At 10.1-33
Pouco
antes de subir para os céus, à vista dos seus discípulos, o Senhor Jesus
deu-lhes uma importante ordem: serem suas testemunhas em todos os lugares,
tanto onde antes ele lhes havia dito para que não se ausentassem (At 1:4) como em todas as demais regiões
da terra, sem deixar nenhuma delas sem ouvir a mensagem (At 1:8).
Jesus
fez esta determinação em forma de progressão geográfica porque sabia da
propensão dos judeus para evitarem os samaritanos e sua dificuldade em anunciar
aos não judeus, apesar das profecias de que gente de todos os povos adorariam
ao Senhor (Is 56:7) e o próprio
Senhor Jesus ter dado o exemplo lidando tanto com gentios (Mc 7.26-29) quanto com samaritanos (Jo 4:39).
Nós
temos uma certeza: nosso Deus não muda. Seu propósito é o mesmo: que, na sua
casa, homens e mulheres de todas as nações se apresentem para cultuá-lo em espirito
e em verdade. O mesmo Deus que escolheu Israel no passado, o fez para que eles
fossem uma nação de testemunhas mostrando o seu poder em libertá-los da
escravidão no Egito e mantê-los no deserto, apesar dos exércitos de faraó e da
falta de água e alimento (Is 43:12)
também escolheu o novo Israel, a Igreja, com este mesmo propósito – para que
proclamem as virtudes daqueles que os libertou das trevas para a sua
maravilhosa luz (I Pe 2:9).
A
mesma responsabilidade que estava sobre Israel encontra-se nos ombros dos
cristãos – testemunharem as grandezas de Deus, anunciarem os seus poderosos
feitos, renderem-lhe graças e louvor pelo que ele é, fez e anunciou que, no
momento que ele mesmo determinou, ainda fará. É nesta perspectiva, de
cumprimento de um mandato, que analisaremos At 10 em três mensagens, sendo que
a primeira estabelece princípios para os discípulos que desejam ser obedientes
e cumprirem a grande comissão.
1 Morava em Cesaréia um homem
de nome Cornélio, centurião da coorte chamada Italiana, 2 piedoso e temente a Deus com toda a sua casa e que
fazia muitas esmolas ao povo e, de contínuo, orava a Deus. 3 Esse homem observou claramente durante uma visão,
cerca da hora nona do dia, um anjo de Deus que se aproximou dele e lhe disse: 4 Cornélio! Este, fixando
nele os olhos e possuído de temor, perguntou: Que é, Senhor? E o anjo lhe
disse: As tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória diante de Deus. 5 Agora, envia mensageiros a
Jope e manda chamar Simão, que tem por sobrenome Pedro. 6 Ele está hospedado com Simão, curtidor, cuja
residência está situada à beira-mar.
Embora
Deus tenha escolhido, na antiguidade, uma nação para lhe ser povo particular, ele
já demonstrava que se importava com o destino das outras nações e Jesus retira
do Antigo Testamento dois momentos do ministério de Elias para demonstrar que
Deus não restringia seu cuidado a Israel: a cura de Naamã, o leproso comandante
d o exército sírio e o sustento da viúva em Sarepta de Sidom (Lc 4.25-27).
Jesus
deu, mais de uma vez, o exemplo do cuidado e especial interesse de Deus sobre
os não judeus: curou um servo de um centurião, a filha de uma cananéia, o
coração de uma samaritana, a lepra de um samaritano, a alma de um gadareno. E
ele também deu, mais de uma vez, ordem aos seus discípulos para que alcançassem
os perdidos de outros apriscos (Jo 10:16).
Na cidade dedicada a César havia um chefe de uma guarnição romana chamado
Cornélio. Cesaréia, centro comercial e militar gentílico, com muitos templos e
banhos, não era um ambiente especialmente atrativo para judeus ou para a
religião judaica. Mas é no lodaçal da Cesaréia que encontra-se Cornélio,
qualificado como piedoso, isto é, um dedicado seguidor dos preceitos mosaicos,
e também temente a Deus, alguém que, embora muito próximo do judaísmo, adepto
da prática de orações, esmolas e contribuições para o templo, por uma razão (no
caso, era oficial romano, não podia deixar de participar de cerimônias
cívico-religiosas romanas) não havia se tornado um prosélito, um gentio que se
deixava circuncidar e se tornava judeu.
