I Co 10.11-14
11 Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado. 12 Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia. 13 Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar. 14 Portanto, meus amados, fugi da idolatria.
Anteriormente mencionamos que Deus mostrou o seu juízo no passado, sobre o seu povo, e que este juízo se deu por causa de rebelião, de incredulidade e dureza em seus corações. É perfeitamente possível traçar um claro paralelo entre aqueles centenas de milhares que presenciaram as grandes maravilhas do êxodo e pereceram no deserto e as multidões que, incrédulas, continuam buscando sinais, esquecendo-se das claras advertências de Jesus sobre a principal característica de uma geração má e adúltera [Mt 16.4: Uma geração má e adúltera pede um sinal; e nenhum sinal lhe será dado, senão o de Jonas. E, deixando-os, retirou-se]: exatamente os sinais, expulsão de demônios e curas que serão de nenhuma valia no dia do juízo porque feitas de mentes, corações e mãos reprováveis segundo os critérios estabelecidos não por homens, mas pelo próprio Senhor.
Ao olharmos para os israelitas no deserto nos surpreendemos com suas atitudes e desejos: que povo de coração endurecido. Todos foram libertos, protegidos, alimentados, guiados e até mesmo milagrosamente batizados e nem assim aprenderam a louvar ao único Deus, preferiram cair, rapidamente, na mais tola idolatria diante de um bezerro dourado. Seriamos nós diferentes? A resposta é: assim como houve fiéis naqueles dias, hoje também é provável que eles ainda existam. Quase todos festejaram o bezerro de ouro fundido por Arão, ou se envolveram em festas imorais com as canaanitas e suas práticas idólatras...
E Deus, em sua graça, mandou que tudo fosse registrado, certamente sem proveito algum para os revoltosos mortos ou tragados à espada ou engolidos pela terra. Para eles era muito tarde. Tudo foi registrado para nós, para os nossos filhos, para os crentes de hoje e de amanhã [At 2.39: Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor, nosso Deus, chamar].
Eles tiveram a oportunidade de errar e erraram. Tiveram a oportunidade de pecar, cobiçaram e pecaram, e por isso, morreram [Tg 1.15: Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte]. Se este registro foi feito para nossa instrução na luta diária contra o pecado, se necessário até o sangue [Hb 12.4: Ora, na vossa luta contra o pecado, ainda não tendes resistido até ao sangue], que diretrizes nós podemos aprender desta porção da Palavra de Deus?
A primeira diretriz é que NÃO DEVEMOS DEIXAR O NOSSO CORAÇÃO SER TOMADO DE SOBERBA PELO ESTADO EM QUE NOS ENCONTRARMOS.
Um mestre, percebendo que tinha um discípulo com forte tendência à soberba, chamou-o ao pé de uma grande escadaria e disse-lhe para subir um degrau e pular. Ele o fez rapidamente. Pediu-lhe para subir um segundo, um terceiro, e vários... E o discípulo sempre cumpria a tarefa com relativa facilidade. Até que alcançou um número de degraus que o levava a alguns metros do solo, e ficou receoso, negando-se a pular, recebendo, então, a lição pretendida pelo mestre: quanto mais degraus subimos, maior é o risco de dano numa eventual queda. Não é nada improvável que os coríntios olhassem para os hebreus com um certo desprezo, julgando-os atrasados por não terem a filosofia grega, e ao mesmo tempo duros de coração e de entendimento porque, apesar de todos os livramentos que receberam ainda eram capazes de se manterem incrédulos e reticentes a uma confiança plena na ação divina. Consideravam-se avançados filosoficamente e mais bem aventurados espiritualmente [Jo 20.29: Disse-lhe Jesus: Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não viram e creram].
Eram cristãos, alcançaram as promessas [Mt 13.17: Pois em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes e não viram; e ouvir o que ouvis e não ouviram] e foram enriquecidos em Cristo Jesus, não lhes faltava nenhum dom, mas incorreram em vários erros e mais uma vez Paulo lhes mostra o principal aspecto de suas falhas. A soberba, que os dividia, que os enfraquecia. Se estavam de pé - e creio que Paulo fez uma leve ironia por causa de seu estado de rebeldia e pecados continuados - deveriam se lembrar que é o Senhor quem levanta e quem abate [Sl 75.7: Deus é o juiz; a um abate, a outro exalta].
