quarta-feira, 30 de setembro de 2015

A TOLICE DO PAPA E A VITÓRIA DE CRISTO NA CRUZ

Is 8:20
Há alguns dias o cardeal Bergoglio, bispo maior da Igreja romana com o título de Francisco I, afirmou que, como homem, Jesus Cristo fracassou ao morrer na cruz, afinal, a cruz é lugar de morte, maldição, cessação de vida. Ao mesmo tempo, junto com esta afirmação, ele, recentemente, disse que ateus também podem ser salvos porque o alcance da graça de Deus é maior do que podemos pensar. Do alto da pretensa “infalibilidade papal” o bispo romano estaria com a razão? Estaria ele certo ao jogar por terra toda a base da fé cristã?
A resposta é: não, o cardeal Bergoglio não tem razão. Ele está equivocado tanto no que se refere a doutrina quanto às suas intenções. O que as Escrituras têm a nos dizer sobre esse assunto?
Nada melhor do que observarmos o que a bíblia diz a uma Igreja especialmente sugestiva neste caso, a Igreja de Cristo em Roma. Datada da metade do primeiro século, a carta de Paulo aos romanos estabelece verdades inquestionáveis para a fé cristã - verdade que somente alguém imbuído de espírito de heresia ousaria abandonar.

Porque Cristo, quando nós ainda éramos fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios. Dificilmente, alguém morreria por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém se anime a morrer. Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores. Logo, muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira. Porque, se nós, quando inimigos, fomos reconciliados com Deus mediante a morte do seu Filho, muito mais, estando já reconciliados, seremos salvos pela sua vida; e não apenas isto, mas também nos gloriamos em Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, por intermédio de quem recebemos, agora, a reconciliação.
Rm 5.6.11
Vejamos aqui o que a bíblia diz sobre a morte de Jesus.
Em primeiro lugar, a morte de Cristo não foi um fracasso (Mc 10:45) e isto deve continuar a ser anunciado pela Igreja (I Tm 2:6). A morte de Cristo foi, na verdade, uma grande vitória porque, na cruz, ele, sozinho, substituiu todos os que ele veio buscar. A cruz simboliza o nosso destino, o que era nosso por direito adquirido (Rm 6:23).
Cristo, na cruz, efetivamente pagou o preço dos nossos pecados e, longe de sentir-se derrotado, suas palavras são de vitória ao clamar “está consumado” (Jo 19.30), entregando, em seguida, seu espírito não ao inferno, mas ao seu pai celeste “nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23.46) exatamente como estava predito pelas Escrituras (Sl 31:5). Na cruz o justo morreu pelos injustos (I Pe 3:18) alegrando-se grandemente pelo fruto do penoso trabalho de sua alma (Is 53:11). Derrotado na cruz? Fracassado? Só se desprezarmos o ensino do próprio Jesus nas sagradas páginas das Escrituras.
Em segundo lugar, a morte não interrompeu a vida ou os planos de Cristo (Jo 10:18). A morte de Cristo não foi um acidente nem foi decretada pela traição de Judas (Jo 17:12), nem pelos conluios dos escribas, fariseus, herodianos e sacerdotes (Jo 8:40). É verdade que os ímpios se ajuntaram contra o ungido do Senhor (At 4:26) exatamente como havia sido dito pela bíblia que aconteceria (Sl 2:2) mas isso só aconteceu no momento que o Senhor quis que acontecesse (Jo 7:30). Cristo morreu no tempo determinado por Deus (Rm 5:6), sem esperar que deixássemos de ser o que sempre seriamos sem ele – fracos, isto é, impotentes para resolver nosso estado de perdição (Ef 2:5).
Em terceiro lugar, a morte de Cristo teve eficácia total, não foi em vão:
Na sua morte Deus provou o seu amor para conosco (v. 8). Quando as pessoas pedem alguma prova de carinho e amor para outra, certamente estão pedindo muito menos do que o que Deus fez (I Jo 4:9) e o que Cristo fez em sacrifício que foi aceito pelo Senhor (Ef 5:2). É até normal uma pessoa dar uma prova de amor por alguém que ama e que imagine que seja por ela amada, mas dar prova de amor por inimigos, só Deus é capaz de algo assim;
Na sua morte Cristo também concede justificação aos ímpios (I Co 6:11) porque ele paga os seus débitos na cruz (Cl 2:14) e um débito pago não pode ser cobrado uma segunda vez pois isso seria uma flagrante injustiça;
Na sua morte Deus nos reconcilia consigo mesmo (Cl 1:22) por intermédio de seu filho, Jesus Cristo. Deixamos de ser considerados sem Deus no mundo e passamos a ser vistos em Cristo, o que o apóstolo Paulo considera a coisa mais sublime do mundo (Fp 3:8);
Por causa da morte vitoriosa de Cristo passamos da morte para a vida (Jo 5:24) e se antes éramos merecedores da ira de Deus (Jo 3:36) agora somos considerados seus filhos, e recebemos, então, o princípio de uma nova vida que se manifestará em glória (I Jo 3:2);
Ao invés de cometermos o equívoco de consideramos a morte de Cristo na cruz um fracasso, como fez o cardeal Bergoglio, devemos olhar para os efeitos dela em nós e percebermos o quão bem sucedido ele foi, porque, por intermédio de Cristo fomos livrados da morte, recebemos vida eterna, temos paz com Deus (Rm 5:1) e podemos nos alegrar na presença do Senhor (Sl 97:12) em substituição ao terror e fuga comum aos filhos de Adão (Gn 3:10) porque o amor que ele nos concedeu e que nos leva a amá-lo (I Jo 4:18) é perfeito, e o perfeito amor lança fora toda forma de medo.
Não, Jesus não foi um fracassado – ele venceu, e crer nele é garantia de vitória (I Co 15:57). Em Cristo, mesmo enfrentando dificuldades imensas, podemos, sim, ser mais do que vencedores – mas só em Cristo (Rm 8:37), pois do contrário, mesmo que um homem ganhe o mundo inteiro, será um grande fracassado por perder o que ele tem de mais importante: a sua própria alma (Lc 9:25).
Por fim, a vitória de Cristo é a vitória que concede salvação aos pecadores que nele crerem, e isto, certamente, não inclui a salvação de ateus, porque ateus não creem. A palavra do Senhor é claríssima: a salvação é somente para os que creem em Jesus (Jo 1:11-12), sobre os demais permanece a ira de Deus (Jo 3:36) pelo fato de recusarem, obstinadamente, a graça salvadora de Deus em Cristo Jesus (Ap 21:8). E isto, nem Bergoglio, nem a Igreja de Roma pode mudar.