Cornélio
e sua casa (família e agregados) eram pessoas piedosas ou ao menos ensinadas
nas práticas piedosas. Em uma de suas orações (exatamente à mesma hora em que
Jesus havia entregue o seu espírito, hora nona, isto é, três horas da tarde - Mt 27:46) teve a visão de um anjo de
Deus que lhe comunicou que suas orações tinham sido ouvidas, que a sua vida e
testemunho eram agradáveis aos olhos do Senhor mas que ainda lhe faltava algo
que precisava ser suprido: ele precisava conhecer o evangelho do salvador –
suas orações, apesar de serem agradáveis aos olhos do Senhor, não eram
suficientes, como nenhuma obra é suficiente (Ef 2:8): ele precisava conhecer a Cristo, o Senhor e salvador. A
barreira da nacionalidade não impediu Deus de atentar para Cornélio, e não
impediria sua salvação.
7 Logo que se retirou o anjo
que lhe falava, chamou dois dos seus domésticos e um soldado piedoso dos que
estavam a seu serviço 8
e, havendo-lhes contado tudo, enviou-os a Jope.
Depois
de entendermos que o Senhor não estava interessado somente em judeus, assim
como seu cuidado e seu amor salvador (Jo
3:16) não é exclusivo apenas para os que já estão na Igreja (Lc 19:10) devemos nos perguntar: e
então? E daí que sabemos que Jesus veio para buscar e salvar o perdido?
Antes
de tratar do papel dos discípulos, quero que lancemos um olhar para os
perdidos. Cornélio é um exemplo de alguém que, embora com algum tipo de temor e
conhecimento, ainda estava alheio à nova aliança com Deus (Ef 4:18) porque esta só poderia ser concretizada à partir do
momento que ele conhecesse Cristo, o salvador (Jo 17:3).
As
Escrituras dizem que nem mesmo o coração de um descrente é capaz de opor-se à
vontade de Deus (Pv 21:1). Como
alguém temente a Deus, Cornélio não tinha sequer interesse em opor-se à vontade
de Deus. Nenhuma notícia lhe seria tão agradável quanto a que o anjo lhe deu:
ele receberia o favor do Senhor. Como você reagiria à notícia de que ganhou uma
casa (de verdade, não estas mensagens via celular que enchem a nossa caixa
postal)? Como reagiria à notícia de que vai poder entrar naquela sonhada faculdade
e ainda com bolsa integral? Ou que recebeu uma promoção tão almejada? O que
você faria se a única exigência fosse ir até o doador, ou à faculdade ou ao RH
da empresa em que trabalha para saber como receber esta bênção?
A
maioria é absolutamente ágil quando se trata de receber este tipo de bênção,
mas como você reage quando ouve falar que seu destino, sem Deus, é o inferno
por ser filho da ira, morto em seus próprios delitos e pecados, condenado por
sua própria culpa (Ef 2:1-3) mas
que, mesmo merecendo esta dura condenação ele lhe deu vida, sem que você
merecesse, mas somente por causa do seu grande amor e para mostrar a sua muita
misericórdia (Ef 2.4-6)? A maioria
simplesmente não reage, permanece estática, como mortos, e, de fato, mortos
espiritualmente, que não vão a Cristo para serem vivificados (I Co 15:22). Mas não foi assim com
Cornélio. Ele não pensou duas vezes, não titubeou. Se tinha que chamar Pedro,
então ele chamaria Pedro imediatamente.
Já
olhamos para Cornélio, o homem a quem Deus determinou abençoar. Gentio, piedoso
e temente a Deus. Agora, devemos mudar o nosso olhar para Pedro, que, de certa
maneira, representa os crentes, assim como Cornélio representa os eleitos que ainda não tiveram a oportunidade de
ouvir o evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo. Pedro é, de certa maneira,
você. O que você é e de que maneira você se encaixa nas características que
passo a mencionar?
9 No dia seguinte, indo eles
de caminho e estando já perto da cidade, subiu Pedro ao eirado, por volta da
hora sexta, a fim de orar.
