quinta-feira, 23 de julho de 2009

JOÃO CALVINO: 500 ANOS DE CALVINISMO E QUANTOS DE CALVINOLATRIA?

Calvino%20pregando_JPG10 de julho de 1509. Em Noyon [Picardia], norte da França, nasce uma criança de frágil compleição que recebe o nome de João Calvino. Seu pai era tabelião e secretário do bispo local. Aos 12 anos recebe um “benefício eclesiástico” que lhe servirá de bolsa de estudos. Aos 14 ingressa na Universidade de Paris, onde estuda humanidades e teologia. Em seguida dirige-se para Órleans e Bourges onde estuda direito entre os anos de 1528-1533.  Em 1532 publicou um comentário sobre a obra “De Clementia”, escrito pelo filósofo Sêneca ao imperador Nero. Por esta época toma conhecimento da reforma Luterana, converte-se [ele próprio nada fala sobre isso] faz um discurso em Paris que é considerado herético e foge para Angôulême e em seguida escreve seu primeiro livro religioso, Psychopannychia, sobre a imortalidade da alma [publicada somente em 1542]. É o início da sua jornada como um dos principais líderes do movimento reformador, ao lado de Martinho Lutero, Guilherme Farel, Theodoro de Beza, Filipe Melanchton, Ulrico Zuínglio e outros.
Em 1536 publica a primeira edição das Institutas, em Basiléia. Depois, dirigindo-se para Estrasburgo, por causa de escaramuças entre protestantes e católicos, desvia-se para Genebra, onde pretendia passar apenas uma noite. Informado da presença de Calvino, Guilherme Farel vai até ele e o insta a ficar na cidade que havia abraçado a fé reformada há muito pouco tempo. Em 1538 é forçado a abandonar Genebra, fixando residência entre os refugiados franceses em Estrasburgo. Casa-se com Idalette de Bure, escreve o comentário da Carta aos Romanos. Retorna para Genebra, escreve as ordenanças eclesiásticas. Toma parte no julgamento do médico Miguel Serveto, condenado à fogueira por heresia anti-trinitária. À partir de 1555 passa a ter o pleno apoio dos magistrados Genebrinos, torna-se cidadão genebrino em 1559, ano em que inaugura sua academia e publica. a última edição das Institutas. Morre a 27 de maio de 1564, aos 55 anos de idade, sendo sucedido por Teodoro Beza. Informações como estas e muitas outras podem ser conseguidas facilmente em qualquer biblioteca e em buscas on-line. Deixo-vos este trabalho após esta breve pesquisa histórica.
Nestes dias completou-se 500 anos do nascimento do reformador francês. São inúmeros os artigos, livros, panfletos, documentários e festividades mencionando o que Calvino fez, faria e até sugerir o que ele deveria ter ou não feito. Atribui-se a Calvino muito do que ele não fez, há os que pretendem esconder ou justificar erros que porventura tenha cometido. Cometeu-os? A menos que ele não fosse humano, sim. Mas os interessados na história de Calvino podem fazer uma pesquisa na internet que encontrarão farto material. Poderia fazê-lo? Sim, poderia. Talvez em outra oportunidade.
Antes, uma palavra de alerta àqueles que me conhecem, que me acompanham, aos que não me conhecem e até mesmo àqueles que pensam me conhecer, gostando ou não do que penso, escrevo e faço: sou presbiteriano, reformado, gosto da teologia sistematizada por João Calvino. Ninguém que me conheça pode dizer que sou anti-calvinista. Quem não me conhece ou pensa que me conhece talvez venha a afirmar algo assim. Todas as igrejas onde tive o privilégio de servir ao Senhor ensinando a Palavra de Deus, desde a minha conversão e chamado para o ministério, conheceram meu apego à boa teologia. Santa Maria da Vitória e Côcos [Bahia], Vila Mariana e Morumbi [São Paulo], Pitanga, Guarapuava e Dois Vizinhos [Paraná], Santana do Araguaia, Pacajá e Jacundá [Pará] podem testemunhar que sempre busquei ensinar e falar tão somente o que pudesse provar pelas Escrituras, tendo como lema as palavras do profeta Micaías: “Tão certo como vive o SENHOR, o que o SENHOR me disser, isso falarei”.