domingo, 27 de setembro de 2015

COMO SER IGREJA

De nada adianta estar na Igreja, frequentar a Igreja, ir na Igreja de vez em sempre e, no final, ainda não ser, verdadeiramente, Igreja. Como é isso, afinal? Estudiosos do fenômeno religioso, e tanto faz se são incrédulos ou crentes, tem denunciado um fenômeno cada vez mais comum: o fato de que, embora haja cada vez mais Igrejas, o seu ensino tem sido cada vez menos normativo, e os dogmas tem sido cada vez menos influentes nas escolhas que as pessoas tem feito naquilo que alguns pretendem chamar de “área natural” ou não religiosa da vida.
Mas será que existe mesmo esta área natural, esta esfera não religiosa na vida de um crente? Por um lado é impossível a um homem natural, não renascido, ter alguma forma de vitalidade na esfera espiritual. Ele é carnal, e, como carnal que é, não consegue discernir as coisas do Espírito, por que estas lhe são loucura.
Nossa pergunta é: “como ser Igreja?” já afirmamos que não basta ir à Igreja. Ir a Igreja é uma prática que um incrédulo pode adotar. Os mais ferrenhos inimigos de Jesus eram incrédulos, eram homens de coração endurecido e tomaram a decisão de matar a Jesus.
Já afirmamos que não basta ser membro de Igreja - não há nenhuma vantagem em ter o nome escrito no rol de membros de uma denominação e não ter o nome escrito no livro da vida. Qualquer um pode ser membro de uma igreja - mas somente os nascidos de novo são parte da Igreja de Deus, da multidão daqueles que tem seus nomes arrolados nos céus.
Como ser Igreja, então? A resposta passa pelo tornar-se discípulo de Jesus Cristo - em primeiro lugar é necessário conhecer a Cristo pela fé. Isto quer dizer entregar-lhe seus caminhos, entregar-lhe sua vontade, tê-lo (e a seu reino) como prioridade absoluta em sua vida. Significa também ser-lhe obediente em tudo - não apenas em algumas coisas, não apenas naquelas que são agradáveis ou fáceis de fazer, não apenas de vez em quando, mas em tudo, em todo o tempo. Ser Igreja significa que você tem um compromisso com o Senhor da Igreja, e que tem um compromisso com a Igreja do Senhor. Significa que você é parte de uma nova família, e que esta família lhe foi dada não pelo sangue, mas pela vontade de Deus através do Espírito Santo. Se você ainda se pergunta como ser Igreja é porque talvez ser igreja ainda não seja uma realidade em sua vida.

COMO VOCÊ PODE MOSTRAR QUE JÁ TEM A NOVA VIDA EM CRISTO - Cl 3.5-11

Já entregou seu caminho ao Senhor? Já recebeu a nova vida? Quais as evidências? Não nos esqueçamos das palavras do apóstolo Paulo: todos aqueles que ouvirem o evangelho precisam se arrepender, isto é, se entristecerem, sentirem pesar e se deixarem inclinar no sentido de corrigir o mal praticado; precisam também se converter a Deus – é inútil se converter a uma mera religiosidade, na verdade, em muitos casos a conversão é justamente para sair da mera religiosidade.
Se converter é abandonar os maus caminhos e se voltarem para Deus; e, então, convertido ao Senhor, o pecador passa a desejar e a sentir prazer na prática das boas obras que o Senhor preparou, de antemão, para que os crentes andassem nelas. Que fique claro, ninguém é salvo porque anda ou andou em boas obras – é feito crente para andar em boas obras, caminho já previamente preparado pelo Senhor (Ef 2:10).
A convocação feita é para que quem entra na Igreja o adore, mas que quem saia o faça expressando alegremente sua fé no salvador e seu conhecimento das suas virtudes (I Pe 2:9) a um mundo que está em trevas e servindo ao maligno (I Jo 5:19).
A esperança do cristão é ver a manifestação da plenitude de Cristo (Cl 1:). A pergunta é: como Cristo se manifesta em você? Vamos ser um pouco mais incisivos: Cristo tem mesmo se manifestado em você? Quais as evidências de que você já conhece a riqueza da glória de Cristo, se é que você já conhece a riqueza da glória de Cristo (Cl 1:23)?
4 Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar, então, vós também sereis manifestados com ele, em glória.
5 Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria; 6 por estas coisas é que vem a ira de Deus [sobre os filhos da desobediência].
7 Ora, nessas mesmas coisas andastes vós também, noutro tempo, quando vivíeis nelas.
8 Agora, porém, despojai-vos, igualmente, de tudo isto: ira, indignação, maldade, maledicência, linguagem obscena do vosso falar.
9 Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem com os seus feitos 10 e vos revestistes do novo homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; 11 no qual não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos.
Cl 3.5-11

INTRODUÇÃO

Conhecer a Cristo significa ver manifestar em si uma nova vida. Paulo afirma que a essência da fé é a vida de Cristo substituir a morte que outrora tomava conta do homem sem Deus. O cristão é, antes de tudo, alguém que nasceu de novo (I Pe 1.23); é alguém que tem recebido um novo princípio de vida (Gl 2.20); é alguém que parte da infância (I Pe 2.2) até atingir a maturidade espiritual (Ef 4.13). Neste processo esse alguém tem que ir deixando as coisas de criança para agir com a sobriedade que é própria de um adulto (I Co 13.11).
O nosso ponto de investigação é: como você pode ver, ou como outros podem ver de maneira prática, se a nova vida, a vida de Cristo e em Cristo, tem sido manifesta em você?
É verdade que a fé é uma coisa intrínseca, pessoal, interna (Rm 10.9). Não existe nenhum meio de saber a quantidade de fé que alguém possui, todavia, é impossível existir a fé sem que esta se manifeste, embora a iniquidade possa ser disfarçada através da hipocrisia (e esta é a essência das obras de satanás, isto é, ele tenta fazer com que o falso pareça verdadeiro) a verdadeira fé não pode ser ocultada (Mt 5.14).
Tiago afirma que a fé pode ser conhecida por intermédio daquilo que fazemos – os homens podem ver a fé dos cristãos à medida em que estes agem como espelhos da graça de Cristo (Tg 2.17-18) e os homens espirituais demonstram a sua espiritualidade produzindo frutos de justiça (Mt 7.20) – é impossível alguém ser habitação do Espírito sem produzir o fruto da morada deste mesmo Espírito (Gl 5:22-23).
Talvez eu esteja sendo repetitivo, mas, eu tenho que perguntar ao menos mais uma vez: a vida de Cristo, no Espírito, tem se manifestado em você? Como? O que a Escritura diz a este respeito? O que a carta de Paulo diz aos colossenses, àqueles que eram escravos, àqueles pertenciam a um império de trevas e foram libertos por Cristo, o libertador inigualável? Nosso ponto de partida é que Cristo vai se manifestar, e quem estiver nele, quem tiver a vida dele, vai se manifestar – como nós podemos ver evidências desta manifestação naqueles que dizem já ter a vida de Cristo?

