domingo, 7 de julho de 2013

SANTIFICAÇÃO, SOMENTE PARA QUEM QUER VER A DEUS

Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor, atentando, diligentemente, por que ninguém seja faltoso, separando-se da graça de Deus; nem haja alguma raiz de amargura que, brotando, vos perturbe, e, por meio dela, muitos sejam contaminados; nem haja algum impuro ou profano, como foi Esaú, o qual, por um repasto, vendeu o seu direito de primogenitura. Pois sabeis também que, posteriormente, querendo herdar a bênção, foi rejeitado, pois não achou lugar de arrependimento, embora, com lágrimas, o tivesse buscado.
Hb 12.14-17

Quem quer ver a Deus? Ou, usando o caminho do raciocínio inverso, quem não quer ver a Deus? Se esta pergunta for dirigida a cristãos, muitos podem até afirmar que ela é desnecessária. Mas será que a Igreja realmente pensa em “ver a Deus”? E o que isto significa? Por ver a Deus refiro-me não a enxerga-lo como vemos coisas, mas no sentido de experimentá-lo na plenitude do que ele se dá a experimentar.
Esta ressalva é importante porque não devemos pensar na totalidade de Deus, pois ele sempre será infinito e o homem sempre será finito, e o sábio teólogo africano, Agostinho de Hipona, já afirmava que “finitum nunc capere infinitum”, isto é, o finito não compreenderá o infinito. Mesmo na glória, o homem sempre será finito, e Deus não abandonará a sua infinitude. Na glória experimentaremos o que Deus tem preparado para nós, que, hoje, já é mais do que conseguimos compreender [I Co 2.].
O sentido de “ver a Deus” inclui a experiência com Deus que é, também, a certeza da experiência da glória. E isto só acontecerá se, aqui, agora, houver uma real progressão numa vida de santidade, isto é, num progressivo abandono daquilo que o Senhor reprova em sua palavra e, ao mesmo tempo, numa prática progressiva daquilo que o Senhor ordena e é agradável aos seus olhos [Hb 12.28;  Hb 13.21 e  I Jo 3.22].
Precisamos definir como ponto fundamental que a santificação é condição sine qua non para se ver a Deus, para se viver na presença de Deus ou, dito de outra maneira, não há como ser crente sem ser santo [I Pe 1.16]. Não há esperança de glória eterna [Rm 5.2] sem abandono da busca pela glória deste mundo.
Santidade ou santificação deve ser entendida como uma luta contra o próprio querer. Buscar a santificação significa começar uma luta contra um poderoso adversário. Vale lembrar que a bíblia afirma que temos três inimigos. O primeiro deles é moral, é este século, isto é, este mundo e as coisas que ele pode oferecer; o segundo inimigo é o deus deste século, o diabo, um adversário espiritual, poderoso e sagaz. São dois adversários externos. O terceiro, e, creio, o mais difícil de ser vencido, e que serve de brecha para a ação dos dois anteriores, é o nosso próprio coração, que sabemos bem ser terrivelmente enganoso ou corrupto.
Pode parecer contraditório, mas buscar a santificação é buscar a felicidade abrindo mão da satisfação pessoal, que é o conceito comum e equivocado do que é felicidade, isto é, normalmente confunde-se a felicidade com satisfação de prazeres e desejos - o grande problema é que os prazeres buscados pelos homens carregam em si mesmos os desequilíbrios morais fruto da transgressão adâmica [I Jo 2.15].
Após o pecado o homem imediatamente passa a buscar onde não poderia encontrar alguma coisa que lhe satisfizesse seus desejos e necessidades: faz isso ao dar e a continuar dando ouvidos a satanás, bem como no mundo e nas coisas que há no mundo, que não anda sob a lei de Deus mas serve aos caprichos de satanás [I Jo 5.19]. Mesmo coisas boas podem ser usadas pelo inimigo, deturpadas e tornadas más. Um exemplo é a honra que se deve dar aos pais, que, acrescida de uma religiosidade, acabou se tornando no culto aos antepassados, os “ídolos lares”, uma forma de idolatria.
A verdadeira satisfação, ainda que incompleta aqui, será encontrada na obediência a Deus, e esta é o caminho da santificação. No segundo caso, na desobediência, na busca pela satisfação nas coisas do mundo é não apenas enganoso, como também uma ilusão que gera enorme angústia e frustração porque fadada a não ser satisfeita.
E não pode ser satisfeita porque a satisfação só poderá ser encontrada em andar com Deus.
A BUSCA DA SATISFAÇÃO PESSOAL FAZ A IGREJA ESQUECER-SE DA SANTIFICAÇÃO
Desde a primeira moda [roupas feitas de folhas de figueira, no Éden - Gn 3.7] é possível perceber o desejo constante de estar bem - e as folhas de figueira não são capazes de fazer isso, em atitudes que demonstram a inconstância do coração do homem. O homem ainda quer obter satisfação sem santificação, isto é, metaforicamente, escondendo-se de Deus e de si mesmo [Gn 3.10: Ele respondeu: Ouvi a tua voz no jardim, e, porque estava nu, tive medo, e me escondi].