A
primeira característica que logo percebemos é que Deus faz uso de homens que
ele mesmo escolheu (Lc 6:13) e
designou para que dessem frutos permanentes (Jo 15:16).
Jesus
foi absolutamente enfático com seus discípulos – eles foram designados para
frutificarem, para trabalharem na obra do Senhor sabendo que seu trabalho não
seria nem vão (I Co 15:58) nem
solitário (Mt 28:20).
É
tolice afirmar que o anúncio evangélico é um privilégio concedido aos homens
que os anjos desejariam executar – é, na verdade, uma tarefa confiada aos
servos cuja consecução lhes será cobrada e que anjos não conseguem, em sua
existência, experimentar e compreender, pois aos preservados não haverá queda e
aos caídos não haverá redenção (Jd 1:6).
Para
pregar para Cornélio Deus designou Pedro. E você, será o Pedro na vida de quem?
Quem será que está pronto para ouvir a mensagem e seus lábios estão cerrados?
Será que vai ser preciso que alguém bata no seu portão lhe exigindo que saia do
seu comodismo silencioso, desobediente e preguiçoso? Se uma missão foi dada, e
não é executada, então, só resta ter que ouvir as palavras do Senhor Jesus
chamando de servo mau e negligente (Mt
25.26-30). É isso o que deseja ouvir do Senhor?
10 Estando com fome, quis
comer; mas, enquanto lhe preparavam a comida, sobreveio-lhe um êxtase; 11 então, viu o céu aberto e
descendo um objeto como se fosse um grande lençol, o qual era baixado à terra
pelas quatro pontas, 12
contendo toda sorte de quadrúpedes, répteis da terra e aves do céu. 13 E ouviu-se uma voz que se
dirigia a ele: Levanta-te, Pedro! Mata e come. 14 Mas Pedro replicou: De modo nenhum, Senhor! Porque
jamais comi coisa alguma comum e imunda. 15
Segunda vez, a voz lhe falou: Ao que Deus purificou não consideres comum. 16 Sucedeu isto por três
vezes, e, logo, aquele objeto foi recolhido ao céu.
Quando
enviou o anjo para falar com Cornélio Deus não precisou procurar na agenda
alguém disponível – o escolhido já havia sido comissionado. A missão dada a
Pedro (e aos demais discípulos bem como aos discípulos dos discípulos, e assim
sucessivamente, todos discípulos do Senhor - I Co 11:1): eles deveriam anunciar o evangelho a todo o mundo – e
isto incluía, por mais óbvio que isso pareça para nós, os desprezados
samaritanos e os odiados gentios.
Pedro
estava em seu momento devocional, era meio dia, ao invés de ficar beliscando na
cozinha procurou um lugar onde pudesse ficar a sós com Deus. Isso é bom, muito
bom. Mas se você acha que ter um momento de devoção com Deus é suficientemente
bom e a isso se resume a sua espiritualidade, algo de muito errado está
acontecendo com você. Provavelmente você ainda não entendeu o que significa ser
discípulo de Cristo. Cristo é aquele que desceu de sua glória para resgatar
indignos pecadores – é aquele que subiu à cruz para ocupar o lugar de injustos
pecadores (I Pe 3:18).
Se
sua devoção não conduz você a conhecer mais a Deus, e se este conhecimento de
Deus não leva você a uma mudança em suas atitudes, de uma atitude de
autossuficiência para a de obediência, então, mesmo que você esteja sozinho em
algum canto com alguma prática religiosa isto pode ser chamado de qualquer
coisa, menos de devoção a Deus. Se sua devoção a Deus não muda sua visão de
mundo e tira você da letargia, então, ainda está faltando um encontro
transformador com o Senhor.
Pedro
estava disponível – precisava ser instruído sobre o que precisava fazer. Antes
que ele considerasse os gentios de serem chamados à nova aliança com o Senhor
Jesus, ele precisava ser ensinado, e de lei em punho, por três vezes nega-se a
entender que o evangelho é o cumprimento da lei e é ir além da lei – é
transformar a intransigência em misericórdia, é vencer as barreiras e os
preconceitos. Mas ele logo entenderia – quem falava com ele era o seu Senhor –
não foi um êxtase induzido, foi um chamado do Senhor para que ele compreendesse
ainda melhor o plano de Deus, do qual ele era um instrumento e, agora, estava
inteiramente disponível. O que era cerimonialmente impuro (gentios e
samaritanos) havia sido purificado por Deus.
