terça-feira, 9 de setembro de 2014

SERIE PERSONAGENS - SAMUEL, O ÚLTIMO JUIZ, O HOMEM DA TRANSIÇÃO

SAMUEL, O ÚLTIMO JUIZ

Samuel viveu em um tempo de transição para Israel, na segunda metade do séc. XII a.C. É corretamente chamado de o último juiz, e, ao mesmo tempo, inaugura o período dos reis, embora seus filhos também tenham julgado o povo como co-regentes durante um período, em Beer Sheba. Samuel é mais um daqueles que não era para ter existido, como Isaque, mas que Deus trouxe a existência para usar de uma maneira especial.
Samuel era filho de Elcana e Ana, uma história bem conhecida de oração e resposta de Deus. Amargurada por não ter um filho, e tendo que suportar as zombarias da outra esposa de Elcana, Ana buscou ajuda onde ela poderia ser encontrada: no Senhor (I Sm 1.10).
Mesmo confundida com uma bêbada, Ana explicou pacientemente sua situação ao sacerdote Eli e saiu de lá certa de que o Senhor a havia ouvido (Is 1.18). Tendo concebido, Ana entrega o menino dois ou três anos depois (I Sm 1.24).
Samuel passou a servir ao sacerdote Eli, certamente sem a expectativa de sucedê-lo pois esta seria uma função a ser exercida Hofni e Finéias – que se mostraram indignos de tal ministério e foram rejeitados pelo Senhor (I Sm 3.13). Apesar de servir na casa de Deus Samuel aparentemente não tivera uma experiência pessoal com o Senhor (I Sm 3.7), um estado que pode refletir a realidade de muitas pessoas que nascem na Igreja sem nascerem da água e do Espírito.
Deus foi tolerante com o relapso Eli e seus filhos ímpios durante o período de preparação de Samuel, por mais de duas décadas, certamente, pois a maturidade para o sacerdócio só era alcançada aos 30 anos. Samuel foi naturalmente reconhecido como herdeiro do sacerdócio com a trágica morte de Eli, Hofni e Finéias porque todos sabiam que o Senhor lhe falara, algo que não estava acontecendo com muita frequência naqueles dias. Lamentavelmente Samuel não aprendeu com os erros de Eli e os repetiu – também não conseguiu educar seus filhos para serem justos sucessores e, por isso, Joel e Abias, também se tornaram homens de belial e foram rejeitados pelo povo, dando início a um novo período na história de Israel. Era o raiar do período dos reis, sendo que os dois primeiros foram ungidos por Samuel – Saul e Davi.
O primeiro rei foi escolhido por causa do clamor do povo que não confiava nos filhos de Samuel – vejamos como foram escolhidos os líderes pós Samuel.
Os primeiros "sucessores" foram o que a tradição mandava – os filhos de Samuel (I Sm 8.1-2). Abias e Joel representam a vontade do homem, mas foram rejeitados por seus contemporâneos por não reunirem qualidades ou, pior ainda, enfeixarem defeitos que os inabilitava para julgarem o povo de Deus (I Sm 8.3), desobedecendo as exigências do Senhor quanto ao exercício da função de juízes do povo (Dt 16.18-20).
Por causa das ações más de Joel e Abias o povo pediu a Samuel que lhes desse uma outra forma de governo, não mais a teocrática direta, mas a monárquica (I Rs 8.4-5), a que Samuel, a princípio, não via com bons olhos (I Sm 8.6) mas acabou atendendo por mandato do Senhor (I Sm 8:7).
Israel havia vivido um período em que fora governado por homens piedosos como Moisés e Josué, mas havia entrado em rebelião e apostasia. Depois, foi governado pelos juízes, alguns deles profundamente tementes a Deus – e este período se mostrou por demais conturbado, e muitas vezes o governo destes homens (ou mulheres, como no caso de Débora) tinha um alcance muito limitado, próprio para uma sociedade ainda tribal. Em vista disto, muitas coisas indesejáveis acabaram acontecendo. Agora seria a vez do governo dos reis – e mais uma vez Israel se mostraria rebelde. O que fica claro é que a rebelião era uma coisa do coração, não das instituições.
Samuel acaba sendo o agente desta transição. Rejeitados pelo povo, os juízes darão lugar aos reis. E a primeira escolha, feita por Deus, foi o que considero uma escolha disciplinar: Saul, filho de Quis, um jovem de porte impressionante (I Sm 9.2), impetuoso, que começa bem mas termina mal. Antes de ser ungido rei Saul aparece duas vezes perante Samuel: a primeira vez quando buscava algumas jumentas de seu pai (I Sm 9.3), sem saber, entretanto, que o Senhor o conduzia ao encontro de Samuel (I Sm 9.15-16). Saul é ungido rei (I Sm 10.1) e tomado pelo Espírito do Senhor acaba profetizando (I Sm 10.9-10).