O QUE FAZER COM A NATUREZA TERRENA: MORTIFICAÇÃO

Para você viver a nova vida em Cristo é absolutamente necessário que você faça morrer a velha natureza. Paulo nos diz para fazer morrer ou deixar necrosar, isto é, nada fazer para manter viva o que já está morrendo – a natureza terrena, inclinada para as coisas da terra, para as coisas mundanas. Sabemos que esta natureza carnal luta contra a nova natureza, contra a formação de uma nova inclinação, de novos hábitos. Os velhos hábitos ainda estão presentes mesmo naquele que foi resgatado por Cristo da escravidão ao diabo – e eles não querem perder seu lugar, não querem perder seus escravos. A natureza carnal ainda te quer como um escravo, como um autômato a desobedecer a Deus (Gl 5.17).
Paulo não fala de uma natureza terrena generalizada – quando ele fala de si, ela não fala hipoteticamente ou de um homem genérico (Rm 7:19-20). Da mesma maneira que a carne era um problema para Paulo, também é um problema para nós. E da mesma maneira que mortificar a carne era um dever para Paulo, também é um dever para nós. É impossível alguém viver espiritualmente se não fizer mortificar, isto é, se não parar de alimentar e passar a combater e fazer perecer os apetites carnais porque elas fazem guerra contra a alma (I Pe 2:11). Para que não digamos que não sabemos que paixões são essas, Paulo nos dá uma pequena lista, embora haja outras até mais extensas na bíblia:
i.           Prostituição – a impureza sexual, a pornografia, a entrega do que é de Cristo para fins ilícitos (I Co 6:15);
ii.         Impureza – a vida luxuriosa, um estilo de vida caracterizado pela ausência de santidade, de desconsideração para com a exortação do Senhor de que seu povo deve ser santo (Lv 20:7);
iii.       Paixão lasciva – sentimentos sexuais impuros, descontrolados, que leva a ações irracionais, como o homossexualismo (Rm 1.26);
iv.       Desejo maligno – interesse e vontade de possuir ou praticar algo proibido, algo que não deve ser, uma coisa que é intrinsecamente errada e má, como poderíamos classificar a necrofilia, a pedofilia;
v.       Avareza, que Paulo classifica como idolatria. Ele não diz que é semelhante à idolatria, mas que é uma forma de idolatria, isto é, qualquer coisa que é colocada no coração, onde somente Deus deveria estar (Mt 6:24). O cobiçoso nunca fica satisfeito, sempre quer mais – e não consegue satisfação nem mesmo em Deus, o que é algo bem estranho para se encontrar em um crente que deve pensar nas coisas do alto (Cl 3:2).

QUAL A RECOMPENSA DA NATUREZA TERRENA: A IRA DE DEUS

Para você viver a nova vida em Cristo é absolutamente necessário que você faça morrer a velha natureza e que você se lembre que a natureza terrena, a carnalidade, é alvo da ira de Deus. Após dar uma lista resumida das obras más que podem ser praticadas pela natureza carnal, motivadas por um coração corrupto (Jr 17:9) Paulo diz que estas coisas não apenas não podem herdar o reino de Deus como, pior ainda, sobre estas coisas Deus estabelece a sua indignação punitiva. O escritor aos hebreus adverte estar sob a ira de Deus é uma coisa terrível (Hb 10.31).
Mas não é nosso propósito fazer nenhuma espécie de terrorismo espiritual – todavia, é minha obrigação advertir você, pois a Palavra de Deus afirma que Deus não deixará de cumprir a sua Palavra, tanto para bênção quanto para condenação. E sobre aqueles que preferirem ser filhos de belial, vivendo na vaidade de seus próprios pensamentos (Ef 4:17) ao invés de serem tornados seus filhos e alvos do seu amor redentor (Rm 5:8). A ira de Deus vem apenas sobre os filhos da desobediência. Esqueça a tolologia que afirma que você pode parar de sofrer agora se você passar a ir a alguma Igreja. Acreditar que a ira de Deus se expressa em uma dor de cabeça ou na perda de uma função é não ter a menor ideia do real significado da desobediência à vontade de Deus. Por causa da desobediência, mesmo que bem intencionada, Saul foi rejeitado como rei de Israel (I Sm 15:23).
Alguns dizem: “Ah, mas eu estou na Igreja, eu congrego, eu ajudo, eu...”. Os fariseus também. Eles também iam ao templo, também ofertavam, também faziam sacrifícios... os fariseus tinham um padrão de justiça sob quaisquer critérios muito mais elevado do que o que mesmo a Igreja mais conservadora possui. Às vezes insistimos afirmando que “eles”, “os outros”, “os que estão no mundo” e outros termos semelhantes são os alvos da ira de Deus. Mas Paulo tinha uma expressão para definir a solidariedade da raça humana, isto é, o fato de todos estarem exatamente na mesma situação (Rm 11:32). Antes que nós ousemos começar a olhar para o outro, o chamado das Escrituras é para que nós olhemos para nós mesmos. Aos colossenses Paulo fala dos filhos da desobediência e acrescenta: os que agora creem também praticavam as mesmas coisas.
A questão é que estas coisas deveriam fazer parte do passado do crente – as obras infrutíferas das trevas (Ef 5:11) deveriam ter ficado no passado e serem objeto de reprovação por parte dos filhos de Deus. Mas é isto o que tem acontecido? Sob o argumento de pertencerem à cultura crentes tem aderido ao pecado – não o reprovam, o praticam e até o divulgam. Mas não é cultura? Não nos deixemos enganar. A cultura é formada pelas inclinações do coração do homem – e por isso está indelevelmente contaminada pelo pecado. Mas a cultura nunca define o que é pecado – o máximo a que ela pode chegar é afirmar o que é socialmente aceito. É Deus quem define, nas Escrituras, o que é pecado.