Não podiam se esquecer do ensino geral das Escrituras - não há homem que não peque, não há ninguém que seja sem pecado [Ec 7.20: Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e que não peque], e a vigilância por parte do cristão é absolutamente necessária, na verdade, é fundamental. Se o cristão que está vivendo santamente deve ter cuidado com a soberba, muito mais o deveriam ter os coríntios com seus muitos problemas.
Guardemos, pois, esta primeira orientação de Paulo: nada temos que nos permita confiar a ponto de deixarmos o coração ser tomado de soberba e achar que não podemos ser abalados. Se estás bem, cuida-te, mais ainda.
A segunda diretriz é que TODOS ESTAMOS, IGUALMENTE, SUJEITOS ÀS TENTAÇÕES E PROVAÇÕES.
Uma diferença fundamental entre tentação e provação é que a primeira vem ao encontro do que queremos e gostamos, são atrativas, nós temos “pontos de contato” e nos sentimos motivados a ceder aos seus encantos, e a segunda é dolorida e angustiante, vem de encontro às nossas vontades, tiram nosso conforto, buscam enfraquecer nossa fé e destruir toda a estrutura emocional e espiritual que tenhamos.
Entretanto, Paulo faz uma ressalva importante: mesmo com a ação de satanás e do mundo, toda tentação atinge o homem naquilo que ele anseia, vê, deseja. Toda tentação é primordialmente humana, é fruto dos anseios de corações enganosos e corruptos. Apenas um homem foi tentado e não cedeu às tentações [Hb 4.15: Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado]. Apenas uma vez ele se colocou deliberadamente em condições de se deixar tentar, mas até nisto havia um propósito do Espírito a se cumprir [Mt 4.1: A seguir, foi Jesus levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo].
Quanto a nós, por causa das nossas fraquezas, a orientação bíblica é que não permitamos, deliberadamente, sermos alvo das tentações, dando ocasião à carne [Gl 5.13: Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor]. Esta orientação é útil para o aluno que deve estudar durante o ano para não se sentir tentado a colar no fim por medo de reprovação; é útil para o empresário que deve ser bom administrador para não se sentir tentado a sonegar para fechar o balanço financeiro no final do ano; é útil para o alcoólatra para não passar perto de lugares onde tenha acesso a bebida; é útil para o fumante e as oportunidades de ceder ao vício; é útil para os namorados que devem evitar lugares sombrosos e solidão para não despertarem o amor e seus anseios antes do tempo; é útil para cada um de nós, em todas as áreas da vida. Em cada uma delas há uma tentação, em cada uma delas há uma oportunidade de cometer uma transgressão - mas em cada uma delas há, também, uma oportunidade de sujeitar-se à vontade de Deus e receber poder para resistir ao diabo [Tg 4.7: Sujeitai-vos, portanto, a Deus; mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós], que anda como leão furioso procurando algum incauto para devorar [I Pe 5.8: Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar].
Em cada tentação há uma oportunidade de mostrar que amamos mais a Deus que ao mundo [I Jo 2.15: Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele].
Toda tentação nasce no coração do homem, e é em seu coração que cumpre vencê-la [Mt 15.19: Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias]. Guarda, pois, o teu coração e vence a tentação com uma vida de sujeição e comunhão com Deus e sua palavra, único antídoto para as armadilhas do destruidor [Os 4.6: O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento. Porque tu, sacerdote, rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos].
A terceira diretriz é que NUNCA SEREMOS DEIXADOS SEM O AMPARO DO NOSSO SENHOR.
Mesmo que, eventualmente, a sensação seja de abandono, Deus nunca deixa de cuidar dos seus, nunca os deixa entregues às suas próprias fraquezas, porque forças em nós mesmos não há nenhuma [Jo 15.5: Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer]. Ele é absolutamente fiel, e fez uma promessa que não nos deixaria sozinhos em tempo ou situação alguma [Mt 28.20: ...ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século]. Isto tem duas implicações para nossa vida: 1. Deus pode nos ajudar a resistir, está sempre ao nosso lado e 2. Nada que façamos está oculto aos olhos de Deus.
