É
muito comum encontrar nas Igrejas pessoas com diferentes níveis de envolvimento
no seu dia-a-dia. Não precisamos apelar para o uso de termos jocosos e
depreciativos, crente disto, crente daquilo, mas o fato é que há membros
compromissados e membros descompromissados com o trabalho.
Sem
qualquer esforço logo identificamos aqueles que estão presentes e ativos em
todos os trabalhos dos quais conseguem participar – são aqueles que, quando se
ausentam, a Igreja logo pergunta se está viajando, trabalhando ou doente. São
os que mais trabalham, que ocupam os cargos e que, com isso, acabam sendo os
agentes das decisões que definem os rumos da Igreja, evidentemente que, acima
deles, está o Senhor e espera-se que sempre possa ser dito que a decisão tem
origem primeiro em Deus (At 15:28).
Com
um pouquinho de cuidado também encontramos aqueles que eventualmente se fazem
presentes, especialmente como frequentadores de dois dos principais encontros
da Igreja – a Escola Bíblica e os cultos dominicais. São menos envolvidos, se
ausentam com frequência e sua ausência só é sentida após algum tempo. Precisam
entender melhor o que significa ser parte do corpo de Cristo (Hb 10:25).
Somente
quem está na Igreja percebe aqueles que, embora membros da Igreja, embora tendo
sido batizados e feito a pública profissão de fé são pouco mais que visitantes
esporádicos. Fazendo um paralelo com um termo que os protestantes usam
frequentemente com os romanistas, são os evangélicos não praticantes.
Participam muito pouco, mas se identificam com a Igreja e usam o nome da Igreja
para se identificarem socialmente. Mas contribuem muito pouco com sua presença,
seus dons e talentos.
Esperamos
que os primeiros estejam sempre a postos – quase sempre temos que convocar e
pedir ajuda aos intermediários e, quase sempre, quando por algum motivo confiamos
esperamos que os terceiros façam alguma coisa nos decepcionamos, eles tem que
ser substituídos às pressas e a tarefa é feita de improviso.
Como
conduzir o povo de Deus com estas características? Precisamos olhar para as
Escrituras, e Neemias nos oferece um princípio que certamente é muito útil. Ele
não esperava que os descompromissados participassem da obra.
7 E ainda disse ao rei: Se ao
rei parece bem, dêem-se-me cartas para os governadores dalém do Eufrates, para
que me permitam passar e entrar em Judá, 8
como também carta para Asafe, guarda das matas do rei, para que me dê madeira
para as vigas das portas da cidadela do templo, para os muros da cidade e para
a casa em que deverei alojar-me. E o rei mas deu, porque a boa mão do meu Deus
era comigo.
9 Então, fui aos governadores
dalém do Eufrates e lhes entreguei as cartas do rei; ora, o rei tinha enviado
comigo oficiais do exército e cavaleiros. 10
Disto ficaram sabendo Sambalate, o horonita, e Tobias, o servo amonita; e muito lhes desagradou que alguém viesse a
procurar o bem dos filhos de Israel.
11 Cheguei a Jerusalém, onde
estive três dias. 12
Então, à noite me levantei, e uns poucos homens, comigo; não declarei a ninguém
o que o meu Deus me pusera no coração para eu fazer em Jerusalém. Não havia
comigo animal algum, senão o que eu montava. 13 De noite, saí pela Porta do Vale, para o lado da
Fonte do Dragão e para a Porta do Monturo e contemplei os muros de Jerusalém,
que estavam assolados, cujas portas tinham sido consumidas pelo fogo. 14 Passei à Porta da Fonte e
ao açude do rei; mas não havia lugar por onde passasse o animal que eu montava.
15 Subi à noite pelo
ribeiro e contemplei ainda os muros; voltei, entrei pela Porta do Vale e tornei
para casa.