COMO FAZER MORRER A NATUREZA TERRENA: DESPOJAMENTO

A vontade de Deus é que o novo homem, nascido segundo Deus, nascido pela ação do Espírito em Cristo Jesus viva em novidade de vida. Como? A resposta é: fazendo morrer o velho homem, mortificando-o, retirando dele o seu vigor. Paulo usa uma linguagem militar ao falar de despojamento – que era o que se fazia com um soldado derrotado, tirando-lhes as armas, colete, capacete e tudo o mais. Mas não era apenas retirar-lhe seus apetrechos – ia além disso, tratava-se também de impedir o acesso, colocando fora do alcance, o mais longe possível.
O que Paulo está dizendo é que as práticas do velho homem devem ser colocadas para bem longe do novo homem. Não apenas algumas – mas todas. Na linguagem de Paulo cada uma delas deve ser rejeitada, todas e cada uma delas deve ser lançada para longe. Além da pequena lista que Paulo já mencionara, ele nos dá mais algumas coisas que devem ser objeto desta mortificação, deste despojamento:
i.      Ira – sentimento que busca a destruição do próximo, em flagrante contradição com o mandamento do Senhor de amar ao próximo (Jo 15:12);
ii.    Indignação – sentimento de revolta descontrolada contra algo ou alguém – as paixões são exatamente o contrário do fruto do Espírito, que inclui o domínio próprio (Pv 16:32);
iii.  Maldade – ação deliberada para ferir ou prejudicar o próximo, contrário à bondade que é fruto do Espírito, expressão da formação do caráter de Deus no convertido (Rm 15:2);
iv.  Maledicência – maneira de falar que produz frutos maus ou que machuca aquele que ouve ou alguém de quem se fala. Ao invés de usar o dom da fala para abençoar, usa-se para trazer males;
v.    Linguagem obscena – uso de palavras de baixo nível, maneira suja de falar que sai de lábios que deveriam apenas confessar o Senhor Jesus como seu Senhor e salvador. Jesus diz que o que sai do coração do homem é que o contamina (Mc 7.20);
vi.  Mentira – o abandono da verdade (e Jesus é a verdade), falar falsidade de maneira deliberada para alguém ou sobre algo para evitar algum dissabor, se beneficiar ou para prejudicar-se mutuamente.
Estas coisas se tornam pesos que atrapalham a carreira proposta. A Palavra chama os crentes a se desembaraçar de todo o peso e do pecado que tenazmente os assedia (Hb 12:1). Estas coisas tem que ser abandonadas porque quem nasceu de novo se despiu, já se despojou, já não pertence mais à antiga natureza com seus feitos, com aquelas realizações que, por vergonhosas que são, nem deveriam ser mencionadas, quanto mais praticadas (II Co 4:2). Para fazer a velha natureza morrer você precisa se despojar dela, precisa jogar para longe aquilo que não deve sequer ser mencionado.

COMO VIVER ESTA NOVA VIDA: PELA FÉ

É suficiente não fazer o mal? A resposta da bíblia é não. Não basta não fazer o mal, não basta deixar de fazer o mal, é preciso, também, praticar o que é bom. O Senhor ordenou que façamos o que é certo. O arrependimento traz o abandono das más obras para a prática do bem (Ef 4:28), que Deus preparou de antemão para que andássemos nelas (Ef 2:10). Se arrependimento leva a abandonar as más obras, a conversão leva a prática de obras dignas de arrependimento (At 26:20).
Assim como é necessário fazer morrer a natureza terrena, despojando-se da carnalidade, também é necessário revestir-se do novo homem, para que ele viesse a ser na prática aquilo que ele já fora judicialmente declarado ser em Cristo Jesus. O verbo (particípio presente passivo) indica que este revestimento é uma realidade constante, contínua e que vem de cima, de modo que a imagem do filho vai sendo formada continuamente pelo conhecimento cada vez mais íntimo do seu Senhor e salvador. Paulo chama este conhecimento de “pleno” que não tem o sentido de saber tudo, mas de ser correto, preciso, verdadeiro. É um conhecimento que vem da experiência, de andar com Cristo e segundo Cristo, que molda a maneira de compreender as coisas (Cl 2:8) e, também, de sentir (Rm 15:5).
Assim como Deus encerrou todos os homens, de todos os lugares da terra, na mesma condenação por causa de sua desobediência, assim também, ao serem refeitos, todos são colocados numa mesma relação com Deus – pelo conhecimento do redentor aqueles que viviam sem Deus no mundo e estranhos às promessas da aliança (Ef 2:12) agora todos são colocados em uma mesma relação entre si e com Deus.
Se todos pecaram, se todos careciam da glória de Deus (Rm 3:23), todos foram chamados ao mesmo arrependimento por causa do grande amor com que Deus os amou (Ef 2:4-5) e todos foram chamados para a mesma obediência (I Pe 1:2 - eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo, graça e paz vos sejam multiplicadas) através das obras que o Senhor preparou para seu povo (Ef 2:10). Assim, não há distinção sobre o que o Senhor exige de cada um de nós. Não importa a origem étnica, social ou sexual – a exigência é a mesma, porque o Espírito é o mesmo – e aquele que o salvou é o mesmo salvador inigualável que Paulo apresenta no começo da carta.
Que garantia nós podemos ter desta nova vida? A resposta é simples: quem está em Cristo sabe que foi feito nova criatura (II Co 5:17) e não lhe resta alternativa senão andar com Cristo, viver a vida de Cristo (Gl 2:20) porque tem um novo princípio de vida e sabe que seu Senhor não o abandona, mas está com ele todo o tempo, até a consumação do século (Mt 28:20).
Este novo homem foi refeito, recriado à imagem de Cristo. E se nos perguntarmos, então, o que esperar deste novo homem – a resposta só pode ser: que ele viva segundo aquele que o recriou, que ele viva em novidade de vida, que viva para glorificar o seu Senhor com a nova vida que recebeu. Paulo faz um apanhado das principais divisões étnicas, religiosas, culturais e sociais de seu tempo para dizer uma verdade que nenhum daqueles grupos partilhava. Era uma verdade nova e revolucionária, a mensagem que não há distinção nenhuma à partir do momento em que qualquer membro destes grupos se encontram em Cristo. Cristo é tudo – em todos. O que faltava ao grego e ao judeu é suprido – a justiça de Cristo. O que faltava ao circunciso e ao incircunciso é cumprido – a circuncisão do coração segundo Cristo. O que faltava aos bárbaros em termos de cultura é resolvido pelo conhecimento de Cristo e todos são libertos em Cristo Jesus.
Não é por nascimento que você poderá se despojar do velho homem e suas práticas e se revestir do novo homem. Deixe eu ir um pouco mais além – sua religiosidade não fará de você um novo homem, não este novo segundo Cristo. Sua cultura não te dará o conhecimento de Deus que conduz à salvação – isso só o Espírito Santo pode dar. Nem todas as escolhas que você poderia fazer ao longo da vida farão de você alguém verdadeiramente livre se não for liberto pela verdade de Deus, Cristo (Jo 8:32).
A nossa pergunta inicial era como pode alguém que creu em Cristo, como Cornélio dar evidências desta sua nova fé? Paulo faz uma série de admoestações que exigem renúncia aos desejos da própria carne (Rm 7:18). A guerra está declarada – e o campo de batalha é sua vida. Mas você não foi largado sozinho. Seu libertador está presente, te sustentando e capacitando. Quando você perceber que não consegue vencer sozinho, você clama ao seu Senhor – porque a sua vitória está nele (Rm 7:24) e ele responde com graça (Rm 7:25).  O que você deve fazer? Confiar em Cristo. Negar-se a atender os reclamos da carne, porque, ainda que a carne realmente seja fraca, isto é, a resistência ao pecado é limitada, pecado é veneno e não vitamina para a carne. O que sua alma precisa é do auxílio do Espírito Santo – e este Deus dá liberalmente (Rm 8:15).