Dito de outra maneira, é possível que grande número de membros de Igrejas estão nelas buscando satisfação de alguma necessidade, especialmente moral e existencial, mas indispostos para com a santificação, porque santificação implica em renúncia das suas aspirações e anseios em favor da vontade de Deus.
O cristianismo atual evidencia uma tentativa desesperada de evitar todo e qualquer tipo de sofrimento e dar algum sentido, alguma satisfação e significado a uma vida que já parte de premissas equivocadas a respeito do que é felicidade e de quem Deus é. Pedir a Deus que dê a Igreja felicidade pode significar exatamente o oposto do que se pede. A busca de prazer, felicidade e satisfação pessoal afasta o crente do caminho da santificação, por conseguinte, afasta o homem de Deus.
O caminho da santificação é descrito por Jesus no sermão da montanha, nas bem aventuranças, onde ele descreve conceitos e princípios do reino de Deus, que não é deste mundo [Jo 18.36: Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui] nem é aquilo que os homens buscam, ouro e prata, comida e bebida [Rm 14.17], e este reino, por ser superior, deve ser priorizado.
A Igreja deve escolher entre o caminho da satisfação de anseios meramente terrenos ou uma vida de obediência a Deus e seus ditamos exarados em sua palavra. Quanto mais prazer a Igreja buscar, mais distante ela estará de Deus, e, consequentemente, de uma vida santa e da verdadeira realização do propósito de Deus, com a Igreja numa alegria verdadeira e felicidade plena, que só se obtém num relacionamento de grande intimidade com Deus [Sl 25.14].
A BUSCA DO SUCESSO FAZ A IGREJA ESQUECER-SE DA SANTIFICAÇÃO
Ninguém almeja ser fracassado. Ninguém trabalha para fracassar. Ninguém treina para perder. Todos os homens tem no coração o desejo de ser bem sucedido, e a Igreja tem incentivado a busca de realizações terrenas, isto é, almejar o sucesso e por isso admira ou inveja pessoas bem sucedidas.
Com a abundância de historias sobre pessoas bem sucedidas o sucesso pessoal, familiar e profissional, com consequências financeiras foi se tornando o padrão para se auferir a espiritualidade, tomando o lugar da obediência a Deus e sua Palavra.
Este é um fenômeno denominado de mensuração objetiva da fé, isto é, medir a fé tendo como parâmetro não a espiritualidade santa, mas o sucesso que alguém consegue obter, como se as bênçãos de Deus se resumissem a fatores humanamente reconhecidos como sucesso nesta vida.
Mas qual é o padrão? Dinheiro acumulado? Casa grande? Carro novo? Promoção educacional ou profissional? Onde fica o reino de Deus que deveria ser buscado como prioridade [Mt 6.33].
Tribulação é antítese de sucesso. Cristo prometeu não o sucesso, mas as tribulações [Jo 16.33]. Ele as experimentou, era homem de dores [Is 53.3].
A Igreja, porém, tem rejeitado a promessa de Cristo, e, embora a maioria não ouse dizer isso, considera-o um fracassado, como os judeus o fizeram [Mt 27.40]. Consideram homens como Tiago [At 12.2] ou Paulo como fracassados [II Co 11.23-27]. É preciso dizer que é justamente destes homens que o mundo não é digno [Hb 11.37-38].
Por contraditório que possa parecer, muitos cristãos modernos idolatram àqueles cristãos antigos mas rejeitam o modelo, isto é, não querem passar pelas experiências que eles passaram para serem mais que vencedores.
A questão é que, para ser mais que vencedor [Rm 8.37], tem que enfrentar mais que as lutas comuns, e o nome disto é tribulação por causa da obediência a Jesus Cristo [Mt 5.11].
Desejar sucesso neste mundo como prioridade é amar o mundo [I Jo 2.15] e sua concupiscência, que resulta em profunda doença espiritual, com reflexos no padrão pouco espiritual e profundamente materialista. A Igreja que adota este padrão mundano tomou a forma do mundo, sofre sua influência e vive com suas obsessões: sucesso, consumismo, riqueza, fama, reconhecimento, conforto, vida fácil, opulência, mas nenhum valor ou progresso genuinamente espiritual.
Esta Igreja é fruto de uma pregação superficial, motivacional, que apresenta Cristo e o cristianismo como um mero antídoto para o fracasso material, moral e emocional, um simples caminho para o sucesso e a prosperidade. Isto não é cristianismo bíblico, é mera religiosidade horizontal com o uso desobediente e descompromissado da palavra revelada por Deus.
A BUSCA POR EVENTOS SUPERNATURAIS FAZ A IGREJA TIRAR OS OLHOS DA SANTIFICAÇÃO