17 Enquanto Pedro estava
perplexo sobre qual seria o significado da visão, eis que os homens enviados da
parte de Cornélio, tendo perguntado pela casa de Simão, pararam junto à porta; 18 e, chamando, indagavam se
estava ali hospedado Simão, por sobrenome Pedro. 19 Enquanto meditava Pedro acerca da visão, disse-lhe o
Espírito: Estão aí dois homens que te procuram; 20 levanta-te, pois, desce e vai com eles, nada
duvidando; porque eu os enviei.
Enquanto
meditava sobre o que tinha acabado de lhe acontecer, de que maneira isto iria
influenciar sua vida e sua maneira de servir ao Senhor, os enviados de Cornélio
batem à porta de Simão. Era a hora de colocar em prática o que tinha acabado de
aprender. E eis aqui outro grande paralelo entre Pedro, o crente, e nós, os
crentes. Pedro estava aprendendo e o Senhor exigia que seu aprendizado fosse
colocado em prática. Havia um bem a ser feito, e seria pecado não fazê-lo (Tg 4:17).
Algum
tempo antes o Senhor Jesus havia dito que eles seriam guiados pelo consolador –
e que ele os faria lembrar de tudo quanto lhes havia sido ensinado (Jo 14:26). Sem dúvida que evangelizar
os gentios estava entre as coisas que Jesus havia feito – e discípulos são
aqueles que imitam o seu discipulador.
É
sob a direção do Espírito que Pedro recebe a explicação de sua visão: os homens
que bateram à porta de Simão eram, antes de mais nada, enviados pelo próprio
Senhor – e Pedro deveria ir com eles. É provável que Cornélio, sabendo dos
escrúpulos dos judeus, tenha enviado servos ou associados judeus para
procurarem Pedro. Isso já evitava, de pronto, a primeira barreira. Mas o mesmo
Espírito lhe diz para ir com os estranhos, sem medo, pois ninguém sai com
estranhos assim, especialmente sabendo que havia forte oposição à mensagem que
ele pregava. Pedro já havia estado preso (At
4.1-3) e também chicoteado sendo exortado a calar-se a respeito de Jesus (At 5:40), o que se negaram a atender (At 4:19).
Mas
o argumento determinante para que Pedro obedeça vá com eles é o Espírito Santo
dizer: eu os enviei. Você se negaria a ir pregar o evangelho desta maneira?
Você se recusaria a ir até a casa de Cornélio se o Senhor lhe dissesse para ir?
Pois é, ele já disse – já disse para você ir. Já deu até o endereço. Onde?
Simplesmente entre Jerusalém e os confins da terra – e, geograficamente, nossa
terra é o que o Senhor Jesus queria dizer com “confins da terra” àqueles
judeus. Vai obedecer ou não (I Sm 15:23)?
21 E, descendo Pedro para
junto dos homens, disse: Aqui me tendes; sou eu a quem buscais? A que viestes? 22 Então, disseram: O
centurião Cornélio, homem reto e temente a Deus e tendo bom testemunho de toda
a nação judaica, foi instruído por um santo anjo para chamar-te a sua casa e
ouvir as tuas palavras. 23
Pedro, pois, convidando-os a entrar,
hospedou-os. No dia seguinte, levantou-se e partiu com eles; também alguns
irmãos dos que habitavam em Jope foram em sua companhia.
Porque
não temos tanta disposição para a evangelização? Se você acha bom que a Igreja
faça conferências de evangelização, congressos para despertamento para
evangelização e coisas semelhantes, acredito que isto é simplesmente uma
resposta a um terrível sintoma que podemos encontrar – a apatia, a falta de
vontade, a indisposição, em suma, a desobediência por parte dos crentes. Não é
preciso uma visão para saber que há uma tarefa a ser desempenhada pela Igreja.