E AGORA, O QUE O NOVO HOMEM DEVE FAZER

Há algo que não deve ser esquecido – não é o braço do homem, não é a vontade do homem que faz o novo homem. É verdade que o Senhor renova a mente (I Co 2:16), o que tem reflexo imediato na disposição para pensar e agir diferente do que anteriormente era o padrão (Rm 12:2) e dá um novo coração e um novo espírito àqueles a quem ele transforma por sua graça (Ez 11:19) mas não somos nós quem produzimos. Não importa o quanto leias a bíblia, nem o quanto ore, nem quanto contribua. Não importa se jejue uma ou duas vezes por semana. Não importa o quanto você vá à Igreja e o tato que você trabalhe nela – se você não nasceu de novo e o novo homem não pode ser visto no seu viver então tudo não passa ativismo.

Como o novo homem pode ser visto, então? Pelo abandono das más obras, pela rejeição das obras da carne, pela entrega total e pessoal, devocional e espiritual ao Senhor – e, acima de tudo, com a certeza de que o velho homem tem que ser deixado para trás e, embora sem ter, ainda, atingido a perfeição, prosseguir sempre para o alvo da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus. Esta é a minha experiência – e esta é a experiência de todo aquele que nasceu de novo (Fp 3:12-14).

terça-feira, 22 de setembro de 2015

ARRASTÕES – A CULTURA DO LIXO E A CULTURA DO LYNCH

O Rio de Janeiro está um caos. Tem governantes incompetentes que herdaram acordos político-econômicos com a criminalidade, incentivado por uma cultura que denomino de cultura do lixo, isto é, a glamourização da falta de glamour das favelas, com becos, lixo, esgotos a céu aberto, casebres e, ainda mais, armas e drogas com morros controlados por bandidos cada vez mais ousados. As favelas dominadas por traficantes se tornaram um estado bandido dentro do estado, onde a simples presença das forças policiais estatais é vista como uma invasão – veja que absurdo, a presença do estado em uma área do estado brasileiro é vista como uma invasão, como se o estado não tivesse o direito de estar presente em alguns territórios brasileiros.
É a cultura do está dominado – e, de fato, está tudo dominado, dominado pelo crime, dominado pela bandidagem, dominado pela força das armas e, pior, com a população incentivada a permanecer endeusando a falta de educação, a sobrevivência sem segurança, sem educação formal, sem um bom sistema de saúde… lamentavelmente até quem deveria ser instrumento de formação, como os meios de comunicação, acaba endeusando esta situação como uma falsa vanguarda cultural (vide, por exemplo, programas como “Esquenta”, apresentada pela global Regina Casé, ou o Programa do Ratinho) e o resultado disso é que as crianças se tornam adolescentes e muitos nem chegam à juventude achando normal se apropriar do que desejam não pelo trabalho, mas pela força, tirando de quem tem – e, se alguém ousar resistir, a violência é o caminho natural.
Como resultado disso é que ninguém está à salvo em lugar algum do Rio de Janeiro. Nas ruas, nas praças, na praia… bandos de bandidos, sempre muito jovens, bem treinados e protegidos pelo ECA (eca!) perambulam pelas ruas e praticam crimes à luz do dia, diante de câmaras de TV e até mesmo diante da polícia (cada vez menos eficiente e cujas ações bem realizadas são ofuscadas por erros grosseiros e violência desnecessária quando não criminosa, como no caso do caseiro Francenildo). A TV noticia, e o Brasil, que já está em crise, acaba reconhecido internacionalmente pela qualidade de seus ladrões (um bando de moleques) e o desgoverno generalizado (as forças estatais que se mostram absolutamente incompetentes tanto na prevenção quanto na repressão e na solução da criminalidade).
Se a polícia não consegue resolver – e o estado formal, governo federal, estadual e municipal se dizem de mãos atadas, a população começa buscando uma solução –no passado foram os grupos paramilitares, mas isto engendrou a formação de novos grupos e novos tipos de criminalidade. Já é possível encontrar uma proposta reativa: a própria população começar ela mesma a fazer justiça com as suas próprias mãos. Já tivemos alguns casos, e acredito que muitos outros começarão a aparecer na mídia. Quando um crime estiver acontecendo a população agir para deter os criminosos – e, eventualmente, punir os mesmos.
E isto é um perigo – a cultura de justiçamento popular, ou linchamento. Este termo surgiu nos Estados Unidos no fim do sec. XVIII e início do sec. XIX. Segundo o que é popularmente estabelecido, a origem da palavra pode ser encontrada no coronel Charles Lynch, que adotava a prática de enforcar publicamente todos os que se declarassem favoráveis à manutenção dos Estados Independentes como colônia britânica, durante a oitava década do séc. XVIII, período da guerra da independência dos Estados Unidos. Outros atribuem a palavra ao capitão William Lynch (1742-1820) que mantinha um comitê para manutenção da ordem em Pittsylvania, Virgínia, no mesmo período (1780). Linchamento era, portanto, a execução pública de pessoas publicamente indesejáveis sem o devido processo judicial.
Já tive a tristeza de conhecer de muito perto casos de linchamento, não perto o suficiente para assistir, mas para ver seus resultados. Geralmente isto acontece no meio da população mais pobre, quando a prática de crimes considerados inaceitáveis pela sociedade se tornam recorrentes – e com o tempo estas ações podem acontecer até mesmo em casos menos brutais, como, por exemplo, um acidente de trânsito. Linchamentos acontecem onde o estado é ineficiente ou ausente, com baixa qualidade de serviços como os mencionados anteriormente. Não é incomum que os linchamentos ocorram onde a população não acredita no poder da polícia (e muitas vezes com boas razões) e, desamparada, resolve fazer justiça com as próprias mãos, o que é proibido garantindo ao estado o direito exclusivo como garantidor da lei, da ordem e da justiça – o problema é que o estado não tem feito isso, especialmente nas regiões mais pobres, como as favelas e rincões interioranos.
Neste quadro de caos instaurado, moradores da cidade do Rio de Janeiro começam a se indignar contra a ineficiência estatal. Moradores de Copacabana, Ipanema, Leblon e Botafogo, bairros assolados pelos arrastões, cercaram um ônibus cheio de adolescentes e agrediram alguns ocupantes acusados de serem ladrões. Síndicos tem sido orientados a não fornecerem à polícia vídeos de eventuais ocorrências flagradas pelas câmeras dos prédios aos seus cuidados – e a ameaça é de atirar para matar.
Há uma nova cultura surgindo – o fenômeno do linchamento reativo em um momento de transtorno está dando lugar à promessa de linchamento programado, ativo, embora, evidentemente, defensivo uma vez que o Estado é incapaz de cumprir seu papel dando à segurança o que é sua função exclusiva, promete fazer, cobra (e muito caro) por isso mas não entrega.
É uma cultura perigosa, e os governantes precisam acordar imediatamente para o perigo que isto representa. Não adianta desocupar morros dando aos bandidos rota de fuga, como no morro do Alemão. Os bandidos mudaram de endereço, a criminalidade continuou alta, e muitos logo voltaram e as revolucionarias UPPs tem sido atacadas violentamente quando não se tornam em postos de segurança – e servem de defesa dos bandidos locais contra invasores. Não adianta dar segurança em períodos limitados, como campeonatos de futebol ou olimpíadas. Os visitantes são bem vindos, mas não são mais importantes que os brasileiros que passam anos oprimidos entre um estado parasita e bandidos cada vez mais ousados, mais jovens e mais violentos.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