Em seguida Samuel convoca o povo para Mispa, repreende o povo por ter rejeitado o governo teocrático do Senhor (I Sm 10.18-19) – e mais uma vez é necessário observar que o problema não estava na forma de governo, mas na rebeldia dos governados e, lançando sortes, acabaram chegando à Saul família de Quis, que estava escondido no meio da bagagem do povo (I Sm 10.20-22). Ao ver o porte de Saul o povo imediatamente o acolheu como seu rei (I Rs 10.23-23). Após livrar Israel da mão dos filisteus, Saul acabaria agindo impensadamente e cometendo três graves pecados:
1.     Usurpou a função sacerdotal ao oferecer sacrifício (I Sm 13.8-9). Saul era benjamita, e os sacrifícios só deveriam ser oferecidos pelos membros da tribo de Levi, como Samuel. Somente Cristo teria o privilégio de exercer os três ministérios – profético, sacerdotal e real. Saul fora chamado para ser apenas rei, e não deveria passar disso. Sua desobediência fê-lo perder a continuidade da sua família no trono (I Sm 13.13-14);
2.     Deixou de exterminar os inimigos derrotados (I Sm 15.9) como fora, explicitamente, orientado a fazer (I Sm 15.18-19) e, mesmo depois da repreensão, não aceitando a correção (I Sm 15.20-21 – quando Saul diz que Deus é o Deus de Samuel alguns querem ver aqui uma confissão de que o Deus de Israel não era mais considerado por Saul como seu Deus, mas é mais provável que tenha sido uma tentativa de bajular Samuel);
3.     Participou de ritos espúrios (I Sm 28.7). Saul já fora advertido sobre sua desobediência, de sua rebeldia que desagradava a Deus e que o fazia tão odioso como um feiticeiro (I Sm 15:23) e, como sabemos, um pecado chama outro pecado (Sl 42:7). Samuel havia dito que não mais se encontraria com Saul (I Sm 15.26 e 36), e Deus já não mais o orientava (I Sm 28.6).
Ainda antes de Saul ser morto Deus usou Samuel para fechar o ciclo de seu propósito iniciado com a chamada de Rute (Rt 4.21). A história de Samuel com Davi tem dois momentos emblemáticos – a unção de Davi como rei e seu estabelecimento como um tipo de profeta (At 2. 29-31):
1.     Tendo informado de que Saul fora preterido, Samuel também declara que o Senhor já tinha escolhido o substituto (I Sm 13:14) e é encaminhado pelo Senhor à casa de Jesse (I Sm 16.1). Samuel quase incorre no erro de escolher um rei pela aparência (I Sm 16.6-7) ou pela vontade de Jessé, que lhe apresenta quase todos os filhos (I Sm 16.10). De detrás da malhada o Senhor havia chamado a Davi para ser seu ungido (I Sm 16.11-12).
2.     O segundo encontro é quando Saul, desejoso de matar a Davi, acaba sendo enganado por sua própria filha, Mical, e refugia-se com Samuel em Ramá (I Sm19.18). Tanto os mensageiros de Saul, por duas vezes, quanto ele próprio acabam sendo tomados pelo Espírito do Senhor e, ao invés de levarem a cabo seu intento de prenderem e matarem a Davi, unem-se a Samuel e profetizam (I Sm 19.23-24).
Depois disto Samuel é mencionado apenas
1.     Na sua morte (I Sm 25.1);
2.     Na busca desesperada de Saul (I Sm 28:14) embora seja evidente que não era mesmo Samuel porque: a. Samuel disse que jamais tornaria a Saul; b. Samuel não poderia vir de baixo, de um lugar inferior, se estava no seio de Abraão; c. Não há comunicação entre vivos e mortos; d. Samuel, sendo profeta do Senhor, não aceitaria adoração; e. O Senhor condena veementemente a invocação dos mortos e não permitiria que seu profeta atendesse tal chamado;
3.     Como um exemplo de profeta, de fidelidade (Sl 99:6) e fé (Hb 11:32).
Para concluir, pode ser que surja uma pergunta: se a morte de Samuel foi relatada no primeiro livro (I Sm 25.1) quem escreveu o resto? Os estudiosos divergem sobre nomes, mas citam quase unanimemente Natã, o profeta (II Sm 12:25) como o compilador da primeira seção do segundo livro, e Gade, o vidente (II Sm 24.11) como responsável pela edição da segunda parte do segundo livro.

A história de Samuel nos mostra que mesmo os mais consagrados dos homens são capazes de cometer erros. Samuel errou na educação dada a seus filhos – mesmo tendo acompanhado bem de perto os erros de Eli e sido beneficiário da sentença de Deus sobre a sua casa. Errou também ao colocar seus filhos como juízes sem que eles tivessem o estofo moral e espiritual necessário, erro semelhante ao de Eli (). Quase erra ao acreditar que Eliabe fora o escolhido por Deus para suceder Saul, de quem tivera pena e demorara a ungir o novo rei (I Sm 16.1).

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