Mas aqui Paulo destaca uma maravilhosa doutrina das Escrituras: a providência soberana de Deus. Nossa fé tem que ser provada para que frutifique. Temos que passar pelos vales, e, eventualmente, até pelo sombrio vale da morte, mas Deus só nos permitirá que desçamos a tal vale se estivermos prontos para atravessá-lo. Deus é um pai amoroso e sábio, seu amor o leva a capacitar-nos para as lides da vida, sua sabedoria leva-o a dar-nos oportunidades para exercitamos os dons que ele dá aos seus.
Como um mestre sábio cada adversidade chega na medida da capacitação que ele nos dá. Nosso problema é que muitas vezes não queremos resistir até o fim, como alguns irmãos do passado fizeram, e que nos legaram um rico tesouro de testemunhos fiéis como Estêvão e o próprio Paulo. Mesmo nesta fraqueza, mesmo quando não estamos dispostos a resistir, ainda temos uma porta aberta pelo Senhor: a fuga do ambiente tentador, como ilustram perfeitamente as dispares historias de dois homens de Deus do passado: José e Davi. O primeiro foi tentado e preferiu fugir, sendo envergonhado, preferindo perder a liberdade mas sendo ousado para não ceder à libertinagem, aos oferecimentos pecaminosos da esposa de Potifar. O segundo estava onde não deveria estar, pois era rei e era o tempo de os reis saírem à guerra, deu vazão aos seus anseios [e não lhe faltavam mulheres], resultando em diversas tragédias, com ao menos duas mortes e muita mágoa entre os seus filhos.
Portanto, nas tentações lembre-se: ela tem o exato tamanho da sua fé no salvador Jesus Cristo e no todo-poderoso Deus. Você não é tentado com nada sobre-humano, você não é provado em nada que Deus saiba que você seja incapaz de resistir. E, faltando disposição, ainda resta-lhe uma opção. Se não consegues resistir ao diabo [Tg 4.7: Sujeitai-vos, portanto, a Deus; mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós] fuja dele.
Com estas diretrizes em mente: 1. Cuidado para não cair; 2. Atenção e vigilância nas tentações e 3. Amparo para resistir e caminho de fuga se necessário, perguntamos: como viver essa nossa luta diária e constante, quando somos continuamente assediados pelo pecado [Hb 12:1-2: Portanto, também nós, visto que temos a rodear-nos tão grande nuvem de testemunhas, desembaraçando-nos de todo peso e do pecado que tenazmente nos assedia, corramos, com perseverança, a carreira que nos está proposta, olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus]?
Tratando do problema dos coríntios o apóstolo oferece uma resposta local: eles estavam se envolvendo com a idolatria nos tribunais, nos banquetes, na vida social e nos mercados. Este era o seu problema, e de tal forma isto estava enraizado em sua mente e cultura que transpuseram isto para dentro da Igreja, tornando-se fãs, isto é, tomando por ídolos a Paulo, a Pedro, a Apolo... Faziam do próprio Cristo um ídolo.
O princípio paulino é: se a idolatria contaminou sua mente e coração, fuja dela ou ela vai controlar cada aspecto da vida de vocês. Muitos se deixam dominar por Mammon outros por Baco, outros ainda por Afrodite. Dinheiro bebida, sexualidade, fama, poder, tudo isto é inebriante e expressa os anseios do coração. A busca por satisfazê-los a qualquer custo dá origem às mais diversas estratégias pecaminosas. Um coração tomado pelo pecado [Mt 15.19: Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias] vai dar origem a todo tipo de obras da carne [Gl 5.19: Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam], resultando em esfriamento da fé, afastamento da comunhão e consequente apostasia.
Mas não há motivos para desespero por parte dos verdadeiros crentes no Senhor Jesus Cristo: ainda que a força do pecado e da tentação seja muito grande e aparentemente invencível, o cristão ainda pode correr e se abrigar à sombra da cruz de Cristo, clamando a ajuda daquele que venceu a morte por seus eleitos [Rm 7.25: Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado] e nos faz mais que vencedores em todas estas coisas [Rm 8.37: Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou] pois nos dá a sua vida [II Co 4.10 ...levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo].
Tanto os coríntios quanto nós temos uma dura batalha pela frente: vencer o pecado que nos assedia. Por nossas forças é impossível, por isso precisamos confiar em Jesus Cristo, total e incondicionalmente em sua obra e sabedoria, deixando-o conduzir-nos a Deus.