Jesus já a deu. Fazer uma conferência sobre missões é admitir o fracasso da
Igreja, porque a Igreja, em sua essência, deveria ser uma missão permanente.
E o
evangelismo não é a missão permanente da Igreja não por falta de oportunidade
ou recursos – aliás, recursos e oportunidades são mais do que abundantes. A
causa é simplesmente a trágica inclinação para a rebeldia, para a
desobediência. Todavia, não foi o caso de Pedro. O Senhor lhe disse: levanta. E
ele se levantou. Disse-lhe desce. E ele desceu. O Senhor lhe disse para ir com
eles, e ele, após tê-los hospedado (o que é uma indicação, porém, não
determinante, de que eles eram judeus
associados, de alguma forma, a Cornélio), foi com eles no dia seguinte porque
viajar a noite não era seguro.
Aqueles
homens fazem questão de destacar três características de Cornélio que só
interessavam aos judeus: piedoso (aqui chamado de reto), temente a Deus (uma
classificação para os simpatizantes do judaísmo mas que não se tornaram judeus)
e que tinha bom testemunho de toda a nação judaica, o que significava, no mínimo,
que não era dado a perseguir os judeus, o que já era grande coisa. Mas ele ia
mais além – era homem de oração e de coração bondoso, que contribuía para o bem
de outros através de esmolas.
Mas
nossos olhos, neste momento, estão voltados para Pedro, o crente. Pedro, o apóstolo.
Pedro, o enviado. Pedro, o disposto a obedecer à ordem de ir além da sua zona
de conforto para anunciar o evangelho a todos os que tinham interesse – e se
havia algo que Cornélio tinha era interesse no evangelho. Voltemos nossos olhos
para os crentes – há muitos que receberão prazerosamente o evangelho, mas, onde
estão os pregadores (Rm 10:14). Só não
podemos continuar com a pergunta de Paulo porque sabemos que fomos enviados (Rm 10:15).
24 No dia imediato, entrou em
Cesaréia. Cornélio estava esperando por eles, tendo reunido seus parentes e
amigos íntimos.
No mesmo
dia eles chegam a Cesaréia e vão imediatamente à casa de Cornélio. Tudo estava
pronto. A casa de Cornélio estava preparada para receber a mensagem que o
Senhor lhe falaria através de Pedro. Deixe-me relembrar: a piedade de Cornélio
era conhecida por todos os convidados – eram seus parentes, seus amigos
íntimos. Alguém pode ser conhecido socialmente como piedoso mas não ser
reconhecido assim por seus parentes e amigos íntimos.
Cornélio
poderia ter ido até Pedro – ou chamado à sede da guarda para conversarem. Mas
Cornélio vivia sua piedade diante de todos, havia entendido que a mesma
mensagem que servira para que ele se tornasse o que havia se tornado perante
todos os seus familiares, perante seus amigos íntimos, perante a guarda também
serviria para mudar sua vida, consciente do interesse de Deus por sua vida, e
ele queira compartilhar com todos os seus aquela novidade. Eles já sabiam de
sua piedade. Já sabiam que ele tinha tido uma visão – talvez alguns duvidassem
mesmo da existência deste tal de Simão hospedado na casa de Simão. E muitos
certamente duvidavam que um judeu religioso entrasse na casa de um soldado
romano. Talvez muitos esperassem pela volta dos emissários apenas para
confirmar suas desconfianças.
Cornélio
não se importava com isso – mesmo sem saber se Pedro viria, reuniu sua família.
Reuniu seus amigos. A mensagem que o salvaria também seria compartilhada com
todos os seus queridos, com as pessoas que gozavam de sua intimidade. Cornélio
provavelmente tinha uma esposa. E filhos. E talvez outros familiares próximos
vivendo com ele. Cornélio também deveria ter soldados em confiava, companheiros
de batalhas onde uma amizade sólida foi formada.
Assim
como Cornélio não queria sua família longe, nem seus amigos perdidos em um
campo de batalha qualquer, ele também não queria separar-se deles na
eternidade. E os traz a todos para ouvirem Pedro falar das grandezas de Deus
que deveriam chegar a todos os cantos da terra (Rm 10:18).
