quinta-feira, 10 de maio de 2012

QUE PAIS ESTAMOS DANDO PARA NOSSOS FILHOS

Um exemplo bíblico: o sacerdote Eli e seus filhos, descritos no capítulo 2 do I livro de Samuel.

12 Eram, porém, os filhos de Eli filhos de Belial e não se importavam com o SENHOR; 13 pois o costume daqueles sacerdotes com o povo era que, oferecendo alguém sacrifício, vinha o moço do sacerdote, estando-se cozendo a carne, com um garfo de três dentes na mão; 14 e metia-o na caldeira, ou na panela, ou no tacho, ou na marmita, e tudo quanto o garfo tirava o sacerdote tomava para si; assim se fazia a todo o Israel que ia ali, a Siló. 15 Também, antes de se queimar a gordura, vinha o moço do sacerdote e dizia ao homem que sacrificava: Dá essa carne para assar ao sacerdote; porque não aceitará de ti carne cozida, senão crua. 16 Se o ofertante lhe respondia: Queime-se primeiro a gordura, e, depois, tomarás quanto quiseres, então, ele lhe dizia: Não, porém hás de ma dar agora; se não, tomá-la-ei à força. 17 Era, pois, mui grande o pecado destes moços perante o SENHOR, porquanto eles desprezavam a oferta do SENHOR. […] 22 Era, porém, Eli já muito velho e ouvia tudo quanto seus filhos faziam a todo o Israel e de como se deitavam com as mulheres que serviam à porta da tenda da congregação. 23 E disse-lhes: Por que fazeis tais coisas? Pois de todo este povo ouço constantemente falar do vosso mau procedimento. 24 Não, filhos meus, porque não é boa fama esta que ouço; estais fazendo transgredir o povo do SENHOR. 25 Pecando o homem contra o próximo, Deus lhe será o árbitro; pecando, porém, contra o SENHOR, quem intercederá por ele? Entretanto, não ouviram a voz de seu pai, porque o SENHOR os queria matar. 26 Mas o jovem Samuel crescia em estatura e no favor do SENHOR e dos homens. 27 Veio um homem de Deus a Eli e lhe disse: Assim diz o SENHOR: Não me manifestei, na verdade, à casa de teu pai, estando os israelitas ainda no Egito, na casa de Faraó? 28 Eu o escolhi dentre todas as tribos de Israel para ser o meu sacerdote, para subir ao meu altar, para queimar o incenso e para trazer a estola sacerdotal perante mim; e dei à casa de teu pai todas as ofertas queimadas dos filhos de Israel. 29 Por que pisais aos pés os meus sacrifícios e as minhas ofertas de manjares, que ordenei se me fizessem na minha morada? E, tu, por que honras a teus filhos mais do que a mim, para tu e eles vos engordardes das melhores de todas as ofertas do meu povo de Israel? 30 Portanto, diz o SENHOR, Deus de Israel: Na verdade, dissera eu que a tua casa e a casa de teu pai andariam diante de mim perpetuamente; porém, agora, diz o SENHOR: Longe de mim tal coisa, porque aos que me honram, honrarei, porém os que me desprezam serão desmerecidos. 31 Eis que vêm dias em que cortarei o teu braço e o braço da casa de teu pai, para que não haja mais velho nenhum em tua casa. 32 E verás o aperto da morada de Deus, a um tempo com o bem que fará a Israel; e jamais haverá velho em tua casa. 33 O homem, porém, da tua linhagem a quem eu não afastar do meu altar será para te consumir os olhos e para te entristecer a alma; e todos os descendentes da tua casa morrerão na flor da idade. 34 Ser-te-á por sinal o que sobrevirá a teus dois filhos, a Hofni e Finéias: ambos morrerão no mesmo dia. 35 Então, suscitarei para mim um sacerdote fiel, que procederá segundo o que tenho no coração e na mente; edificar-lhe-ei uma casa estável, e andará ele diante do meu ungido para sempre. 36 Será que todo aquele que restar da tua casa virá a inclinar-se diante dele, para obter uma moeda de prata e um bocado de pão, e dirá: Rogo-te que me admitas a algum dos cargos sacerdotais, para ter um pedaço de pão, que coma.