IGREJA, IR OU SER

Qual é o nosso dilema? Qual a nossa grande dificuldade afinal? Porque conseguimos trazer tão poucas pessoas para as nossas igrejas nos dias de culto, especialmente quando não são eventos festivos - e até em eventos festivos vemos as igrejas relativamente vazias?
Para complicar um pouco mais a nossa equação - porque os próprios crentes tem tido tantas dificuldades para irem à Igreja? Podemos assinalar um exemplo recente - em uma escola bíblica, após a retirada de um bom número de matriculados restaram apenas 100, e destes 70 estavam ausentes.
Pensemos um pouco mais - se os próprios membros da Igreja tem tido dificuldades para irem à Igreja, o que poderíamos esperar dos que não são membros? O que esperar daqueles que não assumiram um compromisso solene diante de Deus e formal diante da comunidade de contribuírem para a manutenção da Igreja com seus bens, dons, talentos e presença?
Por favor não coloquem a culpa nas chuvas. Já faz um tempão que ela não dava o ar da sua graça entre nós. Nem na falta de tempo. Nem no grande número de ocupações. Provavelmente há pessoas mais ocupadas que você que acham tempo para os seus exercícios devocionais, para perseverarem no templo junto com os demais irmãos.
Talvez o nosso problema, no fundo, não seja ir à Igreja. Acredito que o problema seja mais profundo, mais existencial, mais espiritual mesmo. Talvez o problema seja indisposição para ser igreja.
Em momento algum as Escrituras nos deixam pensar que ser Igreja é apenas frequentar a Igreja. Sacerdotes, escribas, fariseus, saduceus frequentavam o templo e provavelmente o faziam mais do que o próprio Jesus. Havia uma multidão que viajara dezenas, centenas de quilômetros para estar no templo e, diante do Senhor da glória, só sabiam gritar: crucifica-o!
Não é de admirar que as multidões não queiram frequentar as nossas igrejas. A resposta pode ser pelo fato de os membros simplesmente não estão sendo Igreja do Senhor, corpo vivo de Cristo, edifício santo edificado para sua glória, povo de propriedade exclusiva sua, que ele chamou das trevas para proclamarem as virtudes da sua maravilhosa luz.
Não existe o dilema ir na Igreja ou ser Igreja. Quem é Igreja não se furta de ir à Igreja.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