25 Aconteceu que, indo Pedro a
entrar, lhe saiu Cornélio ao encontro e, prostrando-se-lhe aos pés, o adorou. 26 Mas Pedro o levantou,
dizendo: Ergue-te, que eu também sou homem.
Apesar
de sua piedade, e de ser um homem temente a Deus, e de suas orações e esmolas
terem sido aceitas pelo Senhor, Cornélio ainda não era um cristão. Cornélio nem
mesmo era um judeu. Cornélio ainda era um romano, com uma mente de romano e,
portanto, com atitudes comuns aos romanos. Cornélio foi encontrar-se com Pedro
no portal – talvez com medo de que, afinal, Pedro se recusasse a entrar porque
ele era judeu e aquela era a casa de um romano, e, mais que isso, de um oficial
romano, os quais não eram tidos como os homens mais amados do mundo pelos
judeus, só perdendo para os samaritanos e publicanos.
O
segundo erro cometido por Cornélio que mostram a sua mentalidade ainda não convertida
é o fato de se prostrar aos pés de Pedro e adorá-lo, como os habitantes de
Listra (At 14.11-13).
Cornélio
precisava mesmo da visita de Pedro – precisava entender que somente ao Senhor
deveria adorar, somente ao Senhor deveria prestar culto (Êx 20:3-5).
Pedro,
Paulo e qualquer outro pregador eram apenas instrumentos por meio do qual os
pecadores viriam a conhecer a Jesus (I
Co 3:5). Eles eram apenas ministros, buscando anunciar a reconciliação que
Deus promoveu, em Cristo, com pecadores antes perdidos (II Co 5:20).
Não
era Pedro nem Paulo a quem Cornélio deveria adorar – era a Cristo, o Senhor.
Somente ele tinha o nome pelo qual os pecadores poderiam ser salvos (At 4:12).
27 Falando com ele, entrou,
encontrando muitos reunidos ali, 28
a quem se dirigiu, dizendo: Vós bem sabeis que é proibido a um judeu ajuntar-se
ou mesmo aproximar-se a alguém de outra raça; mas Deus me demonstrou que a
nenhum homem considerasse comum ou imundo; 29
por isso, uma vez chamado, vim sem vacilar. Pergunto, pois: por que razão me
mandastes chamar?
Após
corrigir a perspectiva equivocada de Cornélio, comum aos gentios, de tratarem
homens como se fossem mais do que homens, ou, às vezes, considera-los divinos,
Pedro continua a colocar as coisas na perspectiva correta. Diferente do que
faria em outra ocasião e se tornaria repreensível quando, por medo dos judeus, afastara-se dos gentios (Gl_2:11), ele entra na casa de um
gentio, diante de gentios, e coloca as coisas na perspectiva correta.
Segundo
as tradições dos judeus, que eram conhecidas dos romanos, ele não deveria estar
ali. Não apenas não deveria, não poderia. Pela tradição ele estava proibido de
estar ali. Mas Pedro era discípulo de Jesus. Ele conhecia o ensino de Jesus,
que a tradição não deve ser considerada superior aos deveres de misericórdia –
e que ato maior de misericórdia do que proporcionar a pecadores gentios a
oportunidade de terem Deus no mundo (Ef 2.12) e obterem a salvação graciosamente dada em Jesus Cristo (I Pe 1:21).
Mas
Pedro faz uma ressalva. Ele usa a adversativa leve, mas, como a demonstrar que
a proibição não era algo essencial – e, de fato, não era, era muito mais um
costume fruto de uma interpretação legalista do que o ensino claro das
Escrituras. Mas, diz Pedro, mais que às tradições ele tinha que obedecer a Deus
que lhe disse para não considerar indigno o que o próprio Deus havia sido
considerado aceitável. Pedro usa uma linguagem cerimonial à qual os romanos estavam
acostumados (comum ou imundo) e não considerariam ofensiva.
O
que importava é que, em obediência a Deus, que respondera às orações e práticas
piedosas de Cornélio, Pedro estava ali – cerimonialismo e tradicionalismo deram
lugar à obediência a uma ordem direta de Deus. Devemos lamentar que estas
limitações, mesmo comprovadamente abolidas e contrárias à vontade de Deus,
ainda estão presentes na mentalidade da Igreja. Tradições culturais, tradições
sociais, tradições pseudoteológicas que são empecilhos ao anúncio do evangelho
a pecadores. Vencida a barreira do tradicionalismo religioso e do nacionalismo,
era o momento de tratar da razão daquela reunião.