Criar os filhos sempre foi um grande desafio para pais e mães. Não era diferente nos tempos pré-monárquicos em Israel [por volta de 800 a.C.]. Israel ainda era um amontoado de grupos tribais, e não havia uma liderança formal, mas um homem e um lugar exerciam a função aglutinadora da nação: o sacerdote Eli, em Siló, onde estava a arca da aliança do Senhor. Eli funcionava como uma espécie de governador, porque era o representante de Deus. Então podemos dizer que Eli era um homem muito importante, quase como um rei – sem governadores, senadores, deputados ou qualquer outro tipo de assessoria. Isso quer dizer que ele tinha que se ocupar com muitos aspectos do governo e ainda cuidar da manutenção do culto de um país inteiro. Ao lado disso os sacerdotes também tinham sua família, esposa e filhos para educar. É evidente que ele não conseguiria fazer tudo isso bem feito – e alguma coisa ficaria pelo caminho. Vamos encontrar pelo menos duas questões que precisamos observar e traçar alguns paralelos com o que podemos observar nos dias atuais.

A BUSCA POR SIGNIFICAÇÃO PESSOAL

Eli se dedicou arduamente a fazer bem o seu trabalho como sumo-sacerdote. Era reconhecido por todos como um homem piedoso, corajoso, honesto. Não havia ninguém que questionasse seu trabalho. Ele havia alcançado algo raro em governantes em qualquer época: não havia questionamento à sua conduta pessoal, mesmo após vários anos à frente daquele povo sempre inconstante. Eli foi bem sucedido em sua busca por significação pessoal. Hoje podemos perceber esta mesma busca por significação pessoal em diversas áreas. As pessoas querem ser e ter, se possível, juntando estas duas coisas. Certa vez ouvi um entrevistado num programa televisivo que um de seus mestres disse para ele que, se ele não quisesse ser tratado como marginal por suas opiniões, ele deveria ser rico ou intelectual. Ter ou ser. Segundo ele, optou por ser intelectual porque lhe parecia o caminho mais fácil. Ele e qualquer outra pessoa precisa atingir um certo grau de satisfação consigo mesmo, e a isso chamo de significação pessoal. E a pergunta que se fazem para saber se alcançaram este grau é: o que tenho? O que me tornei? E buscam esta realização através do crescimento profissional, tentando crescer cada vez mais em sua área de trabalho, cursos, concursos, especializações, mestrados, cargos, doutorados, etc. Tudo isto é medido, calculado, e quase sempre revela-se em novas buscas, porque sempre terá alguém que está à frente, que estudou mais, que tem um cargo maior, mais influente, mais poderoso. É a síndrome que vem do coração do homem desde que Adão e Eva caíram na armadilha da serpente e quiseram ser como Deus. Nunca conseguiram, nem homem algum conseguirá – mas o vazio e o desejo permanecem, e por isso continuam e continuarão tentando. Esta busca também se expressa na preocupação em obter o pão de cada dia [Mt 6.11], o alimento para a boca e as vestes para o corpo [Mt 6.25-34]. A princípio a busca é pelo suficiente – para si, para os seus. Depois de algum tempo a busca pelo suficiente pode passar a ser substituída pela reserva, um pouco mais para guardar para um eventual tempo de crise. E finalmente se envereda pela busca do superficial, do supérfluo, da satisfação de necessidades transitórias e não essenciais, mas que são vendidas como se, através delas, viesse a satisfação da necessidade de uma significância pessoal. Mas a busca não para – há também a busca por acumulo pecuniário, por um ajuntar riquezas, dinheiro, veículos, propriedades móveis e imóveis. Encher a casa de quadros que falam de tranquilidade e nunca ter a tranquilidade interior. Ter guardado grandes quantidades de coisas de valor mas jamais alcançar a posse do que realmente tem valor [Mt 6.33]. Nesta busca por significação pessoal vão deixando de lado o que realmente significa ser homem e mulher, pai e mãe, marido e esposa. Vão invertendo ou abandonando seus pais, delegando a terceiros [babás, avós, escolas, igrejas e programas televisivos] algo que deveria ser competência exclusiva da família, do pai e da mãe. Não podendo mais ser pai e mãe, passam à tentativa de compensar, provendo coisas valiosas ao invés de valores. Objetos de boa qualidade ao invés de presença de qualidade. Desejam dar o que gostariam de ter achando que é isso o que os filhos precisam. Muitos pais, depois de alguns anos, nem reconhecem mais seus filhos, perguntando a si mesmos onde é que eles aprenderam determinadas coisas. A verdade é que, realmente, não sabem. Não sabem se foi na escola ou nas ruas, na TV ou com amigos. Pais que não sabem quem são ou o que fazem os amigos e nem imaginam quem sejam os pais dos amigos dos seus filhos.

