homem, que levam à obediência aos preceitos dos homens, que escravizam homens a homens. Para a liberdade foi que o Senhor nos libertou, e a liberdade que ele dá aos seus faz dos cristãos seres verdadeiramente livres.
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