30 Respondeu-lhe Cornélio:
Faz, hoje, quatro dias que, por volta desta hora, estava eu observando em minha
casa a hora nona de oração, e eis que se apresentou diante de mim um varão de
vestes resplandecentes 31
e disse: Cornélio, a tua oração foi ouvida, e as tuas esmolas, lembradas na
presença de Deus. 32
Manda, pois, alguém a Jope a chamar Simão, por sobrenome Pedro; acha-se este
hospedado em casa de Simão, curtidor, à beira-mar. 33 Portanto, sem demora, mandei chamar-te, e fizeste bem
em vir. Agora, pois, estamos todos aqui, na presença de Deus, prontos para
ouvir tudo o que te foi ordenado da parte do Senhor.
Cornélio
expõe a Pedro a causa daquela reunião tão inusitada de gentios e judeus e um só
propósito: obedecerem às ordens de Deus. Ali é exposto a vida devocional de
Cornélio, sua visão, o comunicado que lhe trouxe grande alegria e a missão de
procurar Pedro em local claramente indicado: a casa de Simão, o curtidor, à
beira-mar na cidade de Jope.
A
obediência de Cornélio, enviando seus emissários à procura de Pedro é
mencionada, e a alegria em receber o emissário do Senhor também (Is 52:7). O problema posto é: havia
pessoas que não tinham Deus no mundo. E pelo menos uma delas tinha seu coração
inclinado para Deus (Pv 21:1).
Ele
queria ser salvo, desejava a salvação, queria servir a Deus mas, para invocá-lo
salvadoramente precisava conhece-lo (Rm
10:14). E para que ele pudesse invocar ao salvador, precisava saber quem
era o salvador, precisava ouvir falar sobre Jesus (Jo 17:3). E quem melhor que um discípulo de Jesus para apresentar
Jesus?
Como
Apolo, Cornélio era religioso, conhecia sobre Moisés e sobre o messias – mas
ainda não conhecia sobre Jesus. E foi precisamente para este fim que os
ministros da reconciliação (II Co 5:18)
por intermédio de Cristo Jesus foram deixados, para tirar os homens da
ignorância, mesmo a ignorância instruída (At
17:22), como dos gregos, para a luz de Cristo (I Pe 2:9). Cumpriu-se em Cornélio o que diz a palavra: Deus se
deixou achar porque ele o buscou de todo o seu coração (Jr 29:13).
33 Portanto, sem demora,
mandei chamar-te, e fizeste bem em vir. Agora, pois, estamos todos aqui, na
presença de Deus, prontos para ouvir tudo o que te foi ordenado da parte do
Senhor.
Pecadores
tem uma necessidade. Judeus tinham uma necessidade. Samaritanos tinham esta
mesma necessidade. E os gentios, como Cornélio, também tinham uma necessidade:
todos precisavam de um salvador, todos precisavam do messias, todos tinham,
assim como todos os homens do presente e todos só que ainda hão de vir,
necessidade de Jesus, o salvador. De novo, fica a indagação: como eles poderão
encontrar o salvador se não ouvirem sobre ele? Como invocarão aquele de quem
nada ouvirem? É bom lembrar que a salvação é tão somente pela fé – Cornélio
ainda não sabe o que é ser um salvo até este momento. Ele precisa crer, e crer
em Cristo, e a fé só pode vir por um meio – pela palavra de Cristo (Rm 10:17).
Pedro
não anuncia o nacionalismo embutido na religiosidade judaica – só poderia ser
membro da comunidade dos eleitos quem se tornasse judeu (e Cornélio permanecia
apenas um temente, não se tornara
judeu). A primeira fala de Pedro descarta, de imediato, o nacionalismo
religioso dos judeus. Em outro lugar das Escrituras é Paulo quem nos diz que a
filosofia e as sutilezas dos filósofos também são inúteis para a salvação e
crescimento espiritual dos homens (Cl
2:8). Nem todo o conhecimento que o homem pode obter é suficiente para que
eles, por si mesmos, conhecessem a Deus, embora Deus não esteja longe (At 17:27).