16 Não sabiam os magistrados
aonde eu fora nem o que fazia, pois até aqui não havia eu declarado coisa
alguma, nem aos judeus, nem aos sacerdotes, nem aos nobres, nem aos
magistrados, nem aos mais que faziam a obra. 17 Então, lhes disse: Estais vendo a miséria em que
estamos, Jerusalém assolada, e as suas portas, queimadas; vinde, pois,
reedifiquemos os muros de Jerusalém e deixemos de ser opróbrio.
18 E lhes declarei como a boa
mão do meu Deus estivera comigo e também as palavras que o rei me falara.
Então, disseram: Disponhamo-nos e edifiquemos. E fortaleceram as mãos para a boa obra. 19 Porém Sambalate,
o horonita, e Tobias, o servo
amonita, e Gesém, o arábio, quando o
souberam, zombaram de nós, e nos desprezaram, e disseram: Que é isso que
fazeis? Quereis rebelar-vos contra o rei?
20 Então, lhes respondi:
o Deus dos céus é quem nos dará bom êxito; nós, seus servos, nos disporemos e
reedificaremos; vós, todavia, não tendes parte, nem direito, nem memorial em
Jerusalém.
Ne 2.7-20
A
primeira atitude de Neemias é convocar todos aqueles que faziam parte da
liderança constituída em Jerusalém. Ele precisava saber com quem poderia
contar, quem tinha compromisso com o Senhor e sua obra e quem não tinha. Muitos
ocupavam posições de liderança já há algum tempo dando continuidade ao trabalho
iniciado desde os dias de Esdras que iniciara o trabalho de reestruturar o
culto, reconstruir o templo (tarefa que durou 20 anos) e as casas mas pouco
mais além disso havia sido feito. Os muros, evidentemente, estavam caídos e as
casas desprotegidas em caso de algum ataque. Com um projeto pronto, Neemias
desafia o povo para que eles também se envolvam na obra (Ne 2.17-18).
O
ponto é: quem estaria disposto a participar e quem não queria o bem de
Jerusalém (Ne
2.10).
Logo os adversários aparecem – Sambalate, natural de Bete-Horon, Tobias, um servo
do rei, descendente do filho de Ló com sua filha mais nova, e mais tarde Gesém,
um descendente de Ismael. É salutar lembrar que, na obra do Senhor, quem não
ajuda é empecilho, quem não é pelo Senhor é contra (Lc 11:23).
É
uma decisão sempre difícil de ser tomada, e às vezes um líder precisa tomar:
definir a equipe de trabalho, escolhendo entre aqueles que estão realmente
dispostos a fazer a obra e os que estão interessados apenas em "tomar
parte" ou, pior ainda, aqueles que estarão torcendo contra e podem tomar atitudes
e decisões que só venham a atrapalhar o andamento dos projetos. É sempre muito
difícil analisar uma equipe e decidir afastar alguém. Mas Neemias não tinha
escolha. Ele não podia correr o risco de fracassar. Seu tempo era escasso, o rei
tinha lhe dado apenas um tempo definido (que não sabemos exatamente quais,
embora os estudiosos do Antigo Testamento afirmem que foi, no máximo, um
período de 3 anos.
Fracassar
significava deixar os judeus em opróbrio ainda maior do que o que ele encontrava,
pois, além de destruídos cultural e politicamente também seriam zombados por
todos como um bando de fracassados pretensiosos (Lc 14.28-30).
Sambalate
é identificado como um dos governadores provinciais, e Tobias e Gesém
provavelmente tinham alguma influência na região como membros de povos que os
babilônicos tinham transplantado para a região e que fariam parte do amálgama
de povos que ficou conhecida como samaritanos que, um século depois,
edificariam seu próprio templo no monte Gerizim, perto de Siquém, oficializando
definitivamente a ruptura e institucionalizando o ódio entre estes dois povos (Jo 4:20). Certamente não foi fácil
para Neemias, recém-chegado, dirigir-lhes as palavras de rejeição que
permaneceram ecoando por quatro séculos (Ne 2.20).