A ESCATOLOGIA PAULINA - Ridderbos e Schreiner

A revelação da justiça de Deus, a nova vida dos crentes, o dom do Espírito, a Igreja como o novo povo de Deus e corpo de Cristo devem ser entendidos à luz do tema central do cumprimento das profecias a respeito do redentor.
Do judaísmo para o cristianismo há uma mudança intrínseca – para o judaísmo o ponto central do tempo, a plenitude dos tempos está situada num futuro glorioso, em que um novo mundo seria inaugurado com a vinda do Messias. O cristianismo não perde de vista o mundo novo e restaurado, mas coloca um fato já ocorrido como pontual e fundamental – o momento decisivo da manifestação de Cristo sobre a terra, sua morte e ressurreição que dão origem ao tempo favorável do Senhor.
Todavia esta redenção cumprida em Cristo e o grande dia da salvação inaugurado com sua morte e exaltação ainda possui um caráter apenas inicial e provisório. Não significam o fim da expectativa redentiva nem torna a esperança cristã supérflua porque tanto os cristãos aguardam a glória que há de ser revelada como a criação aguarda ser redimida com esta revelação.
O “já” e o “ainda não” são colocados em conjunto pois a revelação da justiça de Deus garante a esperança da gloria de Deus mas não significa que ela já tenha sido obtida no tempo presente, como atesta o fato de que a indicação redentora de haver morrido e ressuscitado com Cristo ainda exige a necessidade de lutar contra o pecado.
Mesmo a presença do Espírito Santo, evidência da libertação em Cristo da escravidão da lei e do pecado ainda é apenas o penhor e as primícias (símbolo da própria redenção) da redenção perfeita. Em Cristo o dia da salvação surgiu mas isto não significa o fim da expectativa redentora, embora a torne mais intensa e indubitável. Esta expectativa escatológica é um tema central e poderoso da pregação paulina sobre aguardar dos céus a Jesus que livra da ira vindoura e a manifestação da gloria do grande Deus e salvador Jesus Cristo.
Paulo chama a Igreja à santidade e irrepreensibilidade porque esta Igreja espera encontrar-se sem macula na presença do Senhor em sua vinda – é por causa deste dia que os crentes devem lançar fora todas as obras das trevas e revestir-se das armas da luz porque a salvação está mais próxima do que se acreditava no principio.
Esta expectativa, além de motivo de santificação, é também fonte e base de consolo na presente aflição, termo que define a última fase do mundo presente antes da vinda de Cristo, de modo que a revelação do Senhor Jesus nos céus também significa descanso para aqueles que agora vivem em tribulação – e por causa desta esperança a Igreja pode gloriar-se nessa tribulação até que Cristo se manifeste em gloria – e esta é a gloria da própria Igreja.
Estudiosos levantam a questão sobre a temporalidade da expectativa de Paulo, se ele acreditava que a volta do Senhor se daria ainda em seus dias, transparecendo a ideia de que ele não esperava que a volta de Cristo se desse num futuro distante, por isso a Igreja não deve apegar-se à vida presente e ser santa tendo em vista a proximidade do dia do Senhor. A brevidade do tempo e a proximidade da salvação é uma questão de grande relevância.
Alguns supõem que Paulo imaginava que ele próprio ainda estaria vivo para ver a volta de Cristo despertando esta expectativa na Igreja, mas isso não se sustenta pelo fato de que a possibilidade de morte e até esta expectativa é apresentada de maneira explícita. Todavia, deve-se entender que é possível que Paulo considerasse a possibilidade de ver a volta de Cristo, mas esta não era um sustentáculo de sua fé – ele sabia que Cristo se manifestaria gloriosamente, e que deveria viver aguardando esta manifestação, mas não deveria considerar que isso deveria inevitavelmente acontecer.
Paulo usa o tempo verbal perfeito e o futuro na escatologia, o que demonstra que ele não deriva a proximidade da vinda de Cristo de qualquer conhecimento especial ou percepção sobre o tempo dentro do qual esta vinda deve ser esperada mas do significado do tempo escatológico da redenção no qual já se entrou com o primeiro advento de Cristo, e Paulo relaciona estes dois eventos de maneira imediata pois para ele o dia já surgiu, mas isto em nada desvaloriza a vida presente, pelo contrário, tendo em vista que os dias são maus a Igreja deve aproveitar ao máximo as oportunidades que lhe são dadas.
A consciência de que a vinda do Senhor está próxima não tem um significado negativo, mas positivo para a vida no tempo presente, não torna a responsabilidade para essa vida relativa, mas sim a eleva. O “perto está” não envolve uma questão de importância da duração do período intermediário, mas o caráter inseparável do tempo futuro e do tempo perfeito.
O que acontece com os cristãos que morreram antes da volta de Cristo, isto é, qual o estado dos cristãos neste lapso de tempo entre a sua morte e o advento do redentor? Certamente o termo ‘dormir’ não se refere a uma espécie de sono no qual cessa toda a atividade e consciência, retomados na ressurreição. Não é possível encontrar em Paulo nada que autorize a falar de um estado intermediário, pois “estar com Cristo” denotaria um estado imediatamente após a morte, glorificado e coparticipante da gloria de Cristo após ser “ser despido” deste corpo de humilhação para receber nova morada, um corpo glorificado que compartilha da gloria de Deus.
Assim, não há dúvida que, para Paulo, após a morte os crentes estarão imediatamente com o Senhor, a questão que permanece é qual o significado desta realidade e qual o lugar que ocupa na salvação como um todo proclamada por Paulo?
Esta realidade não recebe explicação detalhada por parte de Paulo, nem essa expectativa tem uma existência independente mas é absorvida pela esperança da ressurreição e sem ela não existiria – para Paulo, sem a ressurreição não há qualquer esperança para os crentes que falecerem, com a ressalva de que os crentes que morreram em Cristo podem contar com a continuidade do compromisso com Cristo por terem sido incluídos nele e serem coparticipantes dele.
Este compromisso não deixa de existir após a morte. O que pode ser dito é que estar em Cristo depois da morte trata-se de uma existência oculta em Cristo no céu, que um dia será revelada com ele – não estará no corpo terrestre e, portanto, livre de toda imperfeição, pecado e aflição. A morte é, então, lucro mas ainda não é estar no corpo glorificado.
Não se deve imaginar o ‘estar em Cristo’ definido por Paulo como uma mera compensação ou cancelamento das fraquezas, ignorâncias e misérias da terra ou alguma espécie Deus e solução às injustiças do mundo atual – ainda que estas coisas, de fato, não estejam presentes. Elas são suportadas aqui, com a certeza decorrente da fé que serão superadas na manifestação gloriosa do redentor – esta é a causa da esperança dos crentes e do incentivo para que vivam piedosamente porque mesmo seu sofrimento é motivo de gloria, sofrer por Cristo é uma dádiva do próprio Cristo, viver nele e com ele é a recompensa dos fiéis.
Nas cartas aos tessalonicenses Paulo fala da volta do Senhor como algo repentino, todavia, precedido de alguns sinais, o que demonstra que a volta do Senhor tem um tempo determinado com respeito ao fim dos tempos. Assim como houve a plenitude dos tempos para a manifestação do Messias, assim também a volta do Senhor tem um tempo especifico, determinado, marcado por uma sequencia de acontecimentos que se cumprirão, todavia, tais informações foram dadas não para que a Igreja faça cálculos que tem se mostrado equivocados, mas para que viva no presente século vigilante e sobriamente.