E tem sido assim: minha voz proclama a voz de Deus nas Escrituras. Não pretendo que gostem de mim – pretendo que ouçam o que Deus diz através de sua Palavra, as Escrituras Sagradas. Elas falam – como intérprete, explico-a. Instituições onde tive o privilégio de conviver como aluno e professor também podem testemunhar meu pensamento através de aulas e escritos [Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição, Centro de Pós-Graduação Andrew Jumper, Faculdade Teológica Reformada de Guarapuava e Centro de Preparação de Obreiros de Tucuruí]. Por quê menciono tudo isto? Simples – logo aparecerá quem, gratuitamente, diga que sou anti-calvinista. Não o sou. Mas mantenho o senso crítico, não abro mão disso em troca de um afago de hipercalvinistas ou calvinólatras. Não me importo com o julgamento de quem não tem o direito de fazê-lo. Algumas vezes, julgado conservador [sim, sou, já que entendo que o que é bom para o reino deve ser, não apenas conservado, mas também, difundido]. Em outras, modernista [e não creio que haja erro algum em usar o que a inteligência humana tem produzido para tornar o evangelho do reino mais conhecido, ou então ainda deveríamos usar pergaminhos, velas de sebo e coisas que tais], ou liberal [nunca na teologia, mas acusado de sê-lo na prática, especialmente litúrgica] presbiteriano demais ou de menos, e às vezes nem presbiteriano segundo tais indignos juízes – tanto faz o resultado do julgamento: Deus é meu juiz. Aos demais, considero tolos e usurpadores pois tem a absurda pretensão de julgar o servo alheio: sirvo a Deus – ele é meu SENHOR!
Mas preocupa-me o tom laudatório que se levanta, o quase endeusamento atribuído à pessoa de João Calvino, um “inerrantismo” que não é nem justo, nem verdadeiro, nem faz jus à pessoa e obra do reformador. Sei que Calvino não foi original [seu pensamento reflete forte influência dos escritos agostinianos]. Sei que Calvino não foi completo [negou-se a escrever e pregar a respeito de determinados textos que afirmava não conseguir compreender – e isto é mais prova de humildade do que de ignorância, exemplar para muitos dos seus presunçosos pseudo-seguidores, que certamente envergonhariam aquele a quem atribuem o caráter paterno-teológico]. Sistematizador de uma faceta do pensamento dos reformadores do séc. XVI, Calvino não foi unânime em seu tempo, e tanto discordou quanto gozou da discordância de outros importantes reformadores como Lutero e Zuínglio. Certamente Calvino não aceitaria tal endeusamento.
Ele, que tanto combateu o papismo, a idolatria e a egolatria, dificilmente aceitaria ser colocado em um trono e considerado senhor do pensamento da Igreja. Para Calvino uma só mente deve ditar o que a igreja faz e pensa: a mente de Cristo. Acompanhei muito do que se disse a respeito do reformador genebrino nestes dias. Li artigos, jornais, revistas, boletins – textos escritos por calvinistas, pretensos calvinistas, arminianos, tomistas romanos [também eles], incrédulos, presbiterianos reformados e outros nem tanto, jornais e revistas, seculares ou evangélicas, e até mesmo documentos de seitas heréticas, e no fim, uma constatação: raros conseguiram manter o equilíbrio entre o que Calvino realmente foi e o que pretendem que ele seja cinco séculos depois. Não encontrei o Calvino histórico em muitos dos textos lidos. A calvinolatria erigiu um mito. O anti-calvinismo elegeu-o demônio. O verdadeiro pensamento reformado vê em Calvino simplesmente um homem e uma ambiguidade: muito à frente do seu tempo no pensar, fruto do seu tempo no agir. Inteligente como poucos, humano, como todos. Nem mito, nem demônio. Um homem , usado por Deus para sistematizar e formatar o pensamento da nascente igreja reformada [mas não o único pensamento protestante de seu tempo, pois o movimento que ficou conhecido como reformado vicejou ao lado de outras igrejas protestantes]. A força do seu pensamento está justamente nisto: é humano, como todo o pensamento teológico anterior e posterior, ainda que ele tenha alcançado uma profundidade notável. Escolher o mito é seguir uma miragem. Considerá-lo demônio é uma injustiça. Honrar o homem é glorificar aquele que o usou. Soli Deo gloria.

Um comentário:

Melos disse...

Gosto de ler e leio tudo que posso e pareça interessante, li tb vários textos sobre Calvino 500 anos. Assim como Simonton, ocupou com honra seu lugar de dedicado e consagrado servo de Deus. Precisamos sim, imitá-lo sem endeusá-lo, e servir prontamente e sinceramente a quem ele serviu de todo o coração por toda a sua vida após sua conversão. O mais é balela de quem tem mais metas do que afetos. Continue a usar sua "pena" em prol de Cristo, seu evangelho e reino. Soli Deo Gloria.

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