Quantas
pessoas são necessárias para reedificar uma cidade? Quantas pessoas são
necessárias para construir um muro com uma dezena de metros de altura e
centenas de metros de extensão? A melhor resposta é: todas. Todas as
disponíveis. O máximo de pessoas possível. E o caso de Neemias é ainda mais
difícil porque ele estava pronto a reedificar a cidade à partir de um
"resto de povo" deixando de lado pessoas que tinham recursos,
influência e auxiliares.
Documentos
antigos conhecidos como Papiros de Elefantina mostram que Neemias precisava
montar a sua equipe de trabalho rejeitando três pessoas que possuíam grande
influência: Sambalate, por um tempo foi governador da Samaria (e talvez
quisesse governar a província transeufratiana inteira), Gesém liderava um grupo
de comunidades árabes e Tobias que liderava as comunidades amonitas (talvez
como um regente títere, por isso é chamado de servo “do rei”) e parece ter se
tornado membro de uma família judaica, o que dificultaria ainda mais afastá-lo
de sua equipe – mas era necessário, e, se eles tivessem algum interesse nisso
já teriam feito alguma coisa pois já estavam ali há muito mais tempo que
Neemias. Em muitas situações é excelente ter muita gente. A bíblia diz, por
exemplo, que na multidão de conselheiros está a segurança (Pv 11:14) e a vitória (Pv 24:6), duas coisas que eles
certamente não podiam desprezar.
Mas
Deus também já tinha mostrado que com 300 podia fazer mais do que milhares sem
Deus. Deus rejeitou 22.000 tímidos e medrosos que atenderam ao chamado de
Gideão (Jz
7.3).
Deus também rejeitou 9.700 desatentos (Jz 7:7).
Para
que a obra andasse era necessário que apenas os que estivessem dispostos para a
obra fossem engajados nela. Não podia haver brechas. Não podia haver gente sem
compromisso com Deus no meio do povo porque havia grande perigo na empreitada. O
importante não era o número, era a qualidade, a prontidão, a confiabilidade.
A
obra do Senhor não é para tímidos, para covardes, para os que retrocedem (Hb 10:39) mas dos que olham para a
frente, que não tiram os olhos do Senhor e prosseguem para o alvo da soberana
vocação (Fp
3.12-14).
Com
poucos compromissados você tem mais trabalho, mas certamente menos decepções,
menos falhas de execução, por isso Jesus, nos momentos cruciais de seu
ministério, investiu nos doze apóstolos que ele mesmo escolheu e enviou (Jo 20:21) e não lidar com uma
multidão de 5000 pessoas que queriam apenas pão (Jo 6:26), aos quais ele não se
confiava (Jo
2:24)
e que sabia que logo o abandonariam (Jo 6:66).
Não
faça alianças para o reino com quem o rei não fez aliança alguma. Pensemos na
situação de Neemias: se você fosse reestruturar uma comunidade, você abriria
mão de líderes de grupos inteiros nesta comunidade (Sambalate era líder dos
horonitas (Bete Horon), Tobias, dos amonitas, Gesém, dos arábios – Ne 2.19). Eles contavam com a
colaboração dos asdoditas (Ne 4.7), também eles antigos
inimigos de Israel (Js 11:22) de onde saiu, por exemplo, Golias, o gigante
filisteu de Gate (I Sm 17:4) – todos estes povos inimigos históricos dos
judeus.
Talvez
muitos estrategistas entendessem que era a hora de uma aliança estratégica,
ainda mais que eles tinham dinheiro para comprar apoios (Ne 6.12) e tinham influentes
conexões religiosas com os profetas (Ne 6.14) e até mesmo familiares com
o sumo sacerdote (Ne 13.28) embora, aparentemente, este não estivesse
envolvido com os inimigos de Neemias mas foi prudentemente afastado (Ne 13:28).
Neemias
faz exatamente o contrário do que os judeus vinham fazendo desde o tempo de
Esdras – ele prefere um grupo pequeno e coeso, com os mesmos princípios e
propósitos, do que fazer alianças que poderiam trazer benefícios no curto prazo
mas que, no fim, acabariam lhe trazendo dissabores (II Rs
18:21).