Outra tendência da Igreja dos últimos anos é a de tentar medir a espiritualidade sem levar em conta a santidade, por aquilo que chamo de supernaturalismo. Não chamo de sobrenatural porque ele independe do natural, logo, o homem não tem nenhuma influência própria, ainda que eu admita influência derivada e concessiva, naquilo que foge à sua esfera normal de atuação, o mundo natural.
O supernaturalismo tem substituído o andar com Deus, e há uma tal “ostentação espiritual” que pode ser verificada numa disputa para ver quem e onde tem maior capacidade de realização de sinais extraordinários, usando tal parâmetro para salientar os pretensos avanços espirituais da comunidade.
Para criar, manter e/ou aumentar tal disposição promove-se encontros, seminários, cultos específicos e treinamentos para a manifestação destes sinais e prodígios, grandemente valorizados, mas sem levar em consideração de uma conduta pautada pela palavra, conforme requerida por Deus para todo aquele que professa a fé cristã.
Não tenho visto nenhuma promoção de eventos para a promoção do fruto do Espírito na vida cristã prática.
Por mais sensacional e poderoso que seja um homem produzir feitos espirituais e sobrenaturais isto não tem apelo na Igreja atual altamente contaminada pelo hedonismo, pela busca do prazer e do sucesso, pelo supernaturalismo hedonista.
Esta expectativa era muito comum entre os pagãos, como Naamã [II Rs 5.11] e foi o único método para provar que o Deus de Israel era maior do que Baal diante de paganizados hebreus [I Rs 18.24].
Foi assim com Moisés para com os hebreus [Ex 3.13], Isaías para o rei [Is 7.14], Jesus entre os religiosos [Mt 12.38-39] e o rei Herodes [Lc 23.8].
Lembre que Jesus diz claramente que a busca por sinais e maravilhas é uma característica de uma geração má e adúltera, não dos crentes. Mas o parlatório atual diz que quanto mais crente, maiores serão os sinais, o que é uma deturpação da Palavra de Deus.
Onde houver eventos não explicáveis sempre haverá um grande número de curiosos. Talvez isto produza adesões à igreja, mas não produz vida santa, e é curioso que algumas das mais marcantes transformações de vida produzidas em encontros com Jesus não tenha havido nada de espetacular: a mulher samaritana, o publicano Zaqueu e a mulher surpreendida em adultério.
Jesus evidencia a real transformação ocorrida nestas vidas e a orientação para que vivam santamente [Jo 8.11], ao qual a Palavra se refere mais de uma vez [Lv 20.7] e Paulo faz eco com muita clareza [At 26.20] porque foi para isso que o povo de Deus foi criado [Ef 2.10].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O poder ou a realização de atos extraordinários, verdadeiros, não implica necessariamente na aprovação de Deus para a vida e os valores do coração de seus idealizadores [Mt 7.22-23]. Aliás, as palavras mais duras proferidas por Jesus foram direcionadas para aqueles que aparentavam espiritualidade, com ou sem realizações extraordinárias. A busca do conforto, poder e sucesso certamente não tem a motivação para que os tais que os buscam não possam ser chamados de “homens segundo o coração de Deus”.
Mais que qualquer realização espetacular por diversas vezes o Senhor demonstra querer ver em nós vidas santas, com renúncia ao mundanismo hedonista. Minha percepção, tanto ao olhar para a bíblia [sacerdotes egípcios - II Tm 3.8 - ou Simão, o mago - At 8.11] quanto para a história antiga e atual é que acontecimentos supernaturais podem ser feitos mentirosamente e até diabolicamente, e mesmo a ação de Deus pode ser deturpada e mal interpretada num determinado contexto religioso.
Mas tem algo que Deus aprova porque é fruto da atuação do seu Espírito: a santificação, a produção abundante do fruto deste mesmo Espírito.
Sem saudosismo devemos nos perguntar: porque a Igreja do passado parecia mais santa? Em primeiro lugar, porque ela era efetivamente mais santa, menos mundana. E ela era menos mundana porque ela possuía padrões morais mais elevados porque falava-se mais sobre santidade, ensinava-se mais e, principalmente, vivia-se mais o evangelho verdadeiro, sem modismo, sem hedonismo e sem espetacularismo artificial.

Este estilo de vida centralizado na busca de prazeres, de realização pessoal, de sucesso, de conforto e tudo o que tem marcado a vida desta neo igreja deve ser abandonado pela verdadeira Igreja de Cristo, num desejo para viver santamente, numa experiência viva com o Senhor [Hb 12:14: Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor], este sim o padrão adequado de aferição de espiritualidade da Igreja de Cristo.

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