Paulo menciona três sinais que aconteceriam ‘primeiro’, isto é, que convém que aconteçam, por vontade de Deus, antes que o Senhor volte. O primeiro dado apresentado é a figura do iníquo, que se manifestará em ocasião própria mas que, segundo Paulo, ainda permanecia oculto. Este homem da iniquidade concentraria em sua figura o poder inimigo de Deus, não sendo simplesmente e preeminentemente um indivíduo ímpio, mas que nele a humanidade hostil a Deus é revelada de modo definitivo e escatológico.
Assim como Paulo faz o contraste entre Adão e Cristo como o primeiro e segundo homem, como representante de duas ordens diferentes de homens, também na figura do homem de iniquidade (claramente identificado como uma pessoa, apesar de menções a pseudoprofetas, pseudocristos, muitos anticristos) encontra-se claramente o correspondente escatológico final do homem Jesus Cristo.
O anticristo existe por que Cristo existe – ele existe para lutar contra Cristo e contra tudo o que Cristo significa no mundo. A apostasia decorrente é encontrada sempre em relação direta com a fé em Cristo. A operação do erro é uma oposição deliberada contra a verdade, que é Cristo.
Mas Paulo faz a ressalva que o homem da iniquidade ainda não havia aparecido, e nem mesmo é possível declarar se sua explanação se referia apenas ao último ou ao verdadeiro anticristo, mas, ao mesmo tempo, Paulo não foge à questão de que ele está ligado a todo o poder e disposição hostis a Cristo na história, pois o mistério da iniquidade já está operando em ligação direta com a revelação do homem de iniquidade.
É certo também que o anticristo sofre um processo de detenção, de refreamento. Quem o que o detém? As sugestões levantadas de que fosse uma forma de governo não se mostraram sustentáveis, bem como a de que fosse o evangelho ou o próprio Paulo com seu ministério missionário, todavia pode-se afirmar que o que refreia o anticristo é simplesmente o plano de Deus que a ele se aplica, que o impede de irromper com sua iniquidade satânica antes do tempo que o próprio Deus determinou.
Paulo não faz alusão a fenômenos, pessoas ou acontecimentos históricos específicos, mas a fatores sobrenaturais que determinam o refreamento das últimas coisas. No tempo do iníquo (seu aparecimento será favorecido pelo ambiente apóstata e sua presença fermentará a apostasia) também se revelará grande apostasia, pois muitos se deixarão enganar e seduzir por ele. Esta apostasia é algo ainda não manifesto nos dias de Paulo, que apropriadamente pode ser chamada de mistério.
As cartas de Paulo geralmente não são exposições sistemáticas sobre algum tema, mas um esclarecimento quanto ao grande acontecimento do fim a partir de um ponto de vista específico com referências ao que foi dito em outras epístolas ou ao que a Igreja já sabe ou deveria saber. Paulo fala da vinda do Senhor como a manifestação esperada de Cristo, como a revelação definitiva e final de sua gloria, manifestando-se solene e gloriosamente, após um período anterior de caráter oculto quando, finalmente, chegou o dia do Senhor, tomando vingança contra os que não conhecem a Deus nem obedeceram ao evangelho do Senhor, sendo, pois separados dos crentes e banidos da face do Senhor e da glória do seu poder.
Quanto aos crentes, todos eles estarão presentes neste momento glorioso, no instante da manifestação de Cristo pela qual esperaram tão intensamente. Tanto vivos e mortos experimentarão este momento de glória – com a ressurreição dos que estiverem mortos e o encontro dos vivos com o Senhor nos céus.
O significado redentor da vinda de Cristo para a Igreja encontra-se no fato de que, imediatamente com a manifestação de Cristo os crentes que adormeceram irão ressuscitar de imediato aqueles que estiverem vivos serão transformados. A ressurreição é colocada em vários contextos mas sempre mencionada como um ponto central da fé cristã, explicada pela realidade da ressurreição de Cristo que é o centro da proclamação paulina.
Na medida em que os crentes se veem como coparticipantes da ressurreição de Cristo, já operante neles, com mais fervor desejarão ver sua plena concretização na ressurreição dos mortos. Neste sentido Cristo é considerado as primícias dos que dormem, não no simples sentido de quem vem em primeiro lugar, mas no de representar o todo da colheita que ainda é esperada, e, ao mesmo tempo, aprova de que a colheita é chegada, isto é, é afirmado que o principio que Cristo criou é perfeitamente decisivo e ele abriu o caminho para os que vem após ele, isto é, nele.
Sua ressurreição e a de seu povo formam uma unidade indissolúvel. Os mortos em Cristo ressuscitarão e em Cristo, e é em virtude de sua unidade corporativa com Cristo que aqueles que morrem com ele serão ressuscitados por ele. Neste pertencer a Cristo (que não sofre solução de continuidade com a morte) encontra-se a identidade e a continuidade que não é (nem temporariamente) suspensa pela morte.
Os que morreram em Cristo serão ressuscitados incorruptíveis (isto é, num novo corpo) e os que não morrerem serão transformados (receberão uma nova natureza), revestindo-se de incorruptibilidade e o mortal será revestido de imortalidade. Paulo refere-se à vida futura como ser levantado, como a glorificação do corpo – neste caso, ele não está se referindo à carne (de natureza temporal) ou carnal (de natureza pecaminosa). Corpo tipifica o homem como ele foi criado por Deus, para a glória de Deus e para seu serviço – como é ressurreto dentre os mortos e salvo por Deus, porque o corpo presente (carne e sangue) não pode herdar o reino de Deus. No entanto, o que é ressurreto e transformado ainda é chamado de corpo.
O termo corpo não deve ser visto apenas como a ‘parte’ material do homem, em contraste com a ‘alma’ ou ‘espírito’ como na visão dicotômica grega. Deve ser visto, sim, como o modo de existência humana como um t odo, tanto antes quanto depois da ressurreição. O termo alma apenas qualifica o homem em sua existência temporal e perecível (ser alma vivente). O objeto da ressurreição é o próprio homem na totalidade de suas funções.
A vinda de Cristo, acompanhada da ressurreição dos mortos e separação de justos de injustos, isto é, a execução do julgamento ao mesmo tempo, forma a transição para a consumação de todas as coisas e para o estado eterno. Se para os crentes a volta do Senhor é motivo de alegria e glória, os descrentes enfrentarão um julgamento, seu destino já está definido desde que ele não creu em Cristo.
O julgamento não pode ser atribuído a consequências naturais do pecado neste mundo porque ocorre na volta de Cristo, que castigará aos incrédulos e desobedientes. Assim estará, finalmente, completa a obra de Cristo e, por intermédio dele, todas as coisas retornam para Deus, passando a ser o que sempre esteve em seu propósito eterno.
Não é encontrada nas palavras de Paulo referências a um reino intermediário – após a vinda de Cristo, ressurreição dos mortos e transformação dos vivos, diz Paulo, virá o fim, sem menção a nenhum lapso temporal. Não se pode chamar de exegese inserir uma interpretação equivocada de Ap 20 em I Co 15 para defender a ideia de um tempo intermediário e, a conclusão lógica de que a volta de Cristo seria incompleta, e somente depois ele viria definitivamente. O crente pode confiar plenamente no futuro porque o Senhor Jesus Cristo vira novamente, vindicará os seus e levantará dos mortos aqueles que esperaram confiantemente em sua volta.

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