Neemias compreendia perfeitamente que não deveria se associar com os ímpios
para não colher o fruto de sua impiedade, como aconteceu com o rei Ezequias (Is 39.1-8).
Lembremos
que a obra não é nossa, é do Senhor – e ele é quem disporá de todos os recursos
para que nossa tarefa seja executada. A Igreja não precisa aliar-se à impureza
em nome de um benefício imediato (II Co 6:14). O Deus que Paulo diz ser capaz de iniciar
e completar a boa obra não mudou (Fp 1:6).
A
obra do Senhor é para ser executada por suas testemunhas (Is 44:8) às quais ele libertou do
império das trevas, chamou para sua maravilhosa luz e deu-lhes a missão de
proclamar suas virtudes (I Pe 2:9).
Concluindo
com a história de Gideão – o Senhor dispensou 31.700 homens para usar apenas 300
– menos que a centésima parte – para mostrar que ele é quem liberta (Jz 7:2), ele é quem abençoa, é ele
quem faz com que a obra seja concluída (Jo 15:5) –
mas ele vai usar aqueles que estiverem realmente compromissados com a sua obra.
O
que há de semelhante entre os nossos dias e os dias de Neemias? Não quero fazer
um paralelo com Igrejas que se encontram moribundas, arrasadas (elas existem,
infelizmente), mas creio que o chamado de Jesus aos seus discípulos é
perfeitamente aplicável: ainda há vagas para trabalhadores em sua seara (Lc 10:2).
Em primeiro lugar, precisamos compreender
que, tanto na obra de Neemias como hoje só existem dois caminhos – e uma
decisão tem que ser tomada: ou estamos dispostos, e atendemos ao chamado do
Senhor, ou não estamos dispostos, e então, não estamos aptos para a obra – e,
portanto, para o reino de Deus (Lc 9:62). O arado está posto bem à
sua frente. Pronto para ser tomado. A obra está diante de ti e você tem que se
posicionar – fará ou não? Você pode até pensar que é possível ser discípulo de
Jesus e não tomar uma atitude posicionando-se na obra – mas deixe eu lhe
lembrar as palavras de Jesus: se você não tomar a cruz e segui-lo, nada feito (Lc 9.23-24).
Em segundo lugar, precisamos compreender
que esta decisão tem consequências duradouras – não pode ser uma atitude que
você toma hoje mas amanhã já mudou de ideia. Você não pode retroceder, porque
retroceder é perdição (Hb 10:39), retroceder é atitude daqueles que nunca foram, de
fato, parte da comunidade dos salvos (I Jo 2:19) porque aqueles que o
Senhor chama ele próprio confirma (Rm 8:30) completando a obra iniciada quando a alma é vivificada e ouve a voz
do evangelho (Fp
1:6).
Em terceiro lugar, a atitude que você
tomar agora tem consequências eternas. Os rejeitados por Neemias formaram um
povo à parte, os samaritanos. Sambalate, Tobias e Gesém estavam em Jerusalém.
Tinham acesso à cidade, a Neemias, aos profetas e sacerdotes mas não tomaram parte
na obra. Você pode ter acesso à Igreja, aos pastores, aos presbíteros, aos
cultos e, ainda assim, não ter parte na obra e sofrer terrível decepção quando
o Senhor lhe disser: nunca vos conheci, vocês não tem direito a entrar no reino
dos céus (Mt
7:22 e 24). Se ele prometeu dizer isso para quem parecia ser crente, quanto mais para aqueles que nem crentes
parecem ser.
Deixe-me
concluir – se você entende que esta mensagem é um chamado de Deus para que você
responda positivamente ao chamado para servi-lo; se pelo Espírito de Deus o seu
coração foi tocado, sua mente foi iluminada e sua vontade foi inclinada para
dizer ao Senhor que quer servi-lo, seja bem vindo. Quero poder chamar-te de
irmão. Quero dar-te a mão e andar junto com você numa caminhada de alegrias e
lutas, mas com certeza uma caminhada que nos levará, em Jesus Cristo, à morada
celestial, à nova Jerusalém.
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