Em
relação a Deus e à sua vontade há três tipos de ignorância: a primeira, semelhante
à de Cornélio, desejável e necessária, que, ignorando o que Deus dele queria,
procura imediatamente a quem lhe possa ensinar. É o que podemos chamar de
ignorância humilde, desejosa de conhecimento verdadeiro do verdadeiro Deus e
que se assenta aos pés do Senhor para aprender.
Um segundo tipo de ignorância é a
arrogante, pretensiosa – como encontramos nos escribas e fariseus que
hipocritamente rejeitavam a tudo o que Jesus fazia e falava porque achavam ter
o controle da verdade (Lc 12:56),
sem, no entanto, conhecerem a verdade libertadora (Jo 8:32).
Um terceiro tipo de ignorância é a
ignorância bruta, como descrito nos salmos (Sl 78.56-57) ou os efésios (At
19:34), e um em especial, o latoeiro Alexandre (II Tm 4:14).
Todos
nós somos, de alguma forma, ignorantes em relação a muitas coisas e,
precisamos, humildemente, fazer como Jó. De uma pretensão arrogante em julgar a
sua santidade e a justiça de Deus, após instruído pelo Senhor cala-se pondo a
mão à boca, admite a sua pretérita ignorância (Jó 42:3) mas louva a Deus pelo novo conhecimento (Jó 42:5).
Para
resolver a ignorância de Cornélio só havia uma solução: ouvir o que Deus tinha
mandado Pedro dizer: não era a palavra de Pedro, não era o nacionalismo nem a
filosofia nem nada que os homens pudessem produzir, inclusive a tão adorada
ciência do século XXI (Sl 146:3) –
era, tão somente, o que Deus ordenou que Pedro lhe dissesse da parte do Senhor
– e o que Pedro tinha a dizer era que “não há salvação fora de Jesus” (At 4:12).
Cornélio
reuniu sua família para ouvir a palavra de Deus. Cornélio não queria filosofia,
se quisesse, havia numerosos gregos habilidosos nisso. Cornélio não queria
legalismo – para isso havia escribas e fariseus aos montes à sua disposição.
Mas ele queria ouvir a Palavra de Deus. E para ele ouvir a Palavra de Deus
precisava de um crente disposto a pregar a Palavra de Deus. Para o pecador
ouvir a Palavra de Deus precisa que você, crente, discípulo de Cristo, pregue a
Palavra de Deus. Esta é a responsabilidade do crente.
E
para você, que ouve a palavra, deixe-me dizer-lhe qual a sua responsabilidade:
crer no Senhor Jesus, como seu salvador, e senhor, e se converter, e ser salvo,
vencendo a dureza do coração causada pela incredulidade (Is 6:10).
Daqui
precisam sair dois tipos de pessoas: crentes dispostos a obedecerem ao ide do
Senhor Jesus e pregarem o evangelho (Mc
16:15) e novos crentes na palavra que lhe foi pregada, de que há um só
salvador, e este é Jesus, e, crendo nele, agora são portadores da dadiva da
vida eterna (Jo 10:28).
A
única outra opção é a da rebeldia, da rejeição da palavra e da desobediência ao
Senhor Jesus. E certamente você não quer experimentar o resultado desta
rebeldia (Hb 10:31).
Minha
exortação final: seja um discípulo obediente, ouça o que Deus lhe diz e
obedeça. Inimigo ou amigo de Jesus? A resposta está na obediência (Jo 15:14). Lembre-se que o interesse de
Deus por pecadores não é limitado por barreiras geográficas ou sociais.
Lembre-se que os pecadores chamados por Deus devem tomar uma atitude e sair do
seu estado de letargia. Lembre-se que não faltam meios para a salvação dos
incrédulos – Deus já dispôs todas as ferramentas e circunstâncias. Lembre-se
que Deus só chama para a salvação por meio de sua palavra efetiva e
verdadeiramente pregada. Então, agora que você ouviu a palavra que anuncia a
salvação em Deus, crê no Senhor Jesus para que seja salvo.