O DESLIGAMENTO DA REALIDADE

Tão ocupado com as suas tarefas de sumo-sacerdote e regente informal o sacerdote Eli foi se dissociando cada vez mais da realidade do seu lar. Deixou de cuidar de seus filhos. Deixou-os à vontade. Desligou-se do contato diário para vê-los eventualmente, e, depois, para apenas receber notícias do que faziam. Este desligamento da realidade constatado na vida de Eli o conduziu a um completo desconhecimento da micro sociedade que era a sua casa, seus filhos. E assim Hofni e Finéias eram filhos do "pai de Israel" mas eram filhos sem pai [é bom lembrar que a sociedade da época era altamente patriarcal, o pai detinha todas as obrigações de ensino dos filhos, especialmente no caso de Eli cujos filhos estavam sendo educados para exercerem o sacerdócio]. Vejamos algumas características desta situação que também encontramos nos nossos dias, com mais facilidade do que imaginamos, e talvez seja a situação de muitos casais, muitos pais e mães aqui presentes.

INFLUÊNCIAS IMEDIATAS

Há pais que não conhecem as influências imediatas que seus filhos estão sofrendo, como professores, colegas de escola, colegas de atividades esportivas, brincadeiras, seus próprios familiares e familiares dos amigos. Não os conhecendo, não sabendo o que pensam, falam ou fazem os pais não dispõem de recursos para afastá-los destas influências deletérias. É por isso que muitos pais apenas se perguntam, sem tomar providência alguma, quando o filho apronta ou diz algo: "Eu não sei onde esta criança está aprendendo estas coisas". E é verdade, não sabe, e, pior, não investiga, não quer saber, não toma providências para purificar as influências que seus filhos estão recebendo.

INFLUÊNCIAS REMOTAS

Há pais que não conhecem as influências remotas que estão penetrando na mente e no coração de seus filhos, se enraizando lentamente – e quanto mais lentamente mais indelevelmente – na vida de seus filhos. Estas influências são percebidas na TV, na internet, em games e revistas quando as crianças são entregues a si mesmas com tal tecnologia nas mãos, sem qualquer espécie de acompanhamento ou limitação. Muitos pais não sabem como combater esta influência, na maioria dos casos porque sequer suspeitam que ela exista. Mas é bom deixar um alerta: ela existe e é inevitável. Todas as crianças de nossos dias estão expostas a estas influências.

FALTA DE AUTORIDADE PATERNAL

Há pais que não possuem autoridade paternal para corrigir seus filhos porque durante muito tempo não prestaram atenção no desenvolvimento dos seus filhos. A única atenção intensa que lhes dão é para leva-los a médicos ou semelhantes. A última vez que prestaram atenção em seus filhos foi quando eles choraram no meio da noite com cólicas. Na maioria dos casos a falta da "vara da correção" [Pv 22.15] no momento necessário vai dar lugar a brigas intermináveis e insolvíveis, e, finalmente, em alguns casos, no lugar da necessária vara da disciplina a criança encontrará o cassetete da punição.

DESCONHECIMENTO DOS FILHOS

Há pais que não conhecem os filhos que tem. E por isso se surpreendem quando são feridos, decepcionados ou tem que resolver situações em que os mesmos estão envolvidas, fazendo a clássica pergunta: "onde foi que eu errei". Talvez nem tenham errado – talvez sequer tenham tentado fazer alguma coisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na vida dos filhos os pais podem ser vistos de diversas maneiras, vistos como:

i. Alto falantes: são como uma voz fria, impessoal, de origem distante, ditando regras, ordens, mas não possuem um rosto para ser amado, um sorriso para ser ouvido, um olhar para ser compartilhado;

ii. Placas: presentes, estáticos, inativos. Dizem o que deve ser feito, mas não fazem. É a característica do moralismo, do comodismo. Apenas apontam o caminho, mas não o experimentam, não andam por ele;

iii. Manchas: são como sinais de que um dia um objeto esteve ali, que deveria estar ali, mas quando são procurados são apenas isso, sombras, sinais, manchas;

iv. Líderes: são aqueles que estão um pé à frente do restante da família, pensando os passos, experimentando, dando o exemplo, ensinando-os não o caminho, mas no caminho em que devem andar. Um ensino hipotético e moralista oferece uma miragem, uma paisagem. O ensino prático oferece a experiência, a formação de caráter e isto é para